São Paulo, domingo, 08 de novembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Leipzig reivindica seu papel em fim da RDA

DA ENVIADA A LEIPZIG

Um certo dissabor recairá sobre os moradores de Leipzig amanhã, quando a Alemanha celebrar a 190 km da cidade a queda do Muro de Berlim como o fim da divisão no país. Leipzig, mais ao sul e a oeste, festejou a derrocada do comunismo exatamente um mês antes.
"Quando o muro caiu, para mim já estava claro. Eu já estava trabalhando antes para estabelecer instituições democráticas aqui", diz Tobias Holitzer, 43, hoje à frente do Museu da Stasi (polícia secreta da Alemanha Oriental) na cidade.
Nove de outubro de 1989 é o dia em que 70 mil pessoas foram às ruas desta cidade de 1.400 anos exigir abertura na Alemanha Oriental aos gritos de "Nós somos o povo". Na véspera, 40 mil tinham feito o mesmo em Dresden, ao sul.
"Muita gente pensa que a data mais importante é a queda do muro", diz Frank Richter, um dos líderes do protesto em Dresden. "Claro que importa, mas antes foi essencial que o povo tenha ido às ruas fazer a revolução, exigir liberdade."
Richter, então com 29 anos, era padre -hoje ele está convertido em diretor de um centro de estudos políticos (e, há três anos, em marido). O descontentamento crescia, e as igrejas -católica e protestante- davam espaço e voz aos manifestantes. Em Leipzig, até hoje a Nikolaikirche mantém orgulhosa a placa em que se anuncia "aberta para todos". Em tempos de Stasi, era uma ousadia do pastor Christian Führer.
Resguardado pelo respeito que a batina impõe, Richter se viu entre a multidão e a polícia quando populares revoltados depredaram a estação de trem.

Detenções
O governo em Berlim havia permitido, sob pressão, que seus cidadãos que fugiram para Praga e se refugiaram na Embaixada da Alemanha Ocidental passassem de volta por seu território para chegar à outra metade do país. Mas os trens tinham que parar em Dresden antes de seguir. "As pessoas foram à estação achando que eram os últimos trens para o oeste, e queriam entrar, imagine", lembra. "O trem estava fechado. O povo ficou frustrado e destruiu a estação."
O resultado foi mais de mil detidos. O então padre assumiu a posição de negociador e conseguiu uma audiência com o prefeito, no dia seguinte, para o chamado "Grupo dos 20", cidadãos encarregados pelos demais de levar ao governo as demandas por mais liberdade.
Em Leipzig, os protestos se tornavam semanais. "Antes da manifestação do dia 9, havia uma tensão de que o governo fosse fazer o mesmo que o governo chinês fez na praça da Paz Celestial em junho do mesmo ano", diz Holitzer. Segundo historiadores, o chefe do Partido da Unidade Socialista Alemã, Erich Honecker, cogitou realmente imitar os chineses.
Para explicar o momento dos protestos, que ficaram conhecidos como "Revolução Pacífica", Richter e Holitzer citam uma lista de frustrações da população, sobretudo dos mais jovens ("menos temerosos da Stasi do que seus pais, que haviam vivido sob a soberania soviética", diz Holitzer). Em ambos os casos ela é encabeçada pela impossibilidade de viajar e imediatamente seguida pelas restrições econômicas.
"A RDA era uma grande prisão. Não podíamos ir nem à Polônia. Não podíamos ir à Alemanha Ocidental. Aqui em Dresden não podíamos nem assistir à TV da Alemanha Ocidental. E, claro, a economia era um desastre", diz Richter, que ainda vê inspiração teológica no movimento. "A RDA durou 40 anos. Na Bíblia, 40 anos é hora de um novo tempo." (LC)


Texto Anterior: Nostalgia do Leste vira indústria em Berlim
Próximo Texto: Foco: Prédio da Stasi ainda guarda segredos da polícia secreta do regime comunista alemão
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.