São Paulo, domingo, 08 de maio de 2005

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MÉXICO

O excêntrico prefeito de Cidade do México se fortalece como presidenciável após denúncias que quase o derrubaram

López consolida favoritismo após crise

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL À CIDADE DO MÉXICO

Desde que assumiu a Prefeitura da Cidade do México, em 2000, o esquerdista Andrés Manuel López Obrador concede diariamente uma entrevista coletiva no Palácio do Governo. Tão raro quanto a freqüência é o horário estabelecido para o encontro com os jornalistas: 6h30.
Na última terça-feira, a reportagem da Folha e mais 30 colegas madrugadores da imprensa mexicana lotavam a pequena sala destinada às entrevistas, dentro do Palácio de Governo, na histórica praça Zócalo, centro da capital.
Caminhando rapidamente, López, 51, terno impecável e cabelo cuidadosamente penteado, chega à sala e logo começa a responder às perguntas, gritadas pelos jornalistas como se estivessem dando lances num leilão.
Naquele dia, e provavelmente durante todo o mês de abril, López não ouviu nenhuma pergunta sobre a sua administração ao longo dos 40 minutos da coletiva, apesar de governar a maior cidade da América Latina. A entrevista não era com o prefeito da Cidade do México. Estava ali o líder mais popular do país, favorito para as eleições presidenciais do ainda distante 2 de julho de 2006, e que, dias atrás, conseguira reverter um processo político que o ameaçava colocar na cadeia e tirá-lo da disputa presidencial.
Vários jornalistas queriam detalhes antecipados do encontro marcado para anteontem à noite com o presidente Vicente Fox. Também houve perguntas sobre quando ele se desincompatibilizaria do cargo para disputar as prévias do seu partido, o PRD (Partido da Revolução Democrática).
Considerada uma excentricidade do ex-prefeito, a "mañanera" foi uma das principais armas de López nos meses em que se arrastou a crise política, iniciada em 17 de maio do ano passado, quando a Procuradoria Geral da República pediu à Câmara dos Deputados sua perda da imunidade para poder processá-lo criminalmente.
"Pessoalmente, ele conversa normalmente. Para a imprensa, fala muito devagar, porque pensa duas, três vezes", disse à Folha o analista político Lorenzo Meyer. "Não conheço ninguém que dê coletivas diárias. Mas, como estava sob ataque, elas faziam sentido. Era uma guerra de guerrilhas, e ele era o guerrilheiro na notícia."
A crise atingiu o ápice no início de abril, quando López, acusado de desobedecer a uma ordem judicial ao construir uma pequena via de acesso na periferia da cidade, perdeu a imunidade após um acordo na Câmara entre o tradicional PRI, que governou o país por quase todo o século passado, e o PAN, do presidente Fox.
Criticada dentro e fora do país, a decisão provocou uma rápida reação de López. Em entrevistas, comparou-se a Gandhi e a Martin Luther King e disse que faria a campanha de dentro da cadeia.
Mas a grande demonstração foi quando o prefeito conseguiu reunir na praça Zócalo cerca de 1 milhão de pessoas no dia 24 de abril, na maior manifestação realizada nos últimos anos no país.
Após defender o processo dizendo que "no México ninguém está acima da lei", Fox, acuado e sob pressão, aceitou a demissão do procurador-geral Rafael Macedo de la Concha, principal impulsionador do processo contra López. No lugar, nomeou Daniel Cabeza de Vaca com a incumbência de encerrá-lo -ou seja, desfazer tudo o que o antecessor fizera.
Tentando encerrar de vez o caso, Fox recebeu López para uma reunião a sós. Na saída da conversa, que durou 20 minutos, o prefeito disse que expressou a Fox sua disposição para "contribuir para que as eleições de 2006 sejam livres, limpas e em paz". Fox não havia se pronunciado até o fechamento desta edição.
"Todos os partidos perderam nesse processo", afirma o analista Gabriel Guerra. "O que menos perdeu foi o PRD, pois mostra que tem um certo nível de ordem e coesão. Isso, para qualquer partido político de esquerda na América Latina, já é uma grande vantagem. Segundo, López demonstrou um poder muito importante de convocação. Terceiro, conseguiu manter a ordem na mobilização. Isso foi muito importante para sua imagem em muitos setores de classe média alta".
López saiu da crise com uma popularidade ainda maior e lidera todas as pesquisas de intenção de votos. Para analistas, não é suficiente. O PRD, fundado em 1989, ainda tem pouca penetração, e o PRI voltou a ganhar espaço nos Estados. Apesar da confusão, a campanha está só começando.

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