São Paulo, sábado, 07 de outubro de 2000

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AMÉRICA LATINA
Alvarez sai após decisão de De la Rúa de manter no governo ministro suspeito em escândalo no Senado
Vice renuncia e agrava a crise argentina

France Presse - 5.out.00
O vice Alvarez e o presidente De la Rúa na posse dos novos ministros da Argentina, anteontem


GUSTAVO CHACRA
DE BUENOS AIRES

O vice-presidente da Argentina, Carlos "Chacho" Alvarez, renunciou ao seu cargo ontem, em uma decisão que pode colocar um fim à coalizão governamental Aliança, causando a mais grave crise política da gestão do presidente Fernando de la Rúa, iniciada há dez meses.
"Não é possível conviver em um governo que silencia na questão dos subornos no Senado", disse Alvarez, com lágrimas nos olhos, no discurso de renúncia. Acrescentou, porém, que continuará apoiando a Aliança e atuará politicamente fora do governo.
"Quero ter a liberdade de dizer o que sinto sem prejudicar o presidente institucionalmente", afirmou Alvarez, que muito mais do que um vice-presidente, é o líder da Frepaso, um dos dois braços da Aliança. O outro é a União Cívica Radical (UCR), de De la Rúa.
De la Rúa, afirmou em rede nacional que lamenta a saída de Chacho, que os tempos são difíceis e que a o governo segue adiante. A imprensa argentina descreveu o discurso como fraco.
Poucas horas após o vice anunciar sua saída, Alberto Flamarique, que havia deixado de ser ministro do Trabalho para ocupar a Secretaria Geral da Presidência, também renunciou a seu cargo.
A manutenção no governo de Flamarique e do secretário de Inteligência, Fernando de Santibañes, decidida por De la Rúa em sua reforma ministerial -anunciada anteontem-, é a provável causa da renúncia de Alvarez.
Sob pressão, os dois renunciaram a seus cargos. A de Flamarique, que pertencia à Frepaso (foi expulso ontem), acabou sendo aceita. A de Santibañes, não.
Alvarez defendia a saída dos dois altos funcionários, que são suspeitos de envolvimento no escândalo do suposto pagamento de suborno para a aprovação da reforma trabalhista no Senado.
Na mudança de seus assessores, decidida em razão da crise desencadeada pelo escândalo, porém, De la Rúa preferiu mantê-los.
De certa forma, a mudança fortalecera De la Rúa e era um sinal de enfraquecimento de Alvarez.
Em um cenário político comum, a imposição do presidente sobre o vice seria normal.
A Frepaso, porém, foi o principal responsável pela vitória aliancista nas eleições presidenciais do ano passado. É o partido de dois ministros, em um gabinete com poucos integrantes oriundos do campo político.
A Frepaso também é a responsável pela manutenção da maioria parlamentar da Aliança na Câmara dos Deputados. No Senado a coligação é minoritária.

Decisão "sensata"
Até a noite de ontem, no entanto, integrantes da Frepaso, como a ministra da Ação Social, Graciela Fernandez Meijide, descartavam a saída do partido da Aliança.
Mas a atitude de Alvarez causou forte insatisfação da União Cívica Radical. O ex-presidente Raúl Alfonsín (1983-89) se disse surpreso com Alvarez e acrescentou ser contrário a sua decisão. "Mas continuo respeitando a sua pessoa", declarou.
De la Rúa emitira comunicado dizendo lamentar o fato e falaria em rede nacional ainda ontem.
Da oposição, houve tanto apoio como críticas. O presidente do Partido Justicialista na Câmara dos Deputados, Humberto Ruggero, afirmou que Alvarez foi um irresponsável. O sindicalista Hugo Moyano, líder da facção dissidente da CGT (maior central sindical do país), afirmou que Chacho tomou uma decisão "sensata". Moyano foi o primeiro a acusar Flamarique no escândalo do Senado.

Respeito aos ideais

Partidários de Alvarez diziam ontem que ele estava apenas respeitando os seus ideais.
Defensor de uma tendência bem mais à esquerda do que a da UCR, Chacho também é crítico da condução da economia.
Com passado fortemente ligado à oposição, Alvarez, descrito como "um típico menino de bairro portenho", iniciou a carreira na Juventude Peronista, integrando depois o Partido Justicialista.
Foi um forte opositor da ditadura e do governo Alfonsín. Quando Menem chegou ao poder, em 1989, Alvarez o acusou de rachar com o histórico do peronismo.
Após criar uma série de partidos pequenos, fundou a Frepaso em meados dos anos 90. Em 1999, aliou-se à UCR para derrotar Menem nas eleições presidenciais.
Ontem, na porta de sua casa, cerca de 500 pessoas se amontoaram para demonstrar apoio a ele. Alguns já ensaiavam gritos de "Chacho 2003", ano em que acontecerão eleições presidenciais.


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