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UMA VISÃO IUGOSLAVA
País sempre
resistiu a
opressores
DRAGAN S. VUJNOVIC
especial para a Folha
O significado do Estado não está
só em seus atributos próprios: o
território, a população e o governo. Dentro do conceito de Estado
encontra-se também a identificação da população com o seu passado e presente, com os valores milenares ou espirituais.
É tudo isso que conecta os indivíduos, grupos e a nação inteira com
um determinado território (independentemente da autoridade,
que muda). E justamente Kosovo
possui tudo isso para os sérvios.
Habitando lá desde o século 7º,
foi nessa região que em 1170 foi
formado o primeiro Estado sérvio
(Stefan Nemanja fundou a dinastia
dos Nemanjic, que teve dez reis).
Foi lá que a igreja sérvia obteve a
sua autonomia em 1219 e seu primeiro arcebispo.
Foi lá que se travou a Batalha de
Kosovo, em 28 de junho de 1389,
entre os sérvios e os turcos, o que
parou por muito tempo a penetração turca no ocidente europeu.
Foram lá compostas, e passadas
oralmente, algumas das mais lindas e mais conhecidas canções épicas sérvias pelas quais o escritor e
pensador alemão Goethe estudou
a língua sérvia no início do século
19. Essas canções e a igreja mantiveram e consolidaram a nacionalidade nos sérvios durante os 450
anos de dominação otomana.
Os que recomendaram e os que
executaram a idéia genocida de
que um país seja bombardeado de
longe, com perdas mínimas, até
que este seja obrigado a assinar um
acordo (de Rambouillet) com o
qual não concorda (que inclui a separação de Kosovo da Iugoslávia)
praticam um ato bárbaro.
Os sérvios sempre lutaram contra os opressores, principalmente
nos últimos 200 anos. Durante a
Primeira (1804-1813) e a Segunda
Revolta Sérvia (1815), os sérvios lutaram contra os turcos e obtiveram
ampla autonomia.
Durante a Primeira Guerra Mundial (1914-18), morreram nos campos de batalha (contra austríacos,
alemães e búlgaros) e de fome e
doença 26% do total da população
da Sérvia (nenhum país tinha tantos mortos, nem tão grande sofrimento).
Na Segunda Guerra Mundial os
sérvios perderam mais de 1 milhão
de vidas, e contribuíram de forma
considerável à vitória dos aliados.
Por isso, a brutal agressão da
Otan à Iugoslávia não tem sentido
algum, não tem justificativa perante o direito internacional ou os costumes dos povos civilizados.
A devastação por bombas da
Otan sobre escolas, prédios, casas
particulares, fábrica, torres de TV,
pontes, aeroportos, trens e até prédios da Cruz Vermelha é testemunho das ações genocidas cometidas e merecem todo o repúdio e a
condenação de outros Estados.
A aviação de Hitler bombardeou
Belgrado e algumas outras cidades
de Sérvia e Montenegro no dia 6 de
abril de 1941, que foi um domingo
de Páscoa, assim como os chamados aliados (EUA e Reino Unido),
que bombardearam Belgrado em
abril de 1944 (também era Páscoa)
sob o pretexto de atacar nazistas.
Lamentavelmente, o mesmo
ocorreu em abril de 1999, quando a
Otan bombardeou severamente cidades na Iugoslávia, executando
uma prática genocida. Nosso mundo não precisa da "Paz Americana", mas sim de pluralidade (cultural, econômica, política) que faz
do nosso único mundo um lugar
rico e digno de viver para todos.
Para julgar corretamente os
acontecimentos na Iugoslávia, deve-se saber que muitos albaneses
não sabem a língua sérvia, mas o
Estado os considera cidadãos. Para
obter cidadania dos EUA, é preciso
dominar a língua inglesa.
O povo albanês possui seu próprio Estado, soberano e independente, desde 1913. Nos países vizinhos (Macedônia e Grécia), o povo
albanês vive como minoria étnica.
Durante as últimas décadas, políticos albaneses foram eleitos para
os seguintes postos: presidente da
Iugoslávia (Sinan Hasani), presidente da Assembléia da Iugoslávia
(Sinan Hasani), presidente da
Aliança Socialista (Kolj Siroka), foram deputados e embaixadores da
Iugoslávia no exterior.
Tudo isso são elementos que os
19 países da Otan não querem respeitar, por causa dos problemas
que enfrentam, como a Irlanda do
Norte (Reino Unido), bascos (Espanha), curdos (Turquia) e povos
latino-americanos (EUA).
Não há muitos territórios no
mundo que significam tudo para
um povo, como Kosovo significa
para a Iugoslávia, em todos os aspectos: político, histórico, cultural,
econômico e espiritual.
A agressão da Otan não resolveu
nenhum problema em Kosovo, só
causou muito sofrimento humano
e destruição material aos povos da
Iugoslávia. A única solução é utilizar um método civilizado, com diplomacia.
²
Dragan S. Vujnovic é encarregado de negócios
da Embaixada da República Federal da Iugoslávia em Brasília.
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