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Afegãos relatam bombardeios americanos contra povoados civis
RICHARD LLOYD PARRY
DO "THE INDEPENDENT", EM JALALABAD
Milhares de afegãos estão abandonando suas casas no leste do
país para fugir dos ataques aéreos
dos EUA a povoados civis, que já
deixaram centenas de mortos.
Por várias noites seguidas,
aviões de combate americanos
que participam da caçada aos
combatentes da Al Qaeda nas
Montanhas Brancas também
bombardearam aldeias vizinhas,
matando e ferindo um número
desconhecido de pessoas e forçando milhares a fugir para a capital regional, Jalalabad.
Refugiados que chegavam a Jalalabad relataram ter testemunhado explosões nas vilas de Nadaf,
Zaly Baba, Ghaly Khiel, Musa
Khiel e Armat Khiel. Todos concordaram em dizer que os povoados estão cada vez mais vazios, à
medida que mais e mais famílias
fogem, carregando o que podem
nas costas.
"As bombas caíram sobre Armat Khiel esta manhã [quarta-feira"", disse o lavrador Nawab, 35,
que acabava de chegar a Jalalabad
num caminhão verde, ao lado de
80 outros membros de sua comunidade.
"Ficava a 500 metros de nossa
aldeia, e todas as casas de lá foram
atingidas. Não sabemos quantas
pessoas morreram, mas eu vi corpos de pessoas e animais no chão.
Por que os americanos lançam
bombas sobre nós, quando seus
inimigos são os árabes que estão
nas montanhas?", perguntou o lavrador.
Alvos "legítimos"
O Pentágono insiste que visa
apenas alvos militares legítimos
ligados à rede Al Qaeda e a resquícios do Taleban.
Mas, em dois dos povoados
bombardeados visitados pelo
"The Independent", a população
local negou que houvesse esse tipo de alvo por lá.
Não havia qualquer sinal de atividade militar nem dos bunkers
de concreto que o Pentágono afirmou ter destruído.
Um porta-voz das Forças Armadas americanas, o major Brad
Lowell, disse na segunda-feira que
a localização dos povoados corresponde exatamente ao local das
estruturas de comando e controle
do Taleban, feitas de concreto.
"Temos certeza de que são alvos
militares", disse ele. "São diferentes de qualquer coisa que se vê em
áreas residenciais afegãs. Se o Taleban e a Al Qaeda estão levando
familiares de civis para essas
áreas, então os estão colocando
em risco."
Galinhas
Indagado sobre baixas civis, o
secretário da Defesa americano,
Donald Rumsfeld, respondeu: "É
praticamente impossível conseguir informações precisas".
Durante o dia inteiro de quarta-feira, caminhões carregados de
camas, mesas, cadeiras, galinhas,
sacos de alimentos, roupas e dezenas de pessoas chegaram a Jalalabad, sacolejando, após uma viagem de três horas, vindos das aldeias nos contrafortes das Montanhas Brancas.
"Vimos incontáveis bombas
caindo sobre as Montanhas Brancas, mas eles também bombardearam nosso distrito", disse um
lavrador chamado Mir Jan, 28,
que deixou sua casa no povoado
de Landi Khiel, acompanhado de
seis familiares adultos e 11 crianças.
"Foi uma bomba tão grande
que quebrou nossas janelas e portas. Os fragmentos de vidro entraram na casa, a casa tremeu, e todos meus filhos gritaram por socorro. Partimos apenas por causa
das bombas."
Entrevistas feitas com refugiados em Jalalabad apontam para
um quadro de esvaziamento demográfico em grande escala. Segundo Jan, havia 2.500 pessoas
em Landi Khiel antes dos últimos
bombardeios americanos. Hoje,
só restam 200.
"Não sei o número exato de pessoas que havia em nosso povoado, mas a maioria das casas foi
abandonada", disse o agricultor
Sher Nabi, 30, do povoado Zara
Kili. "Às vezes elas são ocupadas
por pessoas de outros povoados
que sofreram bombardeios ainda
piores."
Miséria
Se a mesma coisa tiver acontecido em toda a região, então vários
milhares de pessoas já devem ter
deixado suas casas, trocando a vida difícil na lavoura pela quase total miséria em Jalalabad.
"Não tenho dinheiro nenhum
além de 2.000 afeganis [cerca de 3
centavos de dólar" em meu bolso", disse Mir Jan. "Mas esta é a
única esperança de salvar meus filhos."
Rumsfeld acusou combatentes
estrangeiros da Al Qaeda de impedir soldados afegãos de depor
suas armas. Civis estão presos na
cidade, disse ele. "Na realidade,
estão usando a população civil como escudo", disse Rumsfeld.
Tradução de Clara Allain
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