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Analista americano vê ameaça de crise mais grave desde Guerra Fria
SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL
A explosão da violência na
Ossétia do Sul pode incendiar o
Cáucaso e ameaça provocar a
mais grave crise desde o fim da
Guerra Fria (que opôs Washington e Moscou até o colapso
da União Soviética, em 1991). A
avaliação é do americano Charles Kupchan, analista do Council on Foreign Relations, em
Washington.
Em entrevista à Folha por
telefone, Kupchan disse que a
tensão regional foi acirrada pela secessão de Kosovo, em fevereiro, e ilustra a luta de Moscou
para manter sob sua esfera as
ex-repúblicas soviéticas.
FOLHA - Por que a situação se deteriorou tão brutalmente no Cáucaso?
CHARLES KUPCHAN- Ninguém esperava conflitos desta magnitude, mas não estou surpreso
que a situação tenha se deteriorado. Desde os anos 90, a Abkházia e a Ossétia do Sul vinham sendo palcos de conflitos
congelados. O que reacendeu as
tensões foi a secessão de Kosovo, que a Rússia rejeitou e prometeu retaliar. Desde então, o
que parecia um cenário instável mas administrável está cada
vez mais incontrolável, na Ossétia do Sul e na Abkházia.
FOLHA - O que está em jogo?
KUPCHAN- A grande questão é a
herança deixada pelo colapso
da União Soviética. O que está
em jogo é o futuro da influência
russa sobre as ex-repúblicas soviéticas, que tendem a buscar
cada vez mais uma aliança com
os EUA e o Ocidente. Isso se reflete na aspiração da Geórgia a
integrar a Otan [aliança militar
ocidental]. É uma luta entre
Moscou e Washington [pelo
controle do Cáucaso]. Interesses econômicos ligados ao petróleo acirram essas tensões,
mas é antes de mais nada uma
crise nacionalista e geopolítica.
FOLHA - O senhor acredita no risco
de uma guerra total?
KUPCHAN- Eu ficaria surpreso
se houvesse uma guerra ampla.
Isso dito, é assustador ver como
um conflito que era esporádico
degenerou rapidamente num
cenário de confronto pleno. A
situação mostrou claramente
que a Rússia, ao usar ataques
aéreos, tanques e artilharia pesada, sinaliza estar preparada
para encarar um conflito mais
intenso e mais longo. Os EUA e
a União Européia farão de tudo
para evitar esse cenário, potencialmente um dos mais perigosos desde o fim da Guerra Fria.
FOLHA - A crise pode se espalhar?
KUPCHAN- Tudo é possível. Os
esforços da diplomacia devem
ter como objetivo urgente a
suspensão das hostilidades,
justamente para evitar que a
violência atinja outras áreas,
Abkházia em primeiro lugar.
Na verdade, o conflito vai além
dos governos georgiano e russo.
Nos dois lados, há elementos
párias e grupos paramilitares
com agenda própria -nacionalista ou criminosa- que podem
buscar incendiar a região para
servir a seus interesses.
FOLHA - Em caso de guerra total, o
senhor acha possível uma intervenção militar dos EUA?
KUPCHAN- Acho muito remota
essa possibilidade, até porque
as Forças Armadas americanas
já têm preocupações de sobra
com Iraque e Afeganistão. Há
soldados dos EUA estacionados
na Geórgia, mas sua função é
treinar soldados georgianos
que participam do contingente
internacional no Iraque. Dito
isso, a crise na Ossétia do Sul
coloca a Casa Branca na parede
e deve provocar uma reflexão
sobre essa relação tão próxima
com Tbilisi.
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