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São Paulo, quarta-feira, 09 de abril de 2003

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"DANO COLATERAL"

Hotel onde está a imprensa estrangeira é atacado; "jornalistas não são alvo", dizem EUA

Coalizão mata 3 jornalistas em Bagdá

Ramzi Haidar/France Presse
Jornalistas carregam colega ferido após bombardeio ao hotel Palestine, em Bagdá


SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL AO
ACAMPAMENTO AL SAYLIYA (QATAR)

Forças invasoras da coalizão anglo-americana mataram ontem em Bagdá três jornalistas estrangeiros. Com isso, o total de profissionais da imprensa mortos nos 19 dias do conflito é de 12, três vezes superior ao das seis semanas da Guerra do Golfo, em 1991.
Nos ataques, foram atingidos o hotel Palestine, que reúne a imprensa estrangeira, e a sede da TV Al Jazeera. "A coalizão não tem jornalistas como alvos", disse ontem o general-de-brigada americano Vincent Brooks em encontro com a imprensa no Qatar, do qual a Folha participou.
Logo pela manhã, um tanque americano acertou uma varanda do 15º andar, o penúltimo do hotel Palestine. O petardo matou o cinegrafista ucraniano Taras Protsyuk, 35, da agência Reuters, e feriu o cinegrafista espanhol José Couso, 37, da TV Telecinco, que morreria depois, no hospital. Três outros ficaram feridos.
Segundo os primeiros relatos do general Brooks à imprensa, o Exército americano estaria respondendo ao fogo de franco-atiradores localizados no lobby do hotel. Depois, a informação foi retificada: o ataque iraquiano teria vindo do topo do edifício, em forma de granada impulsionada por foguete e diversos tiros.
Imagens da emissora France 3, no entanto, desmentem os argumentos de Brooks. As cenas capturadas pelo cinegrafista francês mostram que o local estava em silêncio momentos antes de o tanque atirar e que os operadores deste levariam ainda cerca de três minutos para ajustar seu canhão e fazer mira na parte alta do hotel.
O Pentágono sabe que o Palestine é a sede dos cerca de 150 jornalistas na capital desde o começo da guerra, mas o edifício teria virado alvo militar há 48 horas, segundo decisão do comando das forças da coalizão em Bagdá que teria sido comunicada aos jornalistas, que negam porém ter recebido qualquer aviso prévio.

"Vingança"
Antes, dois mísseis também da coalizão haviam atingido a sede da Al Jazeera, em Bagdá, matando o repórter jordaniano Tareq Ayyoub, idade não divulgada, que fazia uma transmissão ao vivo no telhado no momento do ataque.
O jornalista ainda foi levado por colegas em direção ao hospital, mas não resistiu. Para o chefe de Redação da emissora árabe, tratou-se de "um crime de guerra cometido deliberadamente". Segundo Hussein Abdel Ghani, os americanos teriam se vingado da cobertura jornalística independente da rede sediada no Qatar.
Não é o que pensa Brooks. "As forças de Saddam estão usando lugares civis para instalar equipamentos militares de defesa", disse. "Além disso, não sabemos quais são e onde operam os jornalistas que não estão "embutidos" conosco e já os avisamos para deixar Bagdá, que virou um campo de batalha muito perigoso."
"A situação da Al Jazeera parece suspeita", disse Rageh Omaar, da TV britânica BBC, também hóspede do hotel. "Sua redação havia dado referências de satélite quanto à localização de seu prédio em Bagdá e, pelo que vimos no momento do ataque, os mísseis estavam direcionados para o prédio mesmo, não pareceu engano."
No mesmo dia, disparos foram feitos na direção de jornalistas da TV Abu Dhabi enquanto filmavam o movimento de dois tanques americanos numa ponte sobre o rio Tigre. Duas câmeras foram atingidas, mas ninguém se machucou. Segundo o diretor da TV, o escritório havia recebido uma ligação de um colega na vizinha Al Jazeera que prevenia que algo iria acontecer. "Eles estão mirando nossos prédios", teria dito o jornalista a Nart Bouran.

Protestos
Um protesto em frente à Embaixada dos EUA em Madri foi marcado para hoje. Ontem à tarde, no hotel Palestine, dezenas de jornalistas carregaram velas acesas em homenagem aos colegas mortos. Muitos decidiam com suas organizações o melhor momento e a melhor maneira de deixar o país, o que deve acontecer hoje em pelo menos dez casos.
A maioria não deixou o hotel ontem, segundo relato de Andrew Gilloigan, da BBC. "Parece perverso permanecer num edifício que foi atacado, mas a teoria aqui é a de que o raio não cairá duas vezes no mesmo lugar", disse ele.


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