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SAÚDE
Alertas sobre o Paxil, um dos mais vendidos no mundo, reabrem a discussão sobre os efeitos desses medicamentos
Antidepressivos voltam a ser questionados
GARDINER HARRIS
DO "NEW YORK TIMES"
Alertas de agências reguladoras
dos EUA e do Reino Unido sobre
a segurança do Paxil, um dos antidepressivos mais utilizados no
mundo, estão reabrindo questionamentos em relação a toda uma
classe de medicamentos que inclui o Prozac e o Zoloft.
No Brasil, o equivalente do Paxil
é o Aropax, também produzido
pelo laboratório GlaxoSmithKline. Seu correspondente genérico
é o Cloridrato de paroxetina.
Médicos especializados no tratamento de doenças afetivas começam a reagir ao alerta, divulgado em junho último por autoridades britânicas da área de controle
de medicamentos, sobre a existência de estudos não publicados
que mostrariam que o Paxil conteria um risco substancial de levar
adolescentes e crianças a considerarem o suicídio.
O alerta foi endossado alguns
dias depois pela Food and Drug
Administration (FDA, agência de
controle de alimentos e medicamentos dos EUA), que estuda impor novas restrições ao uso de antidepressivos. A FDA enfatizou,
no entanto, que pacientes jovens
"não devem interromper o uso de
Paxil sem consultar seu médico".
Autoridades britânicas prometem examinar "urgentemente" as
implicações dos estudos, realizados pelos próprios fabricantes,
mas não divulgados inteiramente.
Já os defensores desses antidepressivos sustentam que a uso deles por milhões de pessoas em todo o mundo, inclusive crianças e
adolescentes, desde o início dos
anos 90, preveniu muito mais suicídios do que os novos estudos
sugerem que possam ter causado.
Serotonina
O Paxil integra uma classe de
medicamentos antidepressivos
conhecida como inibidores seletivos de recaptação de serotonina
(ISRS), substância química que
ajuda na transmissão de sinais
elétricos de uma célula nervosa
(neurônio) para outra.
No processo de comunicação
nervosa, a serotonina é liberada
de um neurônio e "viaja" até o
próximo, onde é absorvida pela
membrana, desencadeando reações no interior da célula, ou retorna ao neurônio original.
A depressão e outros transtornos de ansiedade podem ser causados por uma disfunção química
no cérebro, que pode afetar, entre
outras coisas, a oferta de serotonina entre as células nervosas.
O Paxil impede que a serotonina seja reabsorvida pela célula
nervosa original e, ao elevar a
oferta da substância entre os neurônios, ajuda a normalizar a comunicação no sistema nervoso.
Há 12 anos, houve intensa discussão sobre a possibilidade de os
medicamentos ISRS estimularem
o suicídio, mas ela acabou sendo
descartada pela FDA. Entretanto,
dos dez especialistas americanos
que, como membros da FDA,
descartaram essa possibilidade
em 1991 sete agora afirmam que
pretendem reavaliar sua posição.
"Em 1991, dissemos que não havia indícios suficientes para sustentar a existência de qualquer ligação entre essas drogas e o suicídio", diz Jeffrey Lieberman, professor de psiquiatria e farmacologia da Universidade da Carolina
do Norte (EUA). "Agora, há indícios de que essa relação exista pelo menos em crianças, e não descartaria a possibilidade de ocorrer
também em adultos." Cerca de
5% das receitas de ISRS são destinadas a menores de idade.
Embora as dúvidas atuais refiram-se especificamente ao Paxil,
os outros medicamentos ISRS
atuam de forma semelhante e,
portanto, a preocupação se estenderia a todos eles.
Até mesmo médicos que não
acreditam existir uma ligação entre os ISRS e um aumento da tendência de suicídio enfatizam que
os pacientes precisam ser cuidadosamente monitorados nas primeiras semanas de tratamento.
É o que sugere Philip Perera, da
GlaxoSmithKline. "Veja os pacientes todos os dias, se preciso."
Empresas reagem
As empresas farmacêuticas, que
faturam bilhões de dólares com os
ISRS, reagem com cautela.
"Estamos discutindo a questão
com a FDA para chegar a um entendimento comum", diz Perera.
A Pfizer, fabricante do Zoloft, afirma que o medicamento é diferente do Paxil e passou por todas as
avaliações da FDA, a última em
junho passado. Já a Eli Lilly &
Company, do Prozac, diz que a
droga não provoca suicídio.
Os responsáveis britânicos dizem que análises de estudos feitos
sobre o Paxil mostram que os
pensamentos e as tentativas de
suicídio entre jovens e crianças
que usavam o produto foram 3,2
vezes maiores do que entre pacientes da mesma faixa etária que
consumiram placebo.
"Abismo suicida"
Alguns especialistas suspeitam
que, nas primeiras semanas de terapia, drogas como o Paxil poderiam empurrar alguns pacientes a
um "abismo suicida". Há duas explicações. A primeira é que haveria uma "desinibição da depressão". No início, o paciente continuaria a sentir os efeitos da depressão -como desamparo, desesperança e até mesmo tendências autodestrutivas-, mas já estariam menos apáticos.
Assim, poderiam estar mais
suscetíveis a agir destrutivamente
até que se chegasse a uma melhora significativa do quadro.
Em segundo lugar, a maior oferta de serotonina pode acarretar
ansiedade, irritabilidade e desconforto. Segundo Mark Riddle,
diretor da divisão de psiquiatria
de crianças e adolescentes da Escola de Medicina da Universidade
Johns Hopkins, as crianças parecem particularmente vulneráveis.
"Crianças tendem a ficar bastante ativadas, especialmente
quando tomam doses de ISRS
equivalentes às de adultos. Tivemos vários casos de crianças que
ficaram tão desinibidas que tiveram atitudes imprudentes", diz.
Droga "revolucionária"
Já David Schaffer, pesquisador
da Universidade Columbia, sustenta que o número de suicídios
de adolescentes caiu significativamente em países onde remédios
antidepressivos são receitados
com maior frequência.
"Essa queda é provavelmente o
resultado de um tratamento mais
disseminado de jovens com os
ISRS, e sugere que essas drogas
sejam responsáveis por salvar
muitas vidas", diz. "A introdução
dos ISRS foi uma revolução."
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