|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
A OFENSIVA
Ataques foram planejados para conseguir também um grande impacto psicológico
Ação visa "amaciar" terreno afegão
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
As primeiras ondas de ataques
anglo-americanos a alvos no Afeganistão ontem tiveram vários
objetivos: castigar a milícia Taleban que governa o país e a organização terrorista liderada por Osama bin Laden, atingindo os alvos
militares possíveis em um país
onde eles são poucos. E também
"amaciar" o terreno para uma
ofensiva da rival Aliança do Norte
em direção à capital, Cabul, e para
eventuais operações de forças terrestres destinadas a caçar o homem mais procurado do mundo.
Como existem poucos alvos
"apetitosos" no Afeganistão para
mísseis que custam US$ 1 milhão
cada -e foram lançados ontem
só na primeira leva 50 mísseis Tomahawk-, as operações foram
planejadas para obter também
um grande impacto psicológico
não só no inimigo, como no resto
do mundo.
Além de bombas e mísseis, os
americanos disseram que também estavam jogando comida no
Afeganistão, e que os ataques visavam preparar o terreno para
chegada de ajuda humanitária. A
guerra não seria contra a população afegã, mas sim contra a milícia Taleban, que governa a maior
parte do país.
"Amaciar"
"Amaciar", no jargão dos militares americanos, significa destruir a capacidade de reação do
inimigo. Por isso os primeiros alvos foram -e são sempre- baterias antiaéreas, radares e pistas
de pouso de onde poderiam decolar caças inimigos.
Dois aviões não tripulados tinham sido avistados sobre Cabul
no dia anterior. Estavam cumprindo uma função fundamental:
reconhecer os alvos, especialmente as defesas antiaéreas.
Forçando o Taleban a disparar
contra eles, aviões não tripulados
como o Predator ("Predador")
americano captam com suas câmeras os disparos e transmitem a
informação em tempo real para a
equipe que planeja os ataques.
Os primeiros ataques têm a vantagem inestimável da surpresa,
por isso também foram atacados
centros de comando e bases de
treinamento dos terroristas.
Os ataques, realizados de noite
-começando às 21h27, hora local-, ajudam teoricamente a evitar ou minimizar danos à população civil, que está em casa devido
ao toque de recolher. E a capacidade de reação das forças tecnologicamente pouco sofisticadas do
Taleban é menor de noite.
Só com muita sorte ou com informação muito precisa seria possível acertar o próprio Bin Laden.
Por isso o secretário da Defesa
americano, Donald Rumsfeld, fez
questão de afirmar em uma coletiva televisionada que as operações militares iniciadas ontem
não eram apenas contra um indivíduo, mas contra toda uma rede
de organizações terroristas.
Arsenal utilizado
Os EUA não entraram em detalhe sobre quais foram as forças
empregadas. O general Richard
Myers, chefe do Estado Maior
Conjunto -que comanda todas
as Forças Armadas dos EUA-,
revelou na mesma entrevista com
Rumsfeld que foram usados 15
bombardeiros dos modelos B-1,
B-2 e B-52, 25 caça-bombardeiros
-provavelmente lançados dos
porta-aviões Carl Vinson e Enterprise no oceano Índico- e um
total de 50 mísseis de cruzeiro,
boa parte deles Tomahawks lançados de cruzadores, destróieres e
submarinos.
Submarinos da Marinha Real
britânica também participaram
lançando mísseis de cruzeiro Tomahwak, e os B-52 e B-1 foram
lançados da base britânica de Diego Garcia, no Índico. Já os B-2
-cada um custando perto de
US$ 500 milhões- voaram cerca
de 24 horas desde a base aérea
Whiteman, no Estado de Missouri, centro-sul dos EUA.
Rumsfeld fez suas declarações
antes de novas ondas de ataque
terem sido anunciadas pelas milícias do Taleban.
Os mísseis de cruzeiro têm a
grande vantagem de poderem ser
lançados de aviões, navios e submarinos e atingirem alvos a mais
de 2.000 km de distância com precisão de dezenas de metros.
São guiados tanto por dados de
satélites como por informações
do terreno a seguir registradas no
computador de bordo.
Como esses mísseis são verdadeiros aviões não tripulados que
viajam a altitudes baixas, de centenas de metros, com velocidades
semelhantes a aviões comerciais
-em torno de 800 ou 900 km/
h-, podem ser teoricamente
abatidos por canhões ou mesmo
metralhadoras pesadas.
Armas desse tipo não faltam no
Afeganistão, ou mesmo mísseis
antiaéreos portáteis como os Stinger, que os próprios americanos
forneceram aos afegãos quando
eles combatiam os invasores soviéticos nos anos 80.
O Stinger é um míssil do tipo
"fire and forget" ("dispare e esqueça"), guiado ao alvo por um
detector de calor (radiação infravermelha), e tem alcance de 5.000
metros. Ataques aéreos americanos também podem destruir as
armas pesadas do Taleban -tanques e canhões- para ajudar a
Aliança do Norte.
Imagens noturnas
As imagens noturnas de televisão que mostram rastros luminosos no céu são resultado dos disparos de metralhadoras pesadas
(calibres 12,7 mm e 14,5 mm) e de
canhões antiaéreos de tiro rápido,
em geral o também ex-russo ZU-23, de calibre 23 mm, que com seu
alcance de até 5.000 metros constitui um dos maiores riscos a helicópteros atacantes.
O efeito luminoso é resultado
do uso de, a cada cinco balas, um
projétil, chamado "traçante", que
explode como se fosse um fogo de
artifício. A luz é necessária para
facilitar a pontaria.
Esse é justamente o maior problema com a defesa antiaérea do
Taleban: a quantidade pequena
de armas cujo tiro é guiado por
radar. Ou seja, a maior parte só é
de fato eficaz de dia.
De qualquer modo, um primeiro ataque tende a usar menos
aviões tripulados, para evitar risco de perdas humanas logo no
início, que afetariam o moral
americano.
Depois de eliminadas as armas
antiaéreas potencialmente mais
perigosas -como mísseis de fabricação soviética, também possivelmente presentes no arsenal do
Taleban-, os anglo-americanos
podem devotar aviões e helicópteros para missões variadas, desde ataques apoiando diretamente
as tropas da Aliança do Norte, até
na caça a Bin Laden.
O Taleban informou que está
enviando tropas pra as fronteiras
ao norte, com o Uzbequistão e
Tadjiquistão, de onde poderiam
vir novos ataques.
Do ponto de vista norte-americano, isso é altamente positivo:
são novos alvos em potencial sendo criados, e politicamente perfeito, pois os EUA estariam ajudando os países vizinhos a se defenderem do Taleban.
Texto Anterior: Aliança do Norte festeja ofensiva e inicia ataque após bombardeios Próximo Texto: Ataques aéreos não intimidam Taleban, diz analista Índice
|