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A MORTE DO PAPA
Idéias e homens que definirão o novo papa
Fama, projeção política e teológica e capacidade de comunicação são traços valorizados para a escolha; tendência de centralizar ou descentralizar gestão também será avaliada
VINICIUS TORRES FREIRE
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
Pouco mais de 20 homens devem chamar a atenção dos 117
cardeais que vão escolher o papa.
Mas, nos meses de agonia de João
Paulo 2º, as listas de "papáveis"
vieram se fechando ao ponto de
os vaticanistas mais midiáticos limitarem as candidaturas mais
fortes a não mais que meia dúzia.
No entanto, são tantas as considerações que vão nortear a escolha que qualquer um dos vinte e
poucos nomes de maior projeção
pode vir a ser o novo santo padre.
Quais são essas considerações?
Fama e projeção religiosa, pastoral, política e teológica. Numa
reunião de 117 personalidades
complexas, é difícil que cada cardeal conheça em detalhe as características de cada um dos colegas.
As idéias sobre os problemas da
igreja e os grandes temas da doutrina católica serão critérios decisivos para refinar a seleção dentre
os candidatos de maior projeção:
daqueles cujos pontos de vista
mais expressam preocupações
maiores do colégio cardinalício
Articulação política. Alguns
"grandes eleitores", entre eles
muitos papáveis, vão organizar
debates informais e discretos durante o encontro aberto da congregação dos cardeais, antes do
conclave, a fim de projetar seus
preferidos. Quando começarem
as votações, ficará um pouco mais
claro quais candidatos receberão
um veto informal, por não conseguirem maioria expressiva ou serem muito divisivos, e quais serão
conduzidos aos turnos finais.
É na combinação dessas variáveis e no cruzamento de ideal religioso-político e traços de personalidade que os cardeais desenharão o perfil do próximo papa.
Traços pessoais
João Paulo 2º modificou, em
1996, as regras para a eleição do
papa. Essa mudança pode ter como conseqüência a vitória clara
de uma tendência sobre a outra,
em vez da escolha de um nome
consensual. O santo padre pode
vir a ser eleito por metade mais
um dos votos, em vez da maioria
de dois terços que regia a eleição.
Mas pode ser ainda que os cardeais pensem que uma tal escolha
pode acentuar divisões na Igreja
Católica.
Capacidade de comunicação
em uma igreja mundializada e sujeita aos imperativos midiáticos é
importante. Falar bem o italiano é
essencial (o papa é o bispo de Roma), assim como o óbvio inglês.
Quanto mais talento lingüístico,
melhor, tanto para exercer o pontificado como para ter bom trânsito entre os eleitores, que vêm de
mais de 60 países.
Não convém ainda que o papa
seja uma figura por demais introvertida e incapaz de lidar com as
solicitações de mídia e multidões.
Gravidade é essencial, mas frieza é
inconcebível, assim como excessiva liberalidade no trato. Combinar um ar de serena autoridade
com muita compaixão e manifesto amor e calor cristãos é o ideal.
Nacionalidade ainda é um aspecto importante, porém cada vez
mais secundário e relativo em um
colégio cardinalício tão mundializado, extenso e dividido em termos geográficos. A imprensa italiana, os muitos cardeais de nacionalidade italiana e a Cúria, a burocracia da igreja em Roma, podem
tender a preferir um papa italiano. De resto, o papa é, e daí deriva
sua primazia e autoridade, o bispo de Roma.
Mas a Cúria também se internacionalizou desde o pontificado de
Paulo 6º e ainda mais sob João
Paulo 2º. Seu peso no colégio de
cardeais, assim como o dos italianos, foi bastante reduzido.
Há uma ligeira tendência de papados longos serem sucedidos
por papados de curta duração.
Logo, depois de João Paulo 2º,
eleito aos 58 anos, os cardeais prefeririam escolher um papa mais
idoso, de pontificado mais curto,
quando então a Igreja Católica refletiria sobre quais rumos deve seguir no longo prazo, rumos que
seriam definidos pelo sucessor do
sucessor de João Paulo 2º.
Quanto à política, na Igreja Católica e em um conclave, trata-se
de palavra com muitos significados. O papa será conservador ou
liberal? Mas conservador ou liberal em que assuntos? Doutrina,
política social, moral? Decerto, cada um dos cardeais está mais ou
menos próximo do que a política
laica chama de esquerda ou direita. Pode ser mais aberto para temas como justiça social, ou ser
mais preocupado com assuntos
da fé, os matizes neste caso são
tantos quanto os cardeais.
Tendência administrativa
Mas um cardeal pode ser mais
imperial ou aceitar mais descentralização (colegialidade, em termos eclesiásticos). Ou pode ser
mais imperial em termos de doutrina e mais liberal em termos de
liturgia e administração etc.
O próximo papa pode ser mais
aberto às reivindicações laicas sobre sexo, bioética, celibato -liberal. Neste caso, certamente trata-se de um papa mais liberal também em questões doutrinais, litúrgicas e, provavelmente, políticas e administrativas. Seria o caso
mais inequívoco do rótulo liberal,
senão o único. Mas tal radicalidade é improvável devido a seu caráter divisivo e pela sua ameaça à
doutrina e à tradição.
Muito importante é o caráter
corretivo, por assim dizer, do
conclave. Na eleição, os cardeais
vão se preocupar com as ênfases e
indiferenças excessivas do falecido papa. O centralismo imperial
de João Paulo 2º pode ser atenuado por um papa mais adepto da
colegialidade. Outros preferirão
um papa que se preocupe mais
com a administração burocrática
da igreja, outro traço mais débil
do mais recente pontificado.
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