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ANÁLISE
Crise ameaça reeleição, mas economia ajuda
RUPERT CORNWELL
DO "INDEPENDENT", EM WASHINGTON
Provavelmente nunca uma semana política foi tão construída
por fotografias. As fotos chocantes de prisioneiros sendo humilhados por homens e mulheres recrutados pelas "melhores Forças
Armadas do mundo" devastaram
a imagem dos Estados Unidos e
quase levaram um secretário da
Defesa a renunciar, além de afetar
uma Presidência arrogante.
George W. Bush finalmente
sentiu os calafrios comuns aos
políticos mortais. Mas não por
causa das duras críticas da semana. O que importa são seus índices de aprovação, que caíram nesta semana abaixo dos 50%. Nunca
desde Harry Truman e sua milagrosa virada em 1948 um presidente ganhou um segundo mandato com popularidade tão baixa
neste momento do ciclo eleitoral.
Mas o destino de Bush ainda
não está selado. "Acontecimentos, caro rapaz, acontecimentos",
respondeu o premiê britânico
Harold MacMillan, ao ser indagado sobre qual era o mais imprevisível aspecto de um governo.
Nenhum especialista sensato
correria o risco de prever o que
acontecerá até o pleito de novembro. São acontecimentos internos, mas sobretudo os do Iraque,
que formarão o eleitorado.
É previsível que a situação se
acalme e dê à Casa Branca uma
pausa para respirar. Com forças
de segurança iraquianas nas ruas,
Fallujah pode sossegar. O establishment xiita do sul pode silenciar Moqtada Al Sadr.
Por sua vez, Lakhdar Brahimi, o
enviado especial da ONU, pode
ainda encontrar uma fórmula que
evite o desastre na transferência
limitada de soberania que Bush
insiste que aconteça até julho.
Mas as coisas podem piorar. A
desordem pode se tornar mais
aguda, conforme as fotografias da
prisão de Abu Ghraib esvaziem o
tanque que armazena o apoio à
missão dos EUA no Iraque.
Mais insurgentes podem se rebelar e as baixas americanas podem subir, arrastando o apoio a
Bush. Apenas agora, após uma semana de bombardeios de imagens do Iraque, é que o pleno impacto das fotografias atingirá em
cheio o público. Tomadas como
um conjunto, Fallujah, os problemas administrativos e Abu
Ghraib podem se tornar algo parecido à ofensiva do Tet no Vietnã
de 1968 -o momento em que a
opinião pública se voltou irreversivelmente contra a guerra.
Os americanos ainda acreditam
que Bush tinha razão ao invadir o
Iraque. Mas a maioria tende a
acreditar que a guerra foi um erro,
já que o presidente, ao fazer da
guerra o principal ingrediente de
sua luta contra o terrorismo, vê-se
repentinamente derrotado.
Há em seguida o estrago feito à
própria imagem pessoal de Bush.
O mito do comandante que conduz um barco harmonioso está
em definitivo destruído. Se as eleições não estivessem próximas é
possível que Rumsfeld tivesse caído, e o ministério, reformulado.
Os republicanos festejam o fato
de John Kerry não ter tirado vantagens dessa péssima semana.
Kerry não exigiu a queda de
Rumsfeld, mas, nos últimos dias,
incrementou suas taxas de preferência, hoje sensivelmente melhores que as do então oposicionista Bill Clinton a esta altura da
campanha, em 1992, contra George Bush pai. Bush também sabe
que seu adversário tem fama de
ser "bom de chegada".
Mas podem ser números completamente diferentes que salvem
Bush. O Ministério do Trabalho
disse anteontem que 288 mil novos empregos foram criados em
abril. Caso a tendência prossiga,
os americanos se convencerão de
que a prosperidade doméstica é
melhor que a ignomínia externa.
Só assim Bush seria reeleito.
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