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PAZ CELESTIAL
No 10º aniversário do massacre de Tiananmen, PC teme o seu futuro e sufoca o pequeno movimento pró-democracia
Fantasma da democracia ronda a China
JAIME SPITZCOVSKY
Editor de Mundo
O Partido Comunista chinês vai
atravessar o limiar do século 21
perseguido pelo fantasma de ser o
patrocinador do maior massacre,
nas últimas décadas, de um movimento pró-democracia. Os herdeiros de Mao Tse-tung continuam a
descartar reformas democratizantes, mas as aceleradas mudanças
em curso na sociedade chinesa sugerem a irrupção de um fantasma
ainda mais assustador para o PC: o
fim de seu monopólio do poder.
Há exatamente dez anos, em 4 de
junho de 1989, o Partido Comunista chinês recorria às armas para esmagar um movimento pró-democracia que ousou questionar o ""poder imperial" iniciado com o
triunfo, em 1949, da revolução liderada por Mao Tse-tung.
Em 89, o movimento estudantil,
embrião dos protestos que tomaram a praça Tiananmen (Paz Celestial) em Pequim, aproveitou-se
das rachaduras que apareceram
então na fortaleza comunista. Havia um clima de liberalização, provocado pelas reformas econômicas desenhadas para injetar capitalismo na economia e tirar a China
da armadilha da pobreza.
Essa alquimia capitalismo-comunismo não foi imaginada para
derrubar o PC. A idéia era rejuvenescer a economia para garantir a
permanência dos comunistas no
poder, arrefecendo a pressão do
colapso da economia planificada.
Para usar um jargão caro à tradição chinesa, a elite comunista tirou
uma ""lição histórica" dos eventos
de Tiananmen. Percebeu ser necessário priorizar a ""estabilidade
ao desenvolvimento econômico".
Portanto, a palavra de ordem para o Partido Comunista é ""manter
a estabilidade". Após sinais de
uma tímida democratização no começo de 1998, o presidente Jiang
Zemin deslanchou uma nova onda
de repressão contra o diminuto
movimento de dissidentes que
ainda sobrevive no país.
Ontem, a polícia prendeu, em diversas cidades, 15 ativistas pró-democracia. A repressão e a fraqueza
do movimento de dissidentes garantem a manutenção de um ""clima de tranquilidade" no país.
O governo, enquanto mantém
doses cavalares de capitalismo na
economia, aperta o cerco aos dissidentes, afia a censura e sinaliza não
querer correr riscos. Seu comportamento é a sugestão mais evidente
de que, mesmo num país com uma
milenar cultura de autoritarismo,
o avanço da urbanização, o surgimento de uma classe média reivindicante e de uma sociedade civil
organizada desembocam numa
democratização inevitável.
No caso chinês, embora inevitável, a introdução de um sistema
político pluralista não deve ocorrer na velocidade observada, por
exemplo, na Polônia ou mesmo na
Rússia pós-comunismo.
Primeiro, porque o PC faz de sua
sobrevivência no poder o item que
norteia suas decisões. Vai então resistir, talvez até com armas, aos
ventos democratizantes.
Em segundo lugar, a China coleciona um desenvolvimento histórico refratário a correntes de pensamento ocidentais que valorizam
a democracia representativa ou a
liberdade de expressão. A principal expressão da filosofia chinesa é
o confucionismo, que, com sua defesa do conceito de autoridade,
serviu de base ideológica para regimes ditatoriais.
Em 1997, a China recuperou o
controle de Hong Kong, depois de
156 anos de colonialismo britânico. O evento histórico suscitou a
pergunta: num futuro próximo, a
China autoritária estará mais parecida com a recém-democratizada
Hong Kong ou vice-versa?
A China vai seguir o caminho de
Hong Kong. Apenas fica impossível arriscar um calendário para essa chegada tardia da democracia.
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