São Paulo, quinta-feira, 08 de agosto de 2002

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COLÔMBIA

Para Santos, fim do tráfico mudará perfil do conflito

Governo exige cessar-fogo total para dialogar, diz vice de Uribe

ROGERIO WASSERMANN
DA REDAÇÃO

O novo governo colombiano exige um "cessar-fogo total" da guerrilha e dos grupos paramilitares como condição para iniciar um diálogo. "A disposição do governo [para negociar" é total, mas precisamos saber é se há disposição por parte dos grupos violentos", disse o vice-presidente Francisco Santos, 38.
Em entrevista à Folha, por telefone, de Bogotá, Santos disse que o governo Uribe pretende fazer em quatro anos o que seus antecessores vêm tentando há mais de duas décadas: acabar com o narcotráfico, considerado a base de todo o conflito do país.
Integrante da família proprietária do jornal "El Tiempo", o mais importante do país, Santos foi sequestrado, em 1990, pelo grupo dos "extraditáveis", narcotraficantes liderados por Pablo Escobar que promoviam uma campanha terrorista contra o Estado para evitar serem julgados nos EUA.
A história do sequestro de Santos, na época diretor de Redação do jornal, foi relatada no livro "Notícia de um Sequestro", de Gabriel García Márquez. Santos foi solto em 1991, após o governo aceitar rever a lei de extradição.
A indicação de Santos a vice de Uribe, em março, foi criticada em editorial do "Tiempo", do qual ele já havia se afastado após o sequestro para dirigir a Fundación País Libre, organização de combate aos sequestros. O jornal declarou sua independência em relação ao governo e disse que Santos não poderia voltar a trabalhar na empresa. Leia a seguir trechos da entrevista que concedeu à Folha.

Folha - O que muda no conflito colombiano com o novo governo?
Francisco Santos -
Primeiro é que haverá muito mais investimento do Estado. Nos próximos dois anos, pretendemos gastar US$ 1 bilhão a mais anualmente, o que vai permitir ampliar muito o efetivo militar e comprar equipamentos para um esforço sério. Segundo, mudar a doutrina e a prática militar, de forma muito mais estratégica, para apontar a objetivos que modifiquem o balanço do conflito. Terceiro, decisão e vontade de fazer respeitar os direitos humanos com um Estado forte.

Folha - E existe a possibilidade de este governo iniciar um novo processo de paz com a guerrilha?
Santos -
Um processo de paz como fez o presidente Andrés Pastrana não, porque não haverá desmilitarização de nenhuma região e exigimos um cessar-fogo como condição para negociar. A disposição do governo é total, mas precisamos saber é se há disposição por parte dos grupos violentos.

Folha - E uma negociação poderia incluir também os paramilitares?
Santos -
O presidente já disse que sim, que ele está aberto a um processo político. Mas as condições são as mesmas.

Folha - Qual o maior problema da Colômbia hoje?
Santos -
Acho que o principal é o narcotráfico. Isso é o que move o conflito armado, dá dinheiro aos paramilitares e à guerrilha. O que temos de fazer é atacar o narcotráfico, com toda a vontade, decisão e esforço. O presidente Uribe já fixou uma meta muito ambiciosa, que dentro de quatro anos não saia um quilo mais de droga da Colômbia. Sabemos que é difícil, mas a vontade nesse sentido é absolutamente clara. Que não haja a menor dúvida para a comunidade internacional, para os narcotraficantes e para os colombianos. Quando acabarmos com esse delito, o conflito passará a ter uma dimensão diferente.

Folha - Há 20 anos os governos colombianos prometem acabar com o narcotráfico. Como é possível fazê-lo em quatro anos?
Santos -
A verdade, quero ser sincero, é que os governos colombianos não têm sido claros nem tiveram vontade suficiente, não tomaram decisões. Iremos a fundo nisso. Acho que a ajuda dos EUA pode ser a grande diferença para acabar com o problema. Temos capacidade, sem dúvida, de, em quatro anos, mudar completamente o balanço militar do conflito, cortando as fontes de financiamento dos grupos violentos.

Folha - O novo governo pedirá ampliação da ajuda americana?
Santos -
Para nós seria muito importante que essa ajuda aumentasse. De qualquer maneira, já estão nos ajudando, com cerca de US$ 600 milhões ao ano. Mas é óbvio que este conflito pode desestabilizar o continente. Por isso a importância dos EUA é vital.

Folha - O sr. considera a situação atual pior do que a da época em que o sr. foi sequestrado?
Santos -
A força dos grupos armados hoje é muito maior. Os ingressos pelo narcotráfico se multiplicaram, os ingressos pelos sequestros se multiplicaram.



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