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ARTIGO
Secretário tem de ser demitido já
THOMAS FRIEDMAN
DO "NEW YORK TIMES"
Estamos correndo o perigo de
perder algo muito mais importante do que simplesmente a
Guerra do Iraque. Corremos o perigo de perder a América como
instrumento de autoridade e inspiração moral no mundo. Não conheci uma época em que os EUA
e seu presidente fossem mais
odiados no mundo do que hoje.
Não surpreende que tantos americanos estejam obcecados com o
último episódio de "Friends". São
os únicos amigos que temos, e
mesmo eles estão indo embora.
Este governo precisa rever sua
política iraquiana por completo;
se não o fizer, estará atraindo um
desastre total para todos nós.
A revisão precisa começar com
Bush demitindo o secretário da
Defesa, Donald Rumsfeld -não
amanhã ou no mês que vem, mas
hoje. O que houve na prisão de
Abu Ghraib foi, na melhor das hipóteses, uma ruptura na cadeia de
comando sob a autoridade de
Rumsfeld, ou, na pior, parte de
uma política deliberada.
Seja como for, o secretário da
Defesa é, em última análise, o responsável. Bush precisa cobrar essa responsabilidade. As palavras
têm peso, mas os atos pesam muito mais. Se os líderes do Pentágono administrassem qualquer
companhia americana com o planejamento visto nesta guerra, teriam sido demitidos já há meses.
Sei que interrogatórios duros
são cruciais em uma guerra, mas a
tortura pura e simples, ou então
essa espécie de humilhação sexual
por diversão que vimos, é repulsiva. Também sei que esse tipo de
abuso ocorre diariamente em prisões no mundo árabe, sem que a
Al Jazira diga uma palavra a respeito. Mas quero que meu país se
comporte melhor -não apenas
por ser a América, mas também
porque a guerra contra o terrorismo é uma guerra de idéias.
No 11 de Setembro, fomos atingidos por pessoas que acreditavam em idéias odiosas. Não podemos vencer sozinhos a guerra de
idéias contra essas pessoas. Apenas os árabes e muçulmanos podem. O que podíamos fazer -e
foi essa a única justificativa legítima desta guerra- era tentar ajudar iraquianos a criar um contexto progressista no coração do
mundo árabe-muçulmano.
Mas é difícil formar parcerias
quando você se torna tão radioativo que ninguém quer ficar do seu
lado. Bush precisa convidar a
Camp David os demais membros
permanentes do Conselho de Segurança da ONU, os líderes da
Otan e da ONU e os líderes do Egito, da Jordânia, da Arábia Saudita
e da Síria. Então, diante de todos,
precisa demonstrar arrependimento, pedir desculpas por seus
erros e deixar claro que está empreendendo um novo começo.
Em segundo lugar, ele precisa
explicar que estamos perdendo
no Iraque e que, se continuarmos
a perder, o público americano vai
acabar por exigir que deixemos o
Iraque, e então a situação vai virar
um Afeganistão triplicado.
Em terceiro lugar, Bush precisa
dizer que se deixará guiar pela
ONU na formação do novo governo interino em Bagdá. E, em
quarto, ele precisa explicar que está disposto a ouvir as idéias de todos sobre como ampliar nossa
força no Iraque e disposto a deixar que ela opere sob um novo
mandato da ONU.
Não devemos perder uma coisa
de vista: por piores que as coisas
possam estar no Iraque, a situação ainda não está perdida, e por
uma razão fundamental. As aspirações dos EUA para o Iraque e as
da maioria iraquiana silenciosa,
especialmente os xiitas e curdos,
ainda coincidem. Ambos queremos a autonomia do Iraque e, depois, eleições livres. Essa sobreposição de interesses, por mais que
possa não estar aparente, ainda
pode resgatar alguma coisa de decente desta guerra -desde que a
equipe de Bush reúna coragem
para reconhecer suas falhas e promover uma mudança de rumo.
Sim, já é tarde, mas, enquanto
houver um vislumbre que seja de
esperança de que a equipe de
Bush possa fazer a coisa certa, temos de insistir nisso, porque o papel dos EUA no mundo é precioso
demais para ser desperdiçado
dessa maneira -precioso demais
para os EUA e para o mundo.
Tradução de Clara Allain
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