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ÁSIA
De acordo com periódico médico britânico, até 10 milhões de meninas podem ter sido abortadas desde a década de 80
Aborto de fetos femininos foi maciço na Índia, diz estudo
ASHOK SHARMA
DA ASSOCIATED PRESS, EM NOVA DÉLI
Um estudo publicado no mais
respeitado periódico médico britânico, o "Lancet", indica que até
10 milhões de fetos do sexo feminino podem ter sido abortados na
Índia nos últimos 20 anos, após a
realização de exames pré-natais
para a verificação do sexo dos bebês. Segundo o estudo, publicado
ontem, menos meninas nasceram
de casais que ainda não tinham tido um filho homem.
O periódico afirma que os pesquisadores estudaram dados sobre fertilidade feminina de uma
pesquisa nacional indiana, ainda
em andamento, realizada com 6
milhões de pessoas em 1,1 milhão
de famílias.
Analisando informações relativas a aproximadamente 134 mil
nascimentos, os cientistas constataram que, entre os casais cujo
primeiro filho tinha sido menina,
a probabilidade de terem uma segunda menina era menor e que o
déficit no número de meninas entre o segundo filho dos casais era
mais de duas vezes maior entre as
mães instruídas do que entre as
analfabetas.
Baseados em índices naturais de
gênero obtidos de outros países,
eles estimaram que entre 13,6 milhões e 13,8 milhões de meninas
deveriam ter nascido na Índia em
1997. Entretanto foram registrados apenas 13,1 milhões de nascimentos de meninas.
O estudo diz: "Numa estimativa
conservadora, calculamos que a
determinação pré-natal do sexo e
os abortos seletivos são responsáveis por 500 mil nascimentos a
menos de meninas por ano. Se essa prática foi corriqueira na maior
parte das últimas duas décadas,
desde que o acesso à ultra-sonografia se tornou comum, não seria
descabida uma cifra de 10 milhões
de nascimentos de meninas a menos". A ultra-sonografia, utilizada
para verificar a saúde e o desenvolvimento do feto, também pode
revelar seu sexo.
A determinação do sexo dos fetos e a interrupção da gravidez
realizada por médicos com base
no sexo do feto são ilegais na Índia desde 1994. Entretanto, diz o
estudo, "existem amplas evidências publicadas de que a determinação do sexo dos fetos é praticada com grande freqüência, assim
como o feticídio feminino".
Ônus
A preferência por filhos homens
desequilibra o índice de homens e
mulheres na Índia, país de mais
de 1,06 bilhão de habitantes. De
acordo com recenseadores governamentais, o número de meninas
por mil meninos caiu de 945, em
1991, para 927, em 2001.
Muitas pessoas na Índia vêm filhas como um ônus porque, de
acordo com a tradição, a mulher
"pertence" à família de seu futuro
marido. O costume de pagar dote
ainda é prevalecente no país, e as
famílias freqüentemente se endividam para comprar presentes
para as famílias dos maridos de
suas filhas.
O sociólogo Dipankar Gupta
disse que o problema se deve à incapacidade do governo de aplicar
a lei. "Todo mundo sabe que existem clínicas que fazem esses exames", ele comentou.
Já a professora de ciência política Zoya Hasan, da Universidade
Jawaharlal Nehru, em Nova Déli,
afirma que a questão não pode ser
responsabilidade exclusiva do governo.
"A sociedade civil e organizações diversas precisam intervir",
disse ela. "Mas o governo precisa
assegurar que não serão autorizados os exames para a determinação do sexo dos bebês. Em última
análise, é preciso formar a opinião
pública e conscientizar a sociedade de que não existe diferença entre homens e mulheres e de que é
preciso proteger os direitos das
mulheres."
Tradução de Clara Allain
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