São Paulo, quinta-feira, 06 de novembro de 2008

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Fora do poder, republicanos vão ter de recompor as suas forças

Além de perder a Casa Branca, partido afunda no Congresso e não há clareza sobre quem serão seus líderes

Sigla precisará recuperar apoio de conservadores econômicos e tentar se adaptar a nova estratégia democrata de arrecadação


FERNANDO RODRIGUES
ENVIADO ESPECIAL A PHOENIX

O Partido Republicano perdeu a Casa Branca, está reduzido no Congresso, fragilizado internamente e sem líderes definidos para conduzir a legenda por um período de recomposição de forças. Ontem de madrugada, depois do discurso de John McCain admitindo a derrota, o clima em Phoenix era de velório entre assessores que acompanharam o candidato durante a campanha.
A legenda vai começar a travessia de um "deserto" que pode durar vários anos. O prazo mínimo para começarem a aparecer resultados práticos é 2010, data da próxima eleição legislativa e nos Estados. Nos EUA, os mandatos dos 435 deputados federais são de dois anos. Os senadores são eleitos por seis anos e há renovação de um terço a cada 24 meses. Além disso, 36 governadores enfrentam novas eleições em 2010, inclusive a agora estrela conservadora da sigla, Sarah Palin, que comanda o Alasca.
Daqui até 2010, a tarefa dos republicanos será principalmente reconstruir a aliança entre as três principais forças internas da legenda: 1) os conservadores econômicos (que defendem menos impostos e pouca presença do Estado na sociedade); 2) a direita religiosa (a favor de causas como a criminalização do aborto); 3) os falcões da segurança nacional (mentores do tom belicoso e unilateral dos EUA).
"O problema é que o partido perdeu muito dos seus conservadores econômicos. Os eleitores simpatizantes desse tipo de política se distanciaram por causa dos enormes gastos do governo durante a presidência de George W. Bush", disse à Folha o "falcão" Otto Reich, ex-embaixador dos EUA na Venezuela e assessor para assuntos latino-americanos de McCain na campanha deste ano. Quando Bush assumiu a Casa Branca, em janeiro de 2001, a dívida estava em US$ 5,727 trilhões. Ao entregar a cadeira para Barack Obama em 2009, o valor estará perto de US$ 10 trilhões.
Os eleitores favoráveis a menos gastos públicos se sentiram desatendidos pelo governo. Com a escolha de McCain para concorrer à sucessão de Bush, o descontentamento cresceu. O candidato sempre foi tido como um nome mais à esquerda dentro do partido.
"Parece-me que agora a melhor saída para os republicanos seria tentar privilegiar a política clássica deles, que é a economia de mercado", declarou à Folha o cientista político e professor de Harvard David King.
Além das tarefas de médio prazo, o Partido Republicano tem desafios imediatos. O mais urgente será encontrar um modelo para atrair eleitores mais jovens e refazer sua máquina de campanha eleitoral. A estratégia usada em eleições passadas mostrou-se obsoleta na comparação com a "organização comunitária" comandada por Obama e seus 3 milhões de voluntários na internet.
Os republicanos se fiavam antes num esquema montado por Bush com a ajuda de seu assessor de longa data Karl Rove. Eram os "rangers", grandes empresários ou pessoas influentes num determinado grupo da sociedade comandando legiões de pessoas doando dinheiro para as campanhas do partido. Agora, com o uso disseminado da internet, a estratégia se mostrou insuficiente.
Os republicanos tiveram menos dinheiro para gastar do que os democratas, algo incomum. Um exemplo é o investimento na campanha de TV. Bush, em 2004, consumiu US$ 188 milhões, cifra recorde até então. Agora, até o último dia 29, Obama já registrava um gasto de US$ 292,8 milhões com veiculação de comerciais televisivos.
O tempo para consertar tanta coisa no partido, somado à falta de liderança nítida no comandar do processo, tomará talvez dois ciclos eleitorais de quatro anos, diz a cientista política Pippa Norris, autora de vários livros sobre estruturas partidárias no mundo.
"Tem sido assim na política dos EUA. Quando um partido sofre uma derrota dessas, pode passar oito anos fora da Casa Branca. Mas você não deve desprezar as dificuldades que o novo presidente terá, pois o país continua envolvido em conflitos armados e a economia enfrentará séria recessão", afirmou Norris à Folha.
Ela acredita que na falta de nomes mais evidentes, "Palin será certamente uma referência para os mais conservadores do partido". Poderá ocupar os espaços se o vácuo de grandes nomes persistir.
Anteontem, no final do que seria a festa da vitória de McCain, Palin resolveu tirar fotos com a família em frente a uma bandeira norte-americana. Obama discursava naquele momento em Chicago e poucos deram atenção ao fato. Enquanto a governadora do Alasca fazia pose, um grupo de militantes ainda no local começou a gritar "2012, 2012, 2012", numa referência à próxima disputa presidencial. Ela sorriu.
Otto Reich acha que Palin terá alguma dificuldade imediata para se manter em evidência. "É uma governadora com ainda dois anos de mandato em um lugar com um fuso horário ruim para que possa influir nacionalmente. Talvez, mais adiante. Mas ela pode ser a líder de uma facção", afirma.
Para Reich, o próprio McCain estaria qualificado para ser um dos condutores da sigla, mas "muitos republicanos ficarão descontentes com ele por causa da atual eleição". Uma possibilidade é que os possíveis nomes acabem emergindo do Congresso, onde os republicanos sobreviventes no Senado têm perfil conservador.
A busca por novos nomes republicanos de expressão nacional será debatida com vigor já na semana que vem, nos próximos dias 12 a 14, em Miami, na Flórida. Nessa data, acontece um encontro promovido pela Associação de Governadores Republicanos para discutir os rumos da legenda.


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