São Paulo, sexta-feira, 08 de novembro de 2002

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Suposto encontro deve ser visto com cautela

IGOR GIELOW
COORDENADOR DA AGÊNCIA FOLHA

A divulgação da suposta reunião de terroristas na Tríplice Fronteira precisa ser vista com cautela. Se, por um lado, a região suscita suspeitas por sua porosidade e pela ação do crime organizado, por outro há interesses que podem estar ocultos na tentativa de eleger a faixa de fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai como um "novo Afeganistão".
Virar um país aliado dos EUA na "guerra ao terror" é um bom negócio. O Paquistão, por exemplo, era um país com uma dívida externa asfixiante de US$ 70 bilhões e enfrentava sanções.
Ao virar parceiro, tudo mudou. As sanções foram levantadas e a ajuda soma mais de US$ 6 bilhões. A dívida está sendo renegociada, e o regime militar do país foi legitimado frente ao mundo.
A Argentina, mergulhada em crise, poderia ter acesso a uma fatia dos US$ 3,6 bilhões destinados pelos EUA à ajuda militar externa, por exemplo.
Os EUA, por sua vez, poderiam reforçar sua presença militar no continente -que só fez crescer recentemente, com o Plano Colômbia e o treinamento de soldados paraguaios. Uma associação militar com países mais fracos dá uma nova luz estratégica às discussões sobre a Área de Livre Comércio das Américas.
Há também problemas na acusação. O ponto mais frágil é a associação feita entre o Hizbollah e a rede Al Qaeda.
Primeiro, até agora não existe nenhuma prova da existência de grupos ligados à Al Qaeda na região. O Brasil, por exemplo, nega.
Segundo, o Hizbollah não tem ligação conhecida com a rede. Uma associação pelo fato de ambos combaterem Israel e, por extensão, os EUA, é factível em teoria. Mas o Hizbollah é financiado pelo Irã, país adversário de Osama bin Laden e que até agora só perdeu com as ações da rede do saudita. Desde o 11 de setembro, Teerã viu seu plano de aproximar-se do Ocidente e virar potência regional ruir. Virou parte do "eixo do mal" de George W. Bush.
Por outro lado, a Tríplice Fronteira, centrada entre Ciudad del Este e Foz, vem merecendo a atenção desde a década de 90, quando ocorreram atentados contra entidades judaicas argentinas supostamente tramados lá.
Além das fronteiras pouco vigiadas, a região abriga uma grande comunidade libanesa -logo a associação com o Hizbollah. Nos anos 90, o grupo enviava regularmente líderes para a região, para "tirá-los de circulação".
Como contra-argumento, os líderes da comunidade vêem preconceito, lembrando que o Hizbollah é também um partido com rede assistencialista no Líbano, que recebe ajuda de parentes no estrangeiro -daí a ligação.



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