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Eleição mexicana afastou emergentes e miseráveis
Classe média duplicou desde 1994, mas 45% dos mexicanos ainda são pobres
Com favelas de um lado e prédios ultramodernos de outro, bairro de Santa Fé evidencia a divisão do país e os desafios do novo governo
DO ENVIADO ESPECIAL À CIDADE DO MÉXICO
O bairro de Santa Fé, no extremo oeste da Cidade do México, talvez funcione como um
bom resumo físico da divisão
do país, que ficou acentuada
com a eleição do conservador
Felipe Calderón e a derrota do
esquerdista Andrés Manuel
López Obrador.
Santa Fé concentra o maior
conjunto de prédios inteligentes, de arquitetura de vanguarda e de luxo, muito luxo, de toda
a América Latina. A região da
Berrini, em São Paulo, com
suas torres pós-modernas e
"neoclássicas" canhestras, é
simplezinha perto de Santa Fé.
Instalada nas colinas onde
antes havia um lixão cercado de
favelas, é a região para onde as
grandes empresas se trasladaram depois do terremoto de
1985, que atingiu o Centro Histórico da capital. HP, Ericsson,
IBM e as locais Banamex e Televisa têm suas sedes ali. Quase
não há pessoas nas ruas. Mas o
Centro Comercial Santa Fé, o
maior shopping do país, recebe
8 milhões de visitantes ao ano.
As favelas, porém, continuam. São 50 mil favelados,
muitos deles morando ali há
mais de 30 anos, quando só havia o lixão cercando os 20 mil
habitantes da "nova" Santa Fé,
que vivem em torres moderníssimas, com até 40 andares. Há
condomínios fechados com
seus próprios campos de golfe.
Um túnel foi criado para dar
acesso a um deles, cortando
uma das colinas do bairro.
Neoliberalismo urbano
"Da segurança à limpeza urbana, do paisagismo ao calçamento, tudo na nova Santa Fé
foi privatizado e cercado por
muros", conta o arquiteto Enrique Martin-Moreno e professor da Universidade Iberoamericana, instalada em Santa Fé.
"O neoliberalismo urbano convive com o tsunami das favelas,
pré-modernas, que lutam por
serviços básicos mínimos."
Esses dois Méxicos terão de
ser governados por Calderón. O
país que possui a maior frota de
aviões particulares, o maior
consumo de Coca-Cola e o
maior faturamento da rede de
supermercados Wal-Mart no
mundo depois dos EUA.
"Nunca tivemos uma classe
média tão numerosa na história do México. Duplicou de tamanho de 1994 até hoje", disse
à Folha Miguel Széleky, professor da Universidade Autônoma do México e ex-vice-ministro de Desenvolvimento Social. Ele foi um dos responsáveis pelo programa Oportunidades, o Bolsa-Família pioneiro na América Latina, que existe há mais de dez anos no país e
atende 5 milhões de famílias.
Apesar da transformação do
país, 50% da mão-de-obra trabalha na economia informal,
sem direitos ou benefícios. São
pobres 45% da população, e
17% vivem na pobreza extrema, com menos de R$ 250 ao
mês. Há 25 mil táxis clandestinos na Cidade do México e milhares de ambulantes, tolerados pelo ex-prefeito López
Obrador -não à toa o herói dos
mais pobres mexicanos.
A Revolução Mexicana, que
contrapôs camponeses a latifundiários e deixou 1,5 milhão
de mortos entre 1910 e 1927,
desembocou no governo do
Partido Revolucionário Institucional (PRI). Em 70 anos de
governos do PRI, com reforma
agrária, mas muita corrupção e
assistencialismo, o México não
conseguiu resolver a pobreza
que atinge metade do país e
que exporta mão-de-obra barata para os Estados Unidos.
Nem a miséria em que vivem
seus 10 milhões de indígenas. O
subcomandante Marcos virou
personagem folclórico, mas o
descaso em que vivem os índios
mexicanos continua, mais ou
menos ignorados pelo México
cintilante que cresceu e se estabilizou com o Nafta.
(RAUL JUSTE LORES)
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