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HISTÓRIA
Espectro nuclear ronda o continente onde se travaram as últimas batalhas da Segunda Guerra; ressentimentos persistem
Ásia se arma 60 anos após o fim da guerra
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ainda mais que na Europa, a Segunda Guerra Mundial continua
viva na Ásia. Sessenta anos depois
do fim da guerra no oceano Pacífico, os mesmos contendores manobram em torno de muitos dos
mesmos temas.
Com uma diferença curiosa, e
outra alarmante.
A curiosa: se de 1941 a 1945 os
EUA eram o pivô em torno do
qual tudo girava, hoje é a China
quem mais assusta e se mexe no
tabuleiro, com uma economia em
grande expansão e Forças Armadas que deixam de lado a quantidade para investir na qualidade.
Isso acontece para grande preocupação dos americanos, envolvidos no mesmo continente em um
"novo Vietnã", agora no Iraque
-até a comparação é de origem
asiática e também baseada no que
aconteceu 60 anos atrás.
A divisão do Vietnã e da Coréia
em dois pedaços -um norte comunista e um sul capitalista- foi
conseqüência direta da guerra, da
ocupação desses países pelos japoneses e da liberação posterior
por grupos guerrilheiros e forças
comunistas ou capitalistas.
China armada
Agora a diferença alarmante: a
China tem bombas nucleares, a
Coréia do Norte diz que tem, e o
Japão tem condição tecnológica
de fazê-las. E outros países asiáticos criaram as suas em conseqüência -a Índia, porque os chineses tinham; o Paquistão, porque a Índia tinha. E agora surge o
Irã querendo a sua. Sem falar dos
terroristas islâmicos, que adorariam tê-las.
Quando a guerra terminou,
com a derrota do Eixo Berlim-Roma-Tóquio, os países vencedores
criaram a ONU, com um Conselho de Segurança no qual os principais ganhadores tinham assento
permanente e poder de veto
-EUA, União Soviética, Reino
Unido, França e China.
A "China" original, aliada dos
EUA, encolheu depois que os comunistas tomaram o poder no
continente.
Para o mundo liderado pelos
EUA, "China" virou a ilha de Formosa, antiga colônia japonesa
tornada reduto dos nacionalistas
anticomunistas chineses. Demorou até ser expulsa e substituída
na ONU, em 1971, pela "China"
maior, a do continente. E ainda
hoje resta aos EUA a obrigação
militar de defender a pequena
"China" Taiwan contra a grande
China, um foco de tensão permanente na região.
Manchúria
Hoje os dois principais perdedores da guerra, Alemanha e Japão -as duas maiores economias do planeta depois dos
EUA-, querem fazer parte do
Conselho de Segurança, junto
com dois países subdesenvolvidos que se consideram representativos de suas regiões, Índia e
Brasil.
A China resolutamente tem se
oposto às pretensões de Japão e
Índia (com quem os chineses trocaram tiros em disputas de fronteira nos anos 60). O motivo vem
direto da guerra. Se para os ocidentais a Segunda Guerra costuma ser descrita como tendo durado de 1939 -data da invasão da
Polônia pelos alemães- a 1945,
para os chineses a guerra começou bem antes, em 1931 e depois
em 1937.
Em 1931 o Japão invadiu a Manchúria, no norte da China; em
1937 a guerra se ampliou para o
resto do país.
Culpados de crimes como o Holocausto dos judeus e a morte de
milhões de eslavos na frente russa, os alemães do pós-guerra em
geral reconheceram suas atrocidades, até mesmo criando um recente monumento em Berlim
lembrando a morte dos judeus.
Já os governantes japoneses -e
boa parte da população- sempre
se comportaram como se fossem
apenas vítimas, e não algozes. O
fato de terem sido alvo de duas
bombas atômicas ajudou a criar o
mito.
Em abril passado, por exemplo,
o governo japonês decidiu revisar
os livros didáticos de história para
amenizar as atrocidades cometidas pelo país durante a ocupação
da China. Foi o bastante para que
os chineses iniciassem violentos
protestos, nos quais depredaram
prédios japoneses na China sem
que houvesse intervenção policial. O caso ameaçou se tornar um
incidente internacional -o Japão
exigiu indenização e um pedido
de desculpas; Pequim rejeitou
ambas as demandas.
No final daquele mês, como forma de contornar a crise, o governo japonês pediu desculpas "pelo
prejuízo e pelo sofrimento" causado por seus atos, no passado, a
"povos de diversos países" da
Ásia. A China não foi citada individualmente.
Apesar dos esforços japoneses
para mudar a história, chineses e
coreanos não esquecem do que
sofreram.
Foram vítimas de massacres e
bombardeiros de aviação e seus
prisioneiros de guerra tornaram-se cobaias de experimentos com
armas químicas e biológicas. Mulheres coreanas foram prostituídas à força para deleite dos soldados japoneses -eram chamadas
eufemisticamente de mulheres de
"conforto".
Dá pra entender por que os coreanos do norte já testaram um
míssil, possível vetor da bomba,
sobrevoando o Japão.
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