São Paulo, quarta-feira, 08 de setembro de 2004

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TERROR NA RÚSSIA

Manifestação após ataque a escola reúne 100 mil em Moscou; TVs oficiais participaram da mobilização

Kremlin estimula protesto contra terror

DA REDAÇÃO

Estimuladas por entidades ligadas ao presidente Vladimir Putin e pela Prefeitura de Moscou, cerca de 100 mil pessoas, entristecidas e revoltadas, participaram ontem nas imediações da praça Vermelha de manifestação contra o terrorismo, responsável pelo seqüestro de cerca de 1.200 pessoas numa escola da Ossétia do Norte.
O seqüestro terminou na sexta-feira com a intervenção das forças oficiais. Morreram 366 pessoas, segundo as últimas cifras do governo. Entre elas, 156 crianças e 31 terroristas. Não foram identificados 107 cadáveres, e há 332 pessoas ainda hospitalizadas.
Putin procurou, com a manifestação de ontem, fornecer da Rússia uma imagem unitária. "Não entregaremos o país aos terroristas", "O inimigo será esmagado", diziam alguns dos cartazes carregados por manifestantes, cercados por forte dispositivo policial.
O ato público foi precedido de intensa propaganda nas emissoras do governo, sobretudo na NTV, controlada pela Gazprom, estatal da exploração de gás.
Segundo a Associated Press, atores e atrizes foram escalados para convidar a população a uma manifestação na qual foram tolerados saudosistas da extinta União Soviética, que agitavam bandeiras com a foice e o martelo.
A Prefeitura de Moscou acionou sua máquina para o sucesso do ato público. "Moscovitas, nós não somos frouxos, somos mais fortes do que eles [os terroristas]", disse o prefeito Yuri Luzkov.
A Associated Press cita um estudante, Alexander, 18, presente na praça Vermelha porque "não somos indiferentes aos atentados terroristas". Mesmo assim, disse ele, "sabemos que isso foi organizado pelas autoridades".
A agência Reuters cita políticos da oposição, para os quais a manifestação procurou eclipsar as críticas que o Kremlin vem recebendo, em razão do malogro da política de Putin na Tchetchênia e de sua incapacidade dar aos russos melhor segurança.
Essas críticas estão cada vez mais abafadas pelo oficialismo da mídia. Ontem, entidades estrangeiras voltaram a criticar Putin e seu governo.
A ONG Repórteres sem Fronteiras, baseada na França, e o Comitê para a Proteção de Jornalistas, de Nova York, exigiram inquérito sobre as circunstâncias que levaram à tentativa de envenenamento, na semana passada, de Anna Politkovskaya, especialista em Tchetchênia na "Novaya Gazeta".
Há no mínimo três outros jornalistas presos: Andrei Babitsky, russo a serviço da rádio Liberty, dos EUA, e dois repórteres georgianos, detidos desde sábado ao se aproximarem de Beslan.
Pesquisa citada pela Reuters revela que 54% dos russos acreditam que os serviços de segurança sejam corruptos, enquanto 23% os consideram incompetentes.
Segundo a France Presse, dois dos seqüestradores de Beslan tinham sido presos por suspeita de terrorismo e em seguida libertados. São eles Janpachi Kulayev e Mayerbeck Chaybekjanov.
Em Vladikavkaz, capital da Ossétia do Norte, um cartaz transportado numa passeata que reuniu 2.000 pessoas dizia: "A corrupção é causa do terrorismo".
Mesmo assim, os moscovitas davam aos jornalistas declarações com sentimentos de temor e revolta. Acreditavam, como herança do período soviético, de que só um governo fortalecido pode derrotar os terroristas tchetchenos.
"Deveríamos reagir como os espanhóis, que saíram às ruas espontaneamente e não esperaram que o governo os convocasse", disse Natalia Soljenitzyn, mulher do ex-dissidente e Prêmio Nobel Alexander Soljenitzyn.
Enquanto isso, em Beslan, prosseguiam pelo terceiro dia os sepultamentos no pequeno cemitério local. Rada Solkazanova, 4, e sua mãe, Larissa, foram sepultadas na mesma cova. Não longe dali, era enterrado Vasily Reshetnyak, 8. Em seu caixão, familiares colocaram seu brinquedo preferido, um carrinho vermelho.

CNBB e ajuda humanitária
Os EUA enviaram ontem à Ossétia do Norte dois aviões C-130, baseados na Alemanha, com ajuda médica à região.
Em Brasília, a CNBB encaminhou nota à embaixada russa, na qual exprime sua "profunda desaprovação pelo massacre de centenas de vidas humanas inocentes".


Com agências internacionais


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