São Paulo, sábado, 06 de março de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

depoimento

Chilenos são gentis com quem cobre catástrofe

DA ENVIADA A CONCEPCIÓN

"Silvana, por aqui!" É o estudante de medicina Carlos Canales quem grita indicando a rota de fuga, no momento em que um terremoto de magnitude 6,6 faz tudo tremer na casa em que estamos, em Concepción.
Os chilenos são experts em como se comportar em caso de terremoto. Ensinam que a primeira coisa a fazer é correr para o principal pilar de sustentação da casa -supõe-se que ele não cairá- e esperar ali até o fim do tremor.
Também convém ter à mão um kit de sobrevivência -água, alimentos, agasalhos- para esperar a etapa seguinte, que é ficar do lado de fora da construção até ter certeza de que não cederá.
O tom da voz de Canales e o som do chacoalhar do teto, do chão e da parede não deixam dúvidas sobre o perigo.
A casa em que estamos, da mãe de Canales, Nurya Palma, tem uma área seriamente afetada pelo terremoto do último sábado. O chão se desestruturou, e paredes exibem grandes rachaduras.
Para chegar ao ponto de fuga, Canales e eu teríamos de atravessar esse trecho "condenado", ou seja, não havia tempo a perder.
Quando chegamos ao refúgio, já estavam no local dom Carlos, o motorista e guia que me trouxe de Santiago, e a cunhada que vive em Concepción, além da irmã e da mãe de Canales.
Quando chegamos a Concepción, dom Carlos e eu encontramos hotéis superlotados por jornalistas e por outros profissionais que trabalham na reconstrução.
Nurya me abriu as portas da sua casa em um dos múltiplos gestos de gentileza que os chilenos dedicam aos jornalistas estrangeiros que cobrem sua catástrofe.
Passado o susto, parentes e amigos da família telefonam para saber se todos estão bem. Canales nos descontrai com uma piada:
"Acho que no Chile ninguém nunca mais vai usar o telefone no modo de vibração [cujo ruído lembra o de um terremoto médio, como aquele que acabávamos de vivenciar]".
Pouco depois toca o celular de dom Carlos. É o encarregado do hotel em que me hospedei em Santiago, onde ontem pela manhã não houve sustos com réplicas do terremoto. Quer saber se dom Carlos e eu precisamos de ajuda.
Sinto meus olhos inundarem e "adapto mentalmente" o poema de Carlos Drummond de Andrade: "Esse terremoto, esses gestos botam a gente comovido como o quê". (SILVANA ARANTES)


Texto Anterior: Saqueadores de Concepción se defendem
Próximo Texto: Lula desiste de comparecer à posse de Piñera
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.