São Paulo, domingo, 08 de julho de 2007

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ARTIGO

Antiga escola de ditadores persiste

NEWTON CARLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Disposto a preservar parcela da América Latina na guerra contra o terrorismo, o Pentágono trata de evitar o fechamento de uma relíquia dos anos de chumbo, a Escola das Américas. Até 1984 ela funcionou no Panamá, de onde se deslocou para Forte Benning, nos EUA, por imposição do tratado de 1977 acabando com a ocupação americana da zona do canal.
Um deputado do clã dos Kennedy, com o nome de seu avô Joseph, assumiu o compromisso de sepultá-la e neste ano dois parlamentares, Jim McGovern e John Lewis, apresentaram emenda que significaria o seu fim, ainda não alcançado.
Há manifestações hostis diante dos portões de Forte Benning. Uma das presenças constantes é a do ator Martin Sheen, famoso em boa parte pelo papel de presidente num seriado de televisão. ONGs como a School of the Americas Watch denunciam o que significou e pode significar a escola na transição da Guerra Fria para essa nova espécie de conflito sob suspeita de aplicar métodos brutais, inclusive tortura. A má fama da SOA fez com que o Pentágono pedisse e conseguisse do Congresso, em 2002, a mudança de nome.
Agora é o Western Hemisphere Institute for Security Cooperation, ou Whinsec, a sigla em inglês cuja pronúncia, mais difícil, pode amenizar aparências. Em Washington, o Council of Hemispheric Affairs preparou um dossiê sobre origens, denúncias e constatações. A Escola das Américas foi criada em 1946, como instrumento da Guerra Fria. Não tardaram a surgir rumores de que em seus manuais havia técnicas de interrogatório que violavam direitos humanos, como tortura. Um jornal panamenho, o "La Prensa", chamou-a de "escola de assassinos". Um ex-presidente do Panamá, Jorge Llueca, considerou-a "a maior base de desestabilização da América Latina". O apelido mais comum ficou sendo o de "escola de ditadores". Mas não faltaram outros com apêndices de brutalidade, como "enfermaria de esquadrões da morte".
Em seus 59 anos, a ex-SOA treinou mais de 60 mil militares latino-americanos em práticas de contra-insurgência. No ano passado foram 670, a grande maioria da Colômbia, o que configura a transição para a guerra contra o terrorismo. Vários ex-ditadores latino-americanos, como o chileno Augusto Pinochet, foram treinados lá. Um de seus ex-alunos mais notórios foi o major Roberto D'Aubuisson, assassino do arcebispo Oscar Romero, de El Salvador. As impressões digitais da ex-SOA ficaram no massacre de El Mozote (900 homens, mulheres e crianças) e no esquadrão da morte do general hondurenho Humberto Regalado. Também há rumores de que os manuais tinham técnicas de gole de de Estado.
O Pentágono enfrenta dificuldades em incorporar militarmente a América Latina na guerra contra o terror. Uma das peças-chave, a base de Manta, no Equador, está sob ameaça de fechamento em 2009, quando expira a concessão. O novo presidente equatoriano, um populista de esquerda, já disse que não vai renová-la. Tampouco andam bem as manobras navais conjuntas Unitas. Mas o Whinsec continua de pé.


O jornalista NEWTON CARLOS é analista de questões internacionais


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