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HISTÓRIA
Segundo Robert Jervis, novos documentos contradizem versão de que país temia "efeito dominó" comunista na Ásia
Arrogância causou Vietnã, diz analista
DE NOVA YORK
Professor de relações internacionais da Universidade Columbia, Robert Jervis afirma que novos documentos contradizem a
versão mais aceita de que os EUA
entraram na Guerra do Vietnã para conter um efeito dominó comunista na Ásia, mesmo sabendo
que podiam perder.
De acordo com Jervis, que fez
doutorado em Berkeley e dava aula em Harvard, o país "tinha um
sentimento de domínio militar".
Ele cita o livro "Perils of Dominance: Imbalance of Power and
the Road to War in Vietnam", de
Gareth Porter, a ser publicado em
junho, para fundamentar seus argumentos. "Segundo esse livro, os
EUA não tinham medo do efeito
dominó, mas das impressões que
isso iria causar. No final, era com
as avaliações dos outros, chineses,
russos, europeus, que os EUA estavam mais preocupados", diz.
Para o professor, uma diferença
importante entre o Iraque e o
Vietnã é o número de americanos
mortos. Foram 1.600 em mais de
dois anos no Oriente Médio. Em
dois meses, morria mais gente no
confronto da década de 70.
Entre as diferenças está a "cegueira" do presidente George W.
Bush no manejo de informações.
"Bush não recebeu menos informação, ele simplesmente ignorou
o que tinha. A inteligência estava
errada nas armas de destruição
em massa, mas alertou que haveria problemas de insurgência armada e caos", diz. Leia a entrevista abaixo.
(PEDRO DIAS LEITE)
Folha - Trinta anos depois de uma
guerra tão estudada, há algo novo
sobre o Vietnã?
Robert Jervis - Novos documentos mostram que os EUA entraram na guerra porque tinham um
sentimento de domínio militar.
Em outras palavras, é o contrário
do que se pensa sobre a guerra, de
que os EUA entraram não tanto
porque esperavam vencer, mas
porque sentiam que simplesmente tinham de evitar um efeito dominó. Um novo livro ("Perils of
Dominance: Imbalance of Power
and the Road to War in Vietnam",
de Gareth Porter, a ser publicado
em junho) argumenta que o efeito
dominó até era real, mas limitado.
Nem mesmo nós esperávamos
um efeito de maior alcance.
Folha - Então o país nunca pensou
que pudesse perder, mas era uma
intervenção necessária?
Jervis - Segundo esse livro, os
EUA não tinham medo do efeito
dominó, mas das impressões que
isso iria causar. Acho que, no final, era com as avaliações dos outros, chineses, russos, europeus,
que os EUA estavam mais preocupados. Os EUA superestimaram suas chances de vencer, e
Lyndon Johnson [1963-69] achava que o fato de os EUA serem
muito mais fortes que os norte-vietnamitas, e de fato eram, levaria a vencer a guerra. E isso simplesmente estava errado. Embora
os EUA fossem muito mais fortes
em termos materiais, para os vietnamitas era uma questão de vida
ou morte. Os EUA nunca realmente entenderam o quanto eles
estavam dispostos a sofrer para
não perder aquela guerra.
Folha - Hoje o país está em outra
guerra, no Iraque, em que muitos
vêem semelhanças com o Vietnã. É
possível traçar paralelos entre esses dois conflitos?
Jervis - Alguns. Mas há realmente muitas diferenças. Começando
pelas similaridades, as duas guerras se mostraram muito mais difíceis do que seus líderes pensavam. No caso vietnamita, os líderes dos EUA tiveram um bom serviço de inteligência e ouviram
suas fontes. John F. Kennedy
[1961-63] e Johnson receberam
muita informação sobre a guerra,
sabiam que seria difícil, mas esperavam vencer e entraram com
seus olhos abertos.
Mas a atual administração não.
Bush e seu pessoal pensaram que
a vitória seria fácil, como foi, mas
que a reconstrução política seria
também, sem resistência. E eles
acreditaram nisso apesar do fato
de que a inteligência estava dizendo a eles algo diferente. Então eles
estavam cegos. Na questão da luta, a diferença na escala é enorme.
E faz muita diferença ter perdido
até agora 1.600 vidas de americanos, o que é terrível. Mas, lembre-se, no Vietnã, no auge da luta, você ouvia em perdas de 1.600 vidas
em dois meses, em vez da guerra
inteira. [Morreram 58 mil norte-americanos, no total].
Folha - O sr. disse que os EUA sabiam das dificuldades do Vietnã,
apesar de acharem que venceriam.
No caso de Bush, qual era o grau de
conhecimento?
Jervis - Bush não recebeu menos
informação, ele simplesmente ignorou o que tinha. A inteligência
estava errada nas armas de destruição em massa, mas alertou
que haveria problemas de insurgência armada e caos. A Casa
Branca e os civis no Pentágono ignoraram isso. E nesse caso, os relatórios de inteligência disseram
que seria difícil.
Folha - Então os EUA não só não
aprenderam com o Vietnã como
agiram pior do que no passado?
Jervis - A principal lição do Vietnã foi que você não deve lutar
contra nacionalistas em selvas de
países que não entendemos. Temos de ver se agora estamos enfrentando isso ou não.
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