São Paulo, domingo, 07 de agosto de 2005

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Persiste debate sobre necessidade da bomba

DA REPORTAGEM LOCAL

Mais de meio século não bastou para terminar uma das maiores polêmicas da Segunda Guerra: estavam certos os americanos em jogar duas bombas atômicas sobre o Japão em 1945?
A resposta parece óbvia a qualquer ser humano decente em 2005, conhecedor do impacto devastador da bomba e das seqüelas que continuam até hoje. Mas, para os tomadores de decisão em 1945, a escolha não era fácil -o que resultou em centenas de livros tentando entender o porquê.
Muito do que se escreveu sobre as bombas tem como ponto de partida essa natural e correta indignação atual sobre a morte de milhares de civis quando a guerra estava quase terminada. Mas, para entender o que aconteceu, seria preciso tentar compreender a situação real em agosto de 1945. E o que acontecera antes na guerra.
Dois mitos foram criados por historiadores e analistas, um mais à esquerda, outro mais à direita.
O mito de esquerda afirma que uma das mais importantes funções das bombas era impressionar a URSS. Mais do que fazer o Japão capitular, teria sido importante forçar os soviéticos a aceitarem a primazia americana.
Já o mito de direita afirma que uma invasão do Japão causaria em torno de 1 milhão de baixas entre os invasores, e as bombas apressaram o fim.
Durante a Guerra Fria essas teses eram aceitas sem muita discussão, dependendo da ideologia do autor. Novas avaliações surgiram depois, mostrando que a tragédia de Hiroshima e Nagasaki foi, senão quase inevitável, certamente explicável.
Os momentos finais da guerra têm sido dissecados em detalhe: os esforços japoneses em não se render, as falhas de comunicação, os dados que foram usados pelo presidente Harry Truman para decidir o lançamento.
A idéia de assustar os soviéticos nunca foi demonstrada categoricamente. Ao contrário, os EUA queriam acabar a guerra o mais rapidamente possível, e, para seu azar posterior, pediram ajuda da URSS para fazê-lo. A bomba de Hiroshima foi lançada em 6 de agosto, e só dois dias depois a URSS declarou guerra ao Japão.
Se os soviéticos continuassem de fora, não teriam ocupado a parte norte da Coréia, criando o Estado stalinista que persiste ali até hoje e agora diz que tem a bomba atômica.
Já as estimativas do número de mortos de uma invasão do Japão são mais discutíveis. Dificilmente chegariam a 1 milhão de baixas aliadas. Mas a selvageria do soldado japonês não ajudava os cálculos. A maioria preferia se matar a virar prisioneiro. O Japão não só criou os famosos kamikazes; os japoneses também inventaram os homens-bomba que hoje são notícia no Iraque. Soldados comuns amarravam granadas ao corpo e se jogavam contra os americanos.
Pois, mais do que os aspectos diplomáticos do final do conflito, o que contou foram os anos de guerra anteriores. Bombardear civis era a praxe na guerra, começada ironicamente por italianos, alemães e japoneses, e continuada com muito mais intensidade por seus rivais anglo-americanos.
Os alemães cometeram carnificinas aéreas em Guernica, durante a Guerra Civil Espanhola (1936-39), e em Varsóvia, Roterdã e Coventry na Segunda Guerra; os japoneses fizeram bombardeios indiscriminados contra cidades chinesas como Nanquim.
Dotados de meios melhores, de bombardeiros maiores e com maior carga de bombas, os anglo-americanos levaram a extremos essa estratégia de bombardear cidades. Os ataques contra Dresden em fevereiro de 1945, e contra Tóquio no mês seguinte, mataram dezenas de milhares de civis.
O número real de mortos nesses ataques é e continuará sendo especulativo. (RBN)

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