São Paulo, sábado, 08 de abril de 2000


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CÚPULA
Países da região e Turquia se reúnem no Cazaquistão, sob olhar atento de Moscou e Washington
Ásia Central debate óleo e extremismo

RODRIGO UCHÔA
especial para a Folha


Começa hoje, em Baku, capital do Cazaquistão, uma reunião de seis países da Ásia Central com a Turquia. O encontro objetiva, oficialmente, estreitar os laços entre os países que falam turco, mas vai mesmo é tratar de assuntos menos amistosos: a produção de petróleo e o crescimento das guerrilhas islâmicas extremistas.
Os resquícios da Guerra Fria devem ditar as negociações. Moscou observa atentamente: a região é formada por ex-Repúblicas soviéticas, e o Kremlin a vê como área estratégica e de influência natural -a Tchetchênia está ali perto.
Os EUA capitalizaram a necessidade de investimentos que a quebrada Rússia não pôde suprir. O governo azerbaijano, por exemplo, está construindo oleodutos e gasodutos com financiamentos norte-americanos.
"Washington pretende levar o petróleo direto ao Mediterrâneo, eliminando o intermediário russo", disse à Folha Nursulan Surayev, especialista em Ásia Central da "Far Eastern Economic Review", publicação de Hong Kong.
Azerbaijão, Cazaquistão e Turcomenistão têm, juntos, a terceira maior reserva de petróleo do mundo, atrás apenas do Oriente Médio e do golfo do México. Tadjiquistão, Quirguistão e Uzbequistão têm grandes reservas de urânio -necessário para a produção de material nuclear.
A Turquia, nesse meio, quer se tornar o escoadouro do petróleo do mar Cáspio.
Os laços de amizade entre os seis realmente não se sustentam. Antes do começo da cúpula, o presidente turcomeno, Saparmurat Niyazov, já anunciou que não vai comparecer, pois não quer se sentar com o presidente do Azerbaijão, Haydar Aliev. O pomo da discórdia é a disputa pelo uso dos oleodutos da região.
Democracia não será tema, apesar de todos quererem ganhar um verniz de respeitabilidade nesse campo. Os números demonstram como funcionam os regimes "eleitos". Niyasov teve 99,9% dos votos na eleição presidencial de 94 -na anterior, teve 99,5%.
O presidente do Quirguistão, Askar Akayev, passou esta semana liberando presos políticos para demonstrar boa vontade.
"Tanto a Rússia quanto os EUA querem conservar esses governos fortes como forma de barrar o extremismo vindo do Afeganistão", afirma Surayev.

Caldeirão
Essa região da Ásia Central tem um emaranhado de 300 etnias e mais de 60 milhões de habitantes -mais de 120 milhões, se contada a Turquia. É a região do mundo em que o islã cresce mais rápido (cerca de 85% dos habitantes são muçulmanos).
"Porém a religião, com seus preceitos morais e éticos, não é um ponto de união", diz Anthony Pinter, cientista político da Universidade de Maryland (EUA).
"O fundamentalismo wahhabita (movimento originário da Arábia do século 18) cresce no vale de Ferghana e tem ajuda do regime do Taleban (que governa 90% do Afeganistão) contra a maioria sunita." A fronteira do Tadjiquistão com o Afeganistão é patrulhada por 20 mil soldados russos.
A região é a confluência histórica de três impérios em combate por influência: o Turco-Otomano, o Russo e o Chinês. Hoje, todos esses Estados são Repúblicas, mas continuam com um ranço de política imperial. Até a China enfrenta o separatismo muçulmano, na Província de Xinjiang.
A reunião, que vai até segunda-feira, estará sentada sobre um barril de pólvora -clichê que poderia ser substituído por barril de petróleo. Muitos tentam atear fogo ao pavio.


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