|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PASSADO REVISTO
Pappon foi preso ontem
França julga
colaborador
dos nazistas
MARIANE COMPARATO
de Paris
Maurice Papon, 87, ex-funcionário de Vichy, governo francês que
colaborou com a Alemanha nazista durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45), começa a ser julgado hoje em Bordeaux, no departamento da Gironde (leste da França). O julgamento está previsto para durar dois meses e meio.
Papon vai ser julgado por "crimes contra a humanidade". Secretário-geral da Prefeitura de Gironde de março de 1941 a agosto de
1944, está sendo acusado de ter ordenado a prisão de 1.560 judeus
pela polícia, que depois seriam
quase todos executados no campo
de extermínio de Auschwitz.
"Não me sinto de forma alguma
culpado nem responsável pelas
horríveis desgraças que foram cometidas. Esforcei-me para atenuá-las e até para salvar gente",
disse Papon, ontem, antes de ser
levado para a prisão. Ele aguardou
o julgamento em liberdade, mas a
lei francesa requer que réus enfrentando acusações graves fiquem detidos durante seu julgamento.
Papon foi encarcerado no final
da tarde na prisão de Gradignan,
perto de Bordeaux. Foi levado a
uma célula individual, isolado dos
outros presos, que gritaram insultos contra ele.
Papon protestou contra o processo: "Fui promovido na época
da libertação (da França) pelo general De Gaulle e, anos depois, me
transformo em colaborador."
O diretor-executivo do Crij
(Conselho Representativo das Instituições Judaicas), Haim Musicant, espera que o julgamento sirva para mostrar às novas gerações
os erros do passado.
"A Justiça foi feita. Desde o final
da guerra, nenhum alto funcionário de Vichy foi julgado. Está sendo muito importante para a comunidade judaica colocar em evidência esse passado negro da história
da França", disse ele à Folha.
Durante a guerra, Papon se valeu
da demissão sumária dos judeus
que ocupavam cargos no governo
para ser promovido rapidamente a
cargos importantes. Assim, chegou a secretário-geral em Gironde.
No final da guerra, foi nomeado
comissário do gabinete de Gaston
Cusin, comissário da República
nomeado pelo governo provisório
do general Charles de Gaulle. Foi
chefe da polícia de Paris de 1958 a
1967 e ministro das Finanças no
governo de Raymond Barre. Recebeu a condecoração de "légion
d'Honneur" (honra ao mérito) e
foi proclamado "resistente" contra os alemães durante a Segunda
Guerra Mundial.
Foi preciso que Michel Slitinsky,
cujo pai foi deportado para os
campos de extermínio nazistas por
ser judeu, denunciasse Papon, em
1981, para que a reputação do
ex-funcionário de Vichy fosse abalada. Mesmo assim, a instrução do
processo durou 16 anos.
Segundo pesquisa encomendada
pelo jornal "Le Parisien", 75% dos
franceses estimam que o julgamento permitirá sensibilizar as
novas gerações sobre os perigos do
racismo e do anti-semitismo.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|