São Paulo, quarta-feira, 09 de agosto de 2006

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Entrevista

Força libanesa deve conviver com Hizbollah

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A BEIRUTE

A aprovação pelo Hizbollah do envio de 15 mil soldados do Exército libanês à fronteira com Israel não significa que o grupo xiita concorda em se desarmar, mas é um primeiro e importante passo para a suspensão dos combates. A avaliação é de Timur Goksel, ex-porta-voz e conselheiro da Força Interina da ONU no Líbano e professor da Universidade Americana de Beirute. Criada em 1978 para "confirmar a retirada de Israel" e "ajudar o governo do Líbano a restaurar sua autoridade" na região, a Unifil (na sigla em inglês), que conta pouco menos de 2.000 soldados, terá mais uma chance de cumprir sua missão. A Unifil é o único contingente estrangeiro que o Hizbollah aceitará para baixar as armas no sul, diz ele. Leia trechos da entrevista concedida à Folha em Beirute.

 

FOLHA - Qual a importância da decisão do gabinete libanês de enviar tropas à fronteira, caso Israel deixe a região?
TIMUR GOKSEL -
É uma decisão importante e um bom primeiro passo para resolver o problema. Todos estão falando que o Exército libanês não tem armas. Mas ele não estará indo para uma guerra e sim para controlar parte de seu país. É um Exército respeitado pelo povo libanês, por isso acho que é um passo importante e inteligente.

FOLHA - O sr. acha que, reforçada pelo Exército libanês, a Unifil manteria a paz na fronteira?
GOKSEL -
A Unifil é a única força estrangeira que o Hizbollah aceitaria. O povo do sul do Líbano conhece e gosta das tropas. Como não há outra força que seria aceita, ela é a melhor, talvez a única opção para pôr fim à guerra. Não é uma relação perfeita, mas é melhor que qualquer força que chegar aqui.

FOLHA - Mas o Exército libanês será capaz de impedir ataques do Hizbollah contra Israel?
GOKSEL -
Sua missão não é essa e ele não poderia lutar contra o Hizbollah. Sua missão é manter a região segura e pacífica, e isso os soldados têm capacidade de fazer por meio do diálogo com o Hizbollah, com quem o Exército libanês tem ótimas relações.

FOLHA - Ao concordar em ser substituído pelo Exército, o Hizbollah aceitaria se desarmar?
GOKSEL -
Não, esse não é o ponto. O governo libanês tem dito que não pode simplesmente desarmar o Hizbollah, esse é um longo processo interno, que não pode ser feito do dia para a noite. Não há ninguém que tire as armas do Hizbollah à força. Se o Exército libanês tentasse fazer isso seria o começo de uma nova guerra civil.

FOLHA - Há uma mudança política importante no sinal verde dado pelo Hizbollah ao Exército?
GOKSEL -
Sem dúvida. Se o Hizbollah aceita o envio de tropas libanesas, quer dizer que respeita o Exército e que vai manter sua palavra. As pessoas fora do Líbano não entendem. Se aceitou a presença do Exército na fronteira, é porque o Hizbollah não pretende causar problemas. Há um respeito mútuo.

FOLHA - A chegada do Exército libanês levará à retirada militar do Hizbollah do sul do país, como Israel exige?
GOKSEL -
Essa é uma noção errada. O Hizbollah não é um Exército para se retirar. O Hizbollah trabalha com a população, portanto não pode se retirar. Eles vivem nessas aldeias [do sul]. O Hizbollah não tem um batalhão, uma brigada, não é um Exército regular. [Os combatentes] vão se retirar e voltar para suas aldeias, é lá que eles vivem. A importância da decisão é que, se o Hizbollah aceita o envio de soldados, isso significa uma indicação de que poderia parar de lutar.


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