São Paulo, sábado, 8 de agosto de 1998

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RELIGIÃO
Vaticano ignora pressão israelense e nomeia um refugiado para alto posto da Igreja Católica em Israel
Palestino que vive no Brasil vira arcebispo

PAULO DANIEL FARAH
da Redação

Um bispo palestino que vive no Brasil desde 1990 é o pivô de uma crise que está abalando as relações entre o Vaticano e Israel.
O Vaticano respondeu à tentativa israelense de interferir na indicação do palestino Pierre Mouallem para arcebispo da Galiléia (norte de Israel) afirmando que a nomeação na Igreja Católica cabe apenas ao papa João Paulo 2º e que essa é "uma interferência política inadequada num assunto que diz respeito à Santa Sé".
O jornal israelense "Maariv" publicou que o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, deixou claro a líderes da Igreja Greco-Melquita e do Vaticano que queria que Emil Shufani, bispo considerado amigável ao governo israelense, fosse nomeado arcebispo da Galiléia. A assessoria de Netanyahu confirmou que ele tinha encontrado Shufani e que "Israel expressou sua opinião aos membros da igreja".
Netanyahu disse que estava "descontente" com a nomeação de Mouallem, mas o papa deu suas bênçãos ao bispo palestino. Um funcionário do governo israelense afirmou que Netanyahu teme que Mouallem, refugiado palestino em 1948, coloque a comunidade católica contra Israel.
Ciro Benedittini, porta-voz-adjunto da Santa Sé, disse ontem ao governo israelense que existe um "acordo fundamental" entre o Vaticano e Israel, previsto no artigo 3, que garante "a autonomia da igreja e do Estado, cada um em seu próprio domínio".
Segundo Benedittini, "apenas ditaduras intervêm desse modo". Até hoje, os únicos países que tiveram uma disputa com o Vaticano devido à nomeação de bispos foram a China e o Vietnã.
Benedittini afirmou, ainda, que "a nomeação de bispos da Igreja Católica cabe ao Sumo Pontífice no exercício de seu mais alto poder" e que, "na designação de Mouallem, o sínodo (do grego "synodus", que significa reunião, concílio) da Igreja Grega Católica procedeu livre de qualquer forma de pressão externa".
Segundo a agência italiana "Ansa", Netanyahu teria dito ainda que Mouallem seria impedido de entrar em Israel quando fosse assumir a diocese (divisão territorial sujeita à administração eclesiástica de um bispo ou arcebispo), o que disturbaria ainda mais as relações entre a Santa Sé e o país.

Jerusalém
O jornal italiano "La Reppublica" disse que "a intervenção incomum de Netanyahu não ajuda a criar o clima de confiança necessário para lidar com a delicada questão de Jerusalém".
Os palestinos reivindicam a parte oriental da cidade como a capital de um Estado independente. Israel considera Jerusalém sua capital "eterna e indivisível". Segundo o "La Reppublica", o Vaticano espera que ela se torne uma cidade internacional, conforme estabelecido pela ONU em 1947.
O agravamento da crise pode reduzir as chances de o papa visitar a Terra Santa no ano 2000, jubileu do cristianismo.



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