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DE VOLTA PARA CASA
Poloneses querem o enterro no país
Ainda que remota, possibilidade de o papa ser enterrado em sua terra natal comove população
ROZANE MONTEIRO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM WADOWICE
A cidade em que nasceu o papa
João Paulo 2º, Wadowice, no sul
da Polônia, espera ansiosa a
abertura hoje, em Roma, de seu
testamento -se ele realmente o
tiver sido redigido. Embora a expectativa seja a de que ele será
mesmo sepultado no Vaticano,
fiéis que lotaram ontem a praça
que leva o nome do papa, durante missa em sua memória, emocionaram-se ao imaginar a possibilidade de ele ter desejado ser
enterrado em seu país.
Iwona Ossowska, 27, advogada, fez questão de explicar detalhadamente que o fato de os papas serem enterrados em Roma
é mais que uma tradição católica. É, segundo ela, uma formalidade da qual não se pode fugir,
já que o Vaticano é um Estado,
"por mais que os poloneses possam desejar que o túmulo de
João Paulo 2º fique para sempre
no país em que ele nasceu." Iwona mal conseguiu terminar a explicação. Seus olhos se encheram de lágrimas: "Ele era nosso
papa. O papa polonês".
Segundo a advogada, outra
possibilidade seria a de que João
Paulo 2º fosse enterrado em Roma, e seu coração, na Polônia.
"Essa opção não me agrada".
Mas Iwona lembrou que isso foi
o que aconteceu, por exemplo,
com Frédéric Chopin. O compositor polonês morreu em Paris.
A prefeita de Wadowice, Eva
Filipiak, também se emocionou
ao imaginar a possibilidade de
João Paulo 2º ser enterrado na
Polônia. Cautelosa, disse que
preferia esperar para se manifestar. "A Igreja Católica nunca se
esquecerá da Polônia. Nunca se
esquecerá do jeito polonês de lidar com a fé".
Eva Filipiak foi à praça João
Paulo 2º com integrantes do governo municipal de Wadowice
para inaugurar uma escultura
em bronze do rosto do papa, colocada na entrada da basílica.
Aos pés do monumento, eles
acenderam velas e colocaram
flores. O choro que se ouviu logo
após o anúncio da morte de João
Paulo 2º, no sábado à noite, deu
lugar ontem a orações. No primeiro domingo sem o papa,
Wadowice rezou unida numa
manhã de clima agradável, com
a brisa suave balançando as várias bandeiras da Polônia com fitas pretas em sinal de luto.
Bem perto da prefeita, estava
Halina Kulbacka, 57, que organizou três maratonas de Wadowice a Roma só para homenagear o papa -são 1.500 km, mas
os maratonistas fizeram paradas
pelo caminho. "Eu queria mostrar que nós iríamos a ele até a
pé", disse Halina. A primeira das
"maratonas peregrinas" aconteceu em 1998 e contou com a participação de 25 pessoas.
A imagem da chegada a Roma
nunca vai sair da memória de
Halina. Ela contou que, quando
soube que os maratonistas de
Wadowice estavam chegando,
João Paulo 2º foi à janela e perguntou: "Onde estão aqueles
corredores? Eu quero aqueles
corredores". "Foi inacreditável.
Todos os fiéis que estavam na
praça São Pedro foram abrindo
caminho, e nós passamos. Depois, ele nos recebeu e agradeceu", lembrou.
Não foi a primeira vez que ela
se encontrou com o papa. Ainda
menina, foi crismada por ele. E,
quando era adolescente, fez parte de um grupo de estudantes
com quem o então bispo de Cracóvia, Karol Wojtyla, queria
conversar. Eram os tempos do
comunismo, e o encontro não
foi visto com bons olhos pelas
autoridades locais. Também não
agradou às autoridades a primeira visita que ele fez, depois
de eleito papa, à sua cidade, em
1979. Halina era professora.
"Eles falaram que nós tínhamos de trabalhar e que os alunos
tinham de ir à escola. Não é um
absurdo? Tinha de ser feriado na
cidade. Nós ignoramos a ordem
e fomos todos para a rua receber
nosso papa. Espalhamos flores
em seu caminho. Nunca vou me
esquecer."
As autoridades não tomaram
nenhuma providência contra a
desobediência em massa, e Halina acha que foi porque acharam
que seria "um pouco demais"
criar confusão com um homem
que tinha acabado de ser eleito o
líder mundial da Igreja Católica.
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