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ARTIGO
Será que ela pode ganhar no choro?
MAUREEN DOWD
DO "NEW YORK TIMES"
Quando entrei na redação,
segunda-feira, havia gente
aglomerada em torno de um
computador para assistir a uma
cena que imaginavam ser impossível: Hillary Clinton com
rastros de lágrimas nos olhos.
Foi impressionante que ela
conseguisse ao mesmo tempo
se comover a ponto de chorar e
ainda assim manter a mensagem de sua campanha.
Uma mulher fitava a tela com
um sorriso amarelo. Três caras
assistiam de novo a cena, hipnotizados pela Hillary "humanizada". Um repórter que cobre
questões de segurança tinha
calafrios. "Estamos em guerra.
É assim que ela vai falar com
Kim Jong-il?"
Hillary conquistou sua cadeira no Senado depois de ser
constrangida por um homem.
Virou a campanha em New
Hampshire depois de ser vítima de embaraço causado por
outro homem. Quando disputava o Senado, era vista como
controladora demais, e por isso
era preciso que perdesse o controle, como o fez durante o escândalo de Monica Lewinsky,
antes que os eleitores de Nova
York se deixassem convencer
de que ela era doce o bastante
para merecer seus votos.
Depois de perder para Barack Obama em Iowa, de seu
momento de emoção em uma
cafeteria de New Hampshire e
do pesar que deixou transparecer em um debate ante uma
pergunta que dava a entender
que ela não era uma pessoa que
despertasse afeto, seus gestos
de fragilidade servem a um propósito: torná-la simpática, sobretudo para as mulheres, particularmente as mais velhas.
A campanha de Obama estava calculando, no fim de semana, que ganhara o voto feminino, mas terminou por perdê-lo
graças às lágrimas de Hillary.
Na cafeteria de Portsmouth,
na segunda, conversando com
um grupo de eleitores formado
majoritariamente por mulheres, ela piscou, conteve as lágrimas e conseguiu expressar seu
temor indefinido diante das
"falsas esperanças" despertadas por Obama e suas conseqüências para o país.
Houve algo de pungente naquele momento -assistir a Hillary perder o controle em um
instante de exaustão, depois de
décadas de anseio pela posição
de líder, e não companheira de
jornada, em uma empreitada
política. Também houve um
traço de autopiedade à maneira
de Nixon, em seu momento de
choro. O que a estava comovendo àquele ponto era reconhecer
que o país não estava compreendendo o quanto precisa
dela. De uma maneira estranhamente narcisista, ela estava
chorando por nós. Mas é desanimadoramente típico de Hillary que aquilo que a fez perder
o controle tenha sido a perspectiva de ser derrotada.
Seu momento de emoção se
deve ao medo de ter chegado ao
cume de sua vida política,
quando subitamente voltaria a
ser a menina de óculos fundo-de-garrafa e cabelo desajeitado,
inteligente, mas nunca a mais
querida. Depois de passar todos
aqueles anos à sombra de um
político cheio de carisma, será
que ela teria de enfrentar a
perspectiva de ser derrotada
por outro líder carismático?
Gloria Steinem escreveu, em
artigo para o "New York Times", que uma das razões pelas
quais apóia Clinton é que ela
"não tem masculinidade a provar". Mas Hillary sentiu a necessidade de provar sua masculinidade. É por isso que votou a
favor da invasão do Iraque e é
por isso que apóia a Casa Branca quanto ao Irã.
Mas, no momento decisivo,
ela teve de escapar à calamidade recorrendo ao papel de vítima feminina, de Obama e da
imprensa. Hillary mal conversou com a mídia durante a campanha, mas nesta semana o casal Clinton se queixou ruidosamente de que a imprensa prefere Obama. Hillary pareceu tola
ao tentar retratar Obama como
um poético sonhador, em contraposição à pessoa de realizações concretas que ela é. "O sonho de Martin Luther King começou a ser realizado quando o
presidente Lyndon Johnson
assinou a Lei dos Direitos Civis", ela declarou.
O argumento de Hillary contra Obama se resume agora a
um ataque ao idealismo, o que
representa talvez o mais baixo
e improvável ponto ao qual os
Clinton poderiam descer. O casal de Hope está criticando a esperança ["hope", em inglês].
Ao festejar, Hillary parecia a
heroína de uma novela que
conseguiu triunfar sobre a adversidade. Dizendo-se exultante, ela repetiu um lema feminista: "Descobri minha voz".
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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