São Paulo, sábado, 06 de março de 2004

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IRAQUE OCUPADO

Decisão de última hora segue orientação do aiatolá Al Sistani, que contesta cláusulas sobre curdos e Presidência

Xiitas boicotam Constituição provisória

Faleh Kheiber/Reuters
Xiita reza em frente ao mausoléu do imã Hussein, em Karbala


DA REDAÇÃO

Cinco membros xiitas do Conselho de Governo Iraquiano boicotaram ontem a assinatura da Constituição interina que regeria o país pelos próximos meses, protelando pela terceira vez a ratificação da Carta. O boicote seguiu instruções do principal líder xiita do país, o aiatolá Ali al Sistani, que rejeitou alguns pontos do texto previamente acordados pelo conselho. Com o novo adiamento, fica nítido o crescente poder do aiatolá.
Embora a aprovação do documento seja o mais importante passo dentro do plano americano de transição de poder, que culmina em 30 de junho com a devolução da soberania iraquiana, a Casa Branca minimizou o fato. "Vocês estão vendo a democracia em ação", disse o porta-voz Scott McClellan. "O importante é que os líderes iraquianos podem discutir livre e publicamente essas questões."
As discussões devem prosseguir só na segunda-feira, sem previsão para a ratificação. Os pontos objetados por Al Sistani envolvem o poder dos curdos, que gozam de relativa autonomia no norte do país desde os últimos anos da ditadura de Saddam Hussein (1979-2003), e o modelo que seguirá a Presidência.
A questão com os curdos surgiu de uma cláusula sobre o referendo que será promovido em 2005 pra promulgar a Constituição definitiva. Ela determina que se, nesse referendo, dois terços da população em três das 18 Províncias iraquianas, em qualquer combinação, vetarem a Carta, ela não poderá ser promulgada.
A cláusula foi defendida por políticos curdos, que temem que uma maioria simples (os xiitas são cerca de 60% da população) promulgue uma Constituição que reduza ou anule sua autonomia e mine seus direitos. Como a região autônoma curda é composta de três Províncias, isso lhes garantiria o direito de vetar o texto.
O segundo ponto trata da Presidência. O texto proposto prevê um único presidente e dois vices, que juntos devem concordar unanimemente sobre a escolha do premiê. Mas os xiitas querem uma junta de cinco pessoas na Presidência -três xiitas, um sunita e um curdo- que se alternariam à frente do governo. Assim, traduziriam sua maioria demográfica em maioria política.
O boicote por cinco dos 13 xiitas do conselho -Ahmed Chalabi, Abdel-Aziz al Hakim, Ibrahim al Jaafari, Mouwafak al Rubaie e Muhammad Bahr al Ulloum- foi criticado por outros integrantes, que os acusaram de impor obstáculos à Carta e à transição.
A Constituição interina ficará em vigor até a promulgação da Carta definitiva, prevista para o segundo semestre de 2005.
A assinatura já havia sido adiada no fim de semana, ante as divergências dentro do conselho, e na quarta-feira, pelos atentados que deixaram 181 mortos no feriado xiita que celebra o martírio do imã Hussein (Ashura), na terça.

Com agências internacionais

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