São Paulo, domingo, 06 de setembro de 2009

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Favorito no Uruguai copia receita de Lula

Candidato à Presidência, ex-guerrilheiro se preocupa em melhorar a aparência e promete gestão econômica sem rupturas

Avesso a formalidades, Mujica, que vive sem luxos em uma chácara, já tem a simpatia dos mais pobres e busca a dos conservadores

GUSTAVO HENNEMANN
DA REDAÇÃO

Com a imagem atrelada à esquerda radical, sem curso superior e estilo informal, o candidato governista à Presidência do Uruguai, José Mujica, 75, reproduz hoje estratégias usadas pelo presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, para atenuar a rejeição do eleitorado conservador.
Ex-guerrilheiro do Grupo de Libertação Nacional Tupamaros e representante da extrema esquerda da coalizão governista Frente Ampla (FA) -que tem setores de centro e de esquerda-, Mujica vem enfatizando que não provocará rupturas na economia caso vença e vem cuidando mais da aparência e do vestuário.
Em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, com 45%, o uruguaio tenta vencer o pleito de 25 de outubro sem precisar de segundo turno -se houver, seus adversários dos tradicionais partidos Nacional e Colorado devem unir forças.
"A centro-direita [Partido Nacional] tem feito a política do medo, explorando a veia um pouco conservadora de um país que quer mudança, mas não muita, algo suave. Por isso, nos apresentam como mensageiros da velha guerrilha, como um perigo aos investidores, mas temos garantido a maior estabilidade possível", diz Mujica.
Em cartas publicadas durante a campanha -assim como Lula em 2002 na "Carta ao Povo Brasileiro"-, o uruguaio promete uma gestão econômica sóbria, mantendo a equipe do governo Tabaré Vázquez, seu correligionário que, em 2005, levou a FA ao poder, mas é ligado a setores de centro.
À Folha Mujica disse que Lula é o seu modelo e que buscará transformar as contradições sociais de maneira "política, negociada, mantendo a estabilidade e, sobretudo, favorecendo o investimento".
Senador mais votado na última eleição, Mujica também exerceu o cargo de ministro de Agricultura e Pecuária no atual governo, mas nunca se acostumou a usar terno e gravata.
Dono de um discurso permeado de gírias e metáforas, leva uma vida sem luxo em uma chácara perto de Montevidéu, o que provoca empatia e forte apoio da classe mais pobre.
Antes de ir a Brasília, em agosto, mandou fazer um traje especialmente para encontrar-se com Lula, completando a mudança estética. Assim como o brasileiro, já havia dedicado maiores cuidados ao cabelo e à barba no início da campanha.
"Não consigo imaginá-lo todos os dias de terno, mas o que ele quer dizer é: fiquem tranquilos, uruguaios, quando precisar andar pelo mundo, me reunir com presidentes, vou estar bem vestido, vou deixar uma boa imagem do nosso país", diz o cientista político Adolfo Garcé, da Universidade da República do Uruguai.
Para Garcé, quando Mujica fala no modelo Lula, quer dizer: "Venho de longe, fui um revolucionário, tenho pensamento socialista, mas agora estou disposto a fazer alianças com o centro ou com a direita".

Foco na agropecuária
Apesar de ter entregue, em troca de apoio, o comando da economia a seu candidato a vice, o ex-ministro da Economia Danilo Astori -com características mais liberais-, Mujica defenderá políticas de suporte principalmente ao setor agropecuário, segundo Garcé.
"Ele diz o tempo todo que o campo precisa mais de laboratórios do que de vacas. Seu sonho é que o Uruguai vire uma Nova Zelândia, onde universidades cooperam com o campo. Já Astori é mais partidário da não interferência no mercado", diz o cientista político.
Em outubro, Mujica enfrentará o ex-presidente Luis Alberto Lacalle (1990-1995), do Partido Nacional, que tem 34% das intenções de voto, e Pedro Bordaberry, candidato do tradicional mas enfraquecido Partido Colorado, que tem 9%.
Em busca dos votos que lhe faltam para vencer no primeiro turno, Mujica agora pede a seus partidários que invistam nos 7% de indecisos.
"Não tem sentido falar com quem já está convencido, é como dançar com a irmã", disse à maneira de Lula na semana passada em um comício no interior do país.


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