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Leipzig reivindica seu papel em fim da RDA
DA ENVIADA A LEIPZIG
Um certo dissabor recairá sobre os moradores de Leipzig
amanhã, quando a Alemanha
celebrar a 190 km da cidade a
queda do Muro de Berlim como
o fim da divisão no país. Leipzig, mais ao sul e a oeste, festejou a derrocada do comunismo
exatamente um mês antes.
"Quando o muro caiu, para
mim já estava claro. Eu já estava trabalhando antes para estabelecer instituições democráticas aqui", diz Tobias Holitzer,
43, hoje à frente do Museu da
Stasi (polícia secreta da Alemanha Oriental) na cidade.
Nove de outubro de 1989 é o
dia em que 70 mil pessoas foram às ruas desta cidade de
1.400 anos exigir abertura na
Alemanha Oriental aos gritos
de "Nós somos o povo". Na véspera, 40 mil tinham feito o
mesmo em Dresden, ao sul.
"Muita gente pensa que a data mais importante é a queda
do muro", diz Frank Richter,
um dos líderes do protesto em
Dresden. "Claro que importa,
mas antes foi essencial que o
povo tenha ido às ruas fazer a
revolução, exigir liberdade."
Richter, então com 29 anos,
era padre -hoje ele está convertido em diretor de um centro de estudos políticos (e, há
três anos, em marido). O descontentamento crescia, e as
igrejas -católica e protestante- davam espaço e voz aos
manifestantes. Em Leipzig, até
hoje a Nikolaikirche mantém
orgulhosa a placa em que se
anuncia "aberta para todos".
Em tempos de Stasi, era uma
ousadia do pastor Christian
Führer.
Resguardado pelo respeito
que a batina impõe, Richter se
viu entre a multidão e a polícia
quando populares revoltados
depredaram a estação de trem.
Detenções
O governo em Berlim havia
permitido, sob pressão, que
seus cidadãos que fugiram para
Praga e se refugiaram na Embaixada da Alemanha Ocidental passassem de volta por seu
território para chegar à outra
metade do país. Mas os trens tinham que parar em Dresden
antes de seguir. "As pessoas foram à estação achando que
eram os últimos trens para o
oeste, e queriam entrar, imagine", lembra. "O trem estava fechado. O povo ficou frustrado e
destruiu a estação."
O resultado foi mais de mil
detidos. O então padre assumiu
a posição de negociador e conseguiu uma audiência com o
prefeito, no dia seguinte, para o
chamado "Grupo dos 20", cidadãos encarregados pelos demais de levar ao governo as demandas por mais liberdade.
Em Leipzig, os protestos se
tornavam semanais. "Antes da
manifestação do dia 9, havia
uma tensão de que o governo
fosse fazer o mesmo que o governo chinês fez na praça da
Paz Celestial em junho do mesmo ano", diz Holitzer. Segundo
historiadores, o chefe do Partido da Unidade Socialista Alemã, Erich Honecker, cogitou
realmente imitar os chineses.
Para explicar o momento dos
protestos, que ficaram conhecidos como "Revolução Pacífica", Richter e Holitzer citam
uma lista de frustrações da população, sobretudo dos mais jovens ("menos temerosos da
Stasi do que seus pais, que haviam vivido sob a soberania soviética", diz Holitzer). Em ambos os casos ela é encabeçada
pela impossibilidade de viajar e
imediatamente seguida pelas
restrições econômicas.
"A RDA era uma grande prisão. Não podíamos ir nem à Polônia. Não podíamos ir à Alemanha Ocidental. Aqui em
Dresden não podíamos nem assistir à TV da Alemanha Ocidental. E, claro, a economia era
um desastre", diz Richter, que
ainda vê inspiração teológica
no movimento. "A RDA durou
40 anos. Na Bíblia, 40 anos é
hora de um novo tempo."
(LC)
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