São Paulo, segunda-feira, 04 de junho de 2001

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POLÍTICA
Novo presidente promete formar governo de conciliação nacional; vencedor é primeiro indígena a chegar ao poder

Alejandro Toledo é eleito presidente do Peru

France Presse
Presidente eleito do Peru, Alejandro Toledo comemora a vitória no pleito na capital, Lima


THOMAS TRAUMANN
ENVIADO ESPECIAL A LIMA

O economista Alejandro Toledo Manrique, 55, de centro-direita, foi eleito ontem o presidente do Peru.
Nascido em uma família miserável da região serrana, Toledo é o primeiro "cholo" (como são chamados os indígenas andinos) a chegar ao poder no país.
Toledo toma posse no dia 28 de julho e seu mandato termina em 2006. Contados mais de 10 milhões de cédulas (70% do total), Toledo tinha 51,65% dos votos válidos contra 48,35% do advogado e ex-presidente Alan García. Às 22h05 (horário de Brasília), García reconheceu a derrota e disse que apoiará o novo governo. Às 22h45, mais de 10 mil pessoas se concentravam no centro de Lima aguardando o discurso de vitória.
O resultado encerra o ciclo da história peruana ligado ao ex-presidente Alberto Fujimori (exilado no Japão), mas não assegura a estabilidade política.
Após a divulgação das primeiras pesquisas de boca-de-urna apontando para a vitória de Toledo, peruanos comemoravam no centro de Lima gritando "Pachacútec", o nome do mais grandioso imperador inca. Toledo, que gosta de ser comparado ao imperador, anunciara que a sua posse seria em Macchu Pichu, o local de cerimônias incas.
"Há um simbolismo especial na vitória de um índio em um país com uma história dividida como o Peru", disse o escritor Mário Vargas Llosa à emissora "TVN".
Embora o censo local não utilize o critério raça em suas pesquisas, estima-se que pouco mais da metade da população seja indígena. A maior parte da população miserável do Peru (cerca de 40% do total) é composta de índios.

Instabilidade
Toledo, que, com bolsas de estudo, cursou doutorado em economia na Universidade de Stanford (EUA), não é um indígena típico e terá um governo difícil pela frente. "A expectativa da população é muito grande. Se houver decepção, o governo perde o respaldo", avaliou o analista Mirko Lauer.
O partido toledista, o Peru Possível, elegeu 45 dos 120 congressistas. A Constituição peruana (do governo Fujimori) permite que o Congresso convoque novas eleições após o voto de desconfiança de 61 parlamentares.
Apesar de herói da resistência anti-Fujimori e de seu papel de símbolo-de um índio pobre que obteve sucesso-, Toledo enfrenta resistências na sociedade peruana. A principal delas é a falta de credibilidade. Na campanha, mentiu sobre dados sem importância como a data da morte de sua mãe. Ficou com a imagem de "não-confiável".
Em busca de credibilidade, o novo presidente deve anunciar nos próximos dias um governo de conciliação nacional. Deve indicar ministros de partidos da oposição e anunciar uma equipe conhecida do mercado financeiro para comandar a economia.
Na campanha, Toledo prometeu que o seu governo receberia investimentos estrangeiros em função da experiência que teve como assessor de organismos internacionais como a ONU, Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvidos. Durante a campanha, recebeu doações do megainvestidor George Soros.
"Sua campanha teve promessas demais e o seu governo, pelas limitações econômicas, terá ações de menos. É uma fórmula que quase sempre gera instabilidade", disse o historiador e analista político Nelson Manrique (sem relação de parentesco com Toledo).
Manrique crê que o novo presidente venceu mais pelos defeitos do adversário, Alan García, do que por suas propostas. García governou o Peru de 1985 a 1990, numa gestão marcada pela hiperinflação, terrorismo e denúncias de corrupção.
Mesmo com a derrota, García sai do pleito com a imagem recuperada. Quando lançou sua candidatura em janeiro, após nove anos morando na Colômbia, três em cada quatro peruanos diziam que nunca votariam nele. "Saí de 2% para 48%, como posso sentir-me derrotado?", disse García.
As eleições foram tranquilas e consideradas "exemplares" pela comissão de observadores da OEA (Organização dos Estados Americanos), que, em julho de 2000, denunciou fraudes nas eleições que deram um terceiro mandato a Fujimori derrotando, justamente, a Toledo.
O segundo turno põe fim a uma crise política que culminou com o exílio de Fujimori no Japão, depois de dez anos no poder. Em novembro, quando se descobriu que o ex-chefe do serviço secreto e seu então braço direito Vladimiro Montesinos desviara milhões de dólares para contas no exterior, Fujimori exilou-se no Japão. De lá, enviou um pedido de renúncia - recusado pelo Congresso, que o destituiu por "incapacidade moral".


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