São Paulo, quarta-feira, 08 de abril de 2009

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Ato pune violação da ordem democrática, diz testemunha

FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

Membro da equipe de jornalistas que descobriu e investigou o massacre de La Cantuta, Ricardo Uceda avalia que a sentença contra Fujimori avança ao demonstrar a culpa do líder de um regime ditatorial. Mas diz que sua vitória sobre o Sendero Luminoso e as reformas econômicas continuarão lhe dando força política. Uceda, 55, é autor do livro "Morte no Pentagonito: Os Cemitérios Secretos do Exército Peruano", e participou do processo contra Fujimori na condição de testemunha. Leia, a seguir, a entrevista à Folha, por telefone:

 

FOLHA - Qual é a importância da condenação?
RICARDO UCEDA
- Tem importância jurídica, política e histórica. Significa uma mudança na forma de administração de Justiça na América Latina para mandatários que violaram a ordem constitucional. A decisão demonstra como, num sistema ditatorial, quem está no topo é responsável por tudo. O importante é a culpabilidade de alguém que subverteu a ordem democrática para poder governar, abrindo espaço para que esses crimes fossem possíveis.

FOLHA - O sr. foi testemunha do processo. Qual é o grau de envolvimento do ex-presidente nos casos de La Cantuta e Barrios Altos?
UCEDA
- Eu me limitei a relatar o que ocorreu nos mandos executores dos crimes. Eu não tinha provas do nível de conhecimento de Fujimori. O tema de quanto Fujimori sabia da organização desses crimes era muito importante e tomou boa parte do processo. Mas há abundante informação sobre o que Fujimori encobriu e deixou de fazer depois dos crimes.

FOLHA - O seu livro descreve crimes militares no primeiro mandato de Alan García (1985-1990), atual presidente. Ele poderia ser julgado?
UCEDA
- É um risco remoto. A acusação contra García está bloqueada pelo tema da prescrição. Mas a discussão sobre a pertinência desse julgamento ainda está viva. Não estou dizendo que esses políticos [anteriores a Fujimori] deveriam ser declarados culpados, mas que deveria haver um processo para determinar sua participação. A verdade que está ficando é que só houve atos isolados das forças militares ou policiais, quando há muitos casos de povoados inteiros eliminados por serem considerados comprometidos com a subversão.

FOLHA - Fujimori, além da condenação, também será lembrado pela vitória sobre o Sendero Luminoso. Qual é o seu legado ao país?
UCEDA
- A sua comunicação política com o povo, o fato de ter se dedicado a fazer obras em povoados isolados e o ordenamento da economia são feitos positivos. Parte desse legado foi a decisão de tomar as rédeas da luta contra a subversão. Mas tudo isso foi ofuscado pelo golpe de Estado que rompeu a ordem democrática e alimentou uma corrupção inaceitável.

FOLHA - A Comissão da Verdade relata a morte de quase 70 mil pessoas. Qual é o próximo passo?
UCEDA
- Lamentavelmente, há uma divisão ideológica em relação ao que ocorreu na luta contra o terrorismo. O relatório da comissão -exaustivo e honesto- é contestado por setores responsáveis pelas violações. Mas também é certo que o fato de que houve um setor político [de esquerda] preponderante na comissão abre espaço para que haja uma discussão cheia de ódio sobre o trabalho.


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