São Paulo, quarta-feira, 09 de agosto de 2006

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Guerra reforçou facção pró-Síria no Exército

GUSTAVO CHACRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE NOVA YORK

Uma espécie de acordo não oficial divide os poderes na área militar do Líbano. As Forças Armadas são responsáveis pela segurança doméstica, enquanto o Hizbollah cuida da defesa libanesa em caso de ataques de Israel, como vem acontecendo agora. Dessa forma, o Exército não mobiliza suas forças para o sul do Líbano, conforme exigiram resoluções da ONU após a retirada israelense em 2000.
Com o anúncio do premiê Fouad Siniora de que 15 mil soldados serão enviados para o sul, o cenário se altera, com o Exército assumindo o controle da região, o que fez surgir novamente a questão sobre a capacidade de as Forças Armadas libanesas controlarem o Hizbollah e se há intenção de levar adiante essa missão.
Muitos analistas defendem a tese de que o Exército é inferior militarmente ao Hizbollah. Estudo do centro de estudos militares Jane, nos EUA, diz que as "Forças Armadas são deficientes, com tanques obsoletos", sendo "incapazes de agir contra o bem organizado Hizbollah".
Outros, como o professor Oren Barak, professor da Universidade Hebraica de Jerusalém e um dos principais estudiosos das forças militares do Líbano, discordam. "As Forças Armadas têm os meios para confrontar o Hizbollah. Também conhecem o território, seu contingente é muito maior e a maior parte das armas da organização xiita, como os Katyushas, é inútil num combate contra o Exército doméstico", diz.
O problema das Forças Armadas para controlar o Hizbollah é outro, afirma Barak. "O Exército só poderia agir contra o grupo se houvesse um consenso nacional de que o grupo age contra os interesses do país. Ele poderia ter sido alcançado antes, mas é muito difícil agora, após tantas mortes e destruição." Hoje agir contra o Hizbollah significaria para a população que o Exército "está colaborando com o Estado judeu".
A aliança entre o Exército e o Hizbollah se intensificou após a eleição de Émile Lahoud -um cristão maronita, como exige a Constituição- para presidente, em 1998, e a indicação do também cristão Michel Suleiman para o Comando do Exército, segundo o professor.
Lahoud, que se mantém no poder graças ao apoio dos xiitas, preside o Conselho Supremo de Defesa, com membros das seis principais religiões do Líbano, enquanto Suleiman é subordinado ao Conselho de Ministros, comandado pelo premiê Fouad Siniora. Um órgão não está acima do outro.
Até a guerra, havia uma divisão que punha Lahoud, Suleiman e o Hizbollah, aliados da Síria, de um lado, e Siniora do outro. Segundo Barak, com a crise, a influência da então decadente ala pró-Síria voltou a crescer no Exército, que é dividido de acordo com a composição étnica do país. Para o especialista, essa espécie de aliança militar entre Lahoud, Suleiman e o Hizbollah é muito mais significativa para o poder do grupo no Exército que o crescente número de xiitas nele.
Para o professor, o Exército só funciona caso três fatores atuem conjuntamente: quando seu comando inclui membros de todos os setores da sociedade; quando a composição dos oficiais é balanceada; e quando há consenso em uma missão. Os dois primeiros fatores existem, diz. Será necessário o terceiro para o sucesso no sul, o que incluiria o apoio do Hizbollah -daí a dificuldade.


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