São Paulo, sábado, 06 de setembro de 2008

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Angola vive caos eleitoral, e oposição pede novo pleito

Desorganização leva a filas gigantescas, e muitos eleitores desistem de votar

Comissão admite erros logísticos nas legislativas e pede que parte das urnas siga aberta na primeira votação no país desde 1992

JOÃO FELLET
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM LUANDA

Depois de esperar por cinco horas na fila de um posto de votação no centro de Luanda, a capital de Angola, Fernando Esteves, 50, perdeu a paciência. "Esperei 18 anos para ver Angola independente, 21 para sair do Exército e 50 para ser avô. Mas não fico nem mais um minuto nesta fila", disse o comerciante, pouco antes de voltar para casa frustrado por não participar da primeira eleição no país desde o fim da guerra civil, em 2002.
Como ele, centenas de eleitores exaustos abandonaram as filas nas seções eleitorais da região central de Luanda. A confusão fez a Unita (União Nacional para a Independência Total de Angola), principal partido da oposição, pedir a anulação do pleito: "O sistema entrou em colapso, e temos de fazer algo para recuperar o processo", disse Isaías Samakuva, presidente do partido.
"Os postos estão como enfeites, pois ou não há urnas, ou não há cédulas. Está sol, tenho sede e fome. Mulheres grávidas estão desmaiando", contou Tatiana Baptista, 20, que também voltou para a casa sem votar -o voto em Angola é facultativo.
Observadores da União Européia já haviam denunciado, pela manhã, o "caos" com que a votação transcorria.
No fim do dia, a Comissão Nacional Eleitoral anunciou que o prazo para votação seria estendido -hoje, abrirão 320 seções eleitorais em Luanda, aproximadamente 10% do total, que ou não foram abertas ontem ou tiveram problemas logísticos graves.

Sem cabines
Embora não tenham sido registrados distúrbios graves no interior do país, em Luanda, a votação teve momentos tragicômicos. Numa estação montada numa praça, sobravam cédulas e urnas, mas ninguém podia votar por causa da ausência de outro item: cabines.
A situação fugia do controle quando uma camionete estacionou na praça e dela foram retiradas placas de papelão que, montadas, deveriam resolver o problema. Quando os fiscais tinham o papelão nas mãos, e o tumulto diminuía, um novo problema surgiu: ninguém sabia como encaixar as placas.
Vinte minutos depois, seguindo as dicas da multidão, os constrangidos fiscais finalmente conseguiram erguer a cabine, e a votação pôde começar.
Ex-colônia de Portugal, de quem se tornou independente em 1975, Angola tem feito avanços consideráveis na economia. Com o auxílio dos altos preços do petróleo, do qual é o maior produtor da África subsaariana, o país viu sua economia crescer 21% em 2007.
Para conquistar de vez a confiança dos investidores estrangeiros, porém, Angola estava sendo pressionada a tornar-se mais democrática, já que as últimas eleições no país ocorreram em 1992.
Naquela ocasião, os angolanos iam às urnas pela primeira vez. Mas a Unita contestou o resultado, que mostrava à frente o MPLA (Movimento Popular para a Libertação de Angola), no poder desde a independência. Com isso, a guerra entre os dois grupos, que se arrastava desde a saída dos portugueses, foi retomada.
Há seis anos em paz, o governo julgou que o país estivesse finalmente preparado para votar outra vez, e foram marcadas eleições legislativas para renovar a Assembléia Nacional.
A votação caótica na cidade que concentra um terço dos 8 milhões eleitores do país contraria as expectativas do presidente José Eduardo dos Santos, 66, há 29 anos no poder. Em discursos ao longo da campanha eleitoral, ele havia afirmado que o seu país mostraria à África e ao mundo como realizar eleições exemplares.


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