São Paulo, quinta, 5 de novembro de 1998

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CERCO AO EX-DITADOR
Promotoria diz que houve mortos e desaparecidos antes de o general assumir o poder e ganhar imunidade
Ações pré-golpe ameaçam Pinochet

ISABEL CLEMENTE
de Londres

A promotoria pública britânica alegou ontem que crimes comandados pelo ex-ditador chileno Augusto Pinochet, 82, foram cometidos dias antes do golpe que o levou ao poder, em setembro de 73.
Segundo a promotoria, 28 pessoas foram mortas ou desapareceram antes de Pinochet assumir o poder, o que lhe garantiria imunidade contra processos e extradição para outros países.
A informação foi apresentada pelo promotor Alun Jones, que representa as autoridades espanholas que pretendem processar Pinochet, durante o primeiro dia de audiência com o comitê jurídico da Câmara dos Lordes.
A Câmara dos Lordes é a câmara alta do Parlamento britânico, que também funciona como corte superior de Justiça do país.
As autoridades espanholas -que solicitaram a detenção do ditador, decretada no último dia 16- recorreram da decisão da Alta Corte britânica. Nessa instância, foi decidido que Pinochet não poderia ter sido preso em Londres porque estaria protegido por imunidade diplomática (porque era presidente na época em que ocorreram os crimes de que é acusado).
Para tentar reverter o processo, até agora favorável a Pinochet, a promotoria pediu que os lordes rejeitem a tese de que assassinatos, tortura e sequestro estejam entre as funções de um soberano.
Pinochet governou o Chile entre 73 e 90, período em que mais de 4.000 pessoas foram mortas ou desapareceram, segundo relatos oficiais. Seu governo depôs o presidente eleito Salvador Allende, que morreu durante o golpe militar.
Isabel Allende, filha do ex-presidente, estava entre as cerca de 150 pessoas que puderam assistir à audiência de ontem.
A médica britânica Sheyla Cassidy, presa e torturada no Chile por atender vítimas do regime militar, em 77, também assistiu à audiência e se disse esperançosa.
² Próxima semana
O general permanecerá em Londres até a sentença na Câmara dos Lordes, inapelável, ser anunciada. Isso só deverá acontecer na próxima semana. A audiência continuará hoje, será interrompida amanhã e será retomada na segunda-feira.
O advogado Clive Nicholls, que representa o Pinochet, insiste que ele não pode ser extraditado à Espanha porque era chefe de Estado, ainda que de um regime cruel.
Ex-exilados chilenos fizeram manifestações em frente ao Parlamento britânico, em Londres. Jeremy Corbyn, do grupo parlamentar britânico pelos direitos humanos, disse que, qualquer que seja o resultado, já houve um avanço. "Seria inacreditável há 25 anos imaginar que Pinochet enfrentaria um processo como esse algum dia", afirmou.



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