São Paulo, sexta-feira, 07 de maio de 2004

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IRAQUE OCUPADO

Presidente afirma que seu secretário, cuja saída é exigida por jornais e congressistas americanos, é "importante"

Bush diz que não vai demitir Rumsfeld

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

Os principais jornais americanos exigiram ontem da Casa Branca a demissão do secretário da Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld, em razão dos abusos cometidos contra prisioneiros de guerra no Iraque. A mesma exigência saiu estampada em letras garrafais na capa da influente e liberal revista britânica "The Economist" e foi objeto de discursos inflamados de deputados e senadores no Congresso dos EUA -onde Rumsfeld deve se depor hoje sobre o caso. Depois de ter deixado vazar na véspera e de forma deliberada o seu "descontentamento" com Rumsfeld, o presidente dos EUA, George W. Bush, reiterou ontem o apoio ao seu secretário. Falando pausadamente e enfatizando as palavras, Bush disse: "O secretário Rumsfeld serviu bem à nação. O secretário Rumsfeld foi secretário em duas guerras e é parte importante do governo". Anteontem, assessores de Bush vazaram à imprensa que o presidente disse a Rumsfeld que estava "insatisfeito" com a forma como o secretário lidou com o caso de maus-tratos de presos iraquianos. A estratégia da Casa Branca visa tirar dos ombros de Bush a responsabilidade pela falta de informações e providências sobre o caso, trazido à opinião pública e ao próprio presidente por meio de um programa da TV americana CBS na semana passada. Bush e Rumsfeld são amigos, e o chefe do Pentágono tem forte influência sobre o presidente. Há uma semana, horas depois de Bush ter se manifestado publicamente pela primeira vez sobre as torturas, o presidente foi a uma festa na casa de Rumsfeld, e os dois passaram horas juntos. A "reprimenda" de anteontem e o reiterado "apoio" de ontem só ocorreram depois que o caso ganhou forte repercussão nos EUA. Ontem, o mais influente jornal da capital americana, o "Washington Post", responsabilizou diretamente Rumsfeld pelo "descontrole" nas prisões mantidas pelos EUA no Iraque e em Guantánamo (Cuba). O "USA Today", diário de maior circulação dos EUA, afirmou que "a cúpula do comando militar esteve mais preocupada em abafar o escândalo do que em punir os responsáveis". No ""New York Times", o colunista Thomas Friedman pediu a demissão de Rumsfeld. No Congresso, a líder dos deputados democratas, Nancy Pelosi, pediu a renúncia de Rumsfeld e afirmou que o secretário ""tentou acobertar o escândalo". O senador democrata Tom Harkin foi mais enfático: ""Para o bem de nosso país, para a segurança de nossas tropas e para o bem de nossa imagem ao redor do mundo, Rumsfeld deve renunciar". Entre os republicanos, correligionários de Bush, o senador John McCain afirmou que Rumsfeld "tem muitas coisas a explicar". Rumsfeld cancelou ontem toda sua agenda, que incluía uma viagem e discurso na Filadélfia, para se preparar para depor hoje perante uma comissão mista do Congresso que vai investigar os abusos no Iraque e as providências tomadas pelo Pentágono. Até anteontem, segundo seus assessores, Rumsfeld não havia lido na íntegra o relatório de 53 páginas que relata os casos de abuso na prisão de Abu Ghraib. O documento foi finalizado em fevereiro. A prisão iraquiana também foi ontem objeto de pedido de congressistas democratas e republicanos para que fosse demolida como forma de "exorcizar" tanto um símbolo da era Saddam Hussein quanto o escândalo atual. Além das pressões internas, os EUA foram cobrados pela Cruz Vermelha Internacional para detalhar as providências que estão sendo tomadas. Coube ao secretário de Estado, Colin Powell, responder: "Vamos tomar todas as providências possíveis", disse. Aproveitando o novo revés contra Bush, o virtual candidato democrata à eleição presidencial de novembro, John Kerry, acusou o presidente e seus assessores de "omissão e leniência", mas evitou fazer críticas diretas aos militares.

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