São Paulo, quinta-feira, 06 de novembro de 2008

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Intelectuais negros dizem que agenda importa mais

Para eles, propostas valem mais que o simbolismo

SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

Co-autor do "Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil", estudo de referência sobre a evolução de indicadores sócio-raciais, o economista Marcelo Paixão comemorou a vitória de Barak Obama, especialmente "pela saída da extrema direita americana do poder".
O professor do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e coordenador-geral do Laeser (Laboratório de Análises Estatísticas Econômicas e Sociais das Relações Raciais) disse que Obama, "para os padrões americanos, é um candidato mais à esquerda".
"Ele tem uma mensagem tolerante, progressista, representa a vitória de demandas sociais, a vitória de ações afirmativas, do direito das mulheres, dos ecologistas. É uma coisa maravilhosa, independentemente da cor da pele."
"Acho que Obama sendo candidato, portando essa agenda, é que me deixa feliz. Porque se fosse Condoleezza Rice substituindo Bush eu não estaria feliz", acrescentou.
O escritor e historiador Joel Rufino dos Santos elogiou a democracia americana e afirmou que a vitória de Obama representa uma espécie de "lição" e de "modelo" para o Brasil.
"Acho que isso que a gente chama democracia, onde tem mesmo é nos EUA. Uma democracia mais avançada. Nesse sentido, é um modelo para o Brasil. Acho que o velho [filósofo e teórico do comunismo Karl] Marx de vez em quando tem que ser lembrado. Ali é onde pode ter um socialismo realmente democrático. Porque a economia é mais desenvolvida, o povo tem mais tradição de respeito ao outro."
Um exemplo dessa tradição, na opinião do autor de "O Que é Racismo?" e "Gosto de África, Histórias de Lá e Daqui", é a questão do preconceito contra os negros. "Há 40 anos, [nos EUA] o negro não podia beber água no bebedouro de branco. Hoje, um negro com nome árabe é eleito presidente. Isso só é possível onde há uma longa tradição de respeito ao outro."
Essa mudança de comportamento ao longo das quatro últimas décadas, evidenciada pela eleição de Obama, poderá ter reflexos no Brasil, estima Rufino dos Santos.
"Do ponto de vista ideológico, para nós brasileiros é muito positivo, porque é uma lição de democracia. Inclusive de democracia racial", concluiu.
O presidente da Fundação Biblioteca Nacional, Muniz Sodré, prevê que a escolha do futuro presidente norte-americano pelo eleitorado não trará mudanças significativas nas relações econômicas e internacionais dos EUA, mas que, para o Brasil, "do ponto de vista simbólico", a eleição de um presidente negro "é muito importante".
"Importante porque joga luz sobre uma discussão interna. Os de pele clara já nascem com vantagem patrimonial. Ainda que seja pobre, isso é inegável. Obama não precisa dizer que é negro. Basta olhar para ele, para a mulher dele, para os filhos dele. E os negros votaram em massa nele. Raça não existe. Raça é só para animal. A única raça é a humana. Mas ela existe na cabeça das pessoas, no imaginário", afirmou.


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