São Paulo, sexta-feira, 10 de março de 2006

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AMÉRICA DO SUL

Às vésperas dos 30 anos do golpe, chefe cita pela primeira vez "atos contra a dignidade humana" na ditadura

Força Aérea da Argentina faz mea-culpa

DE BUENOS AIRES

Às vésperas do 30º aniversário do golpe que instalou a ditadura militar na Argentina (1976-1983), a Força Aérea do país admitiu e "repudiou" ontem, pela primeira vez, "atos contra a dignidade do homem cometidos por integrantes da instituição" no período.
A declaração foi feita em discurso pelo brigadeiro-geral Eduardo Schiaffino, o primeiro na linha hierárquica da Força Aérea, durante a abertura do ano militar. "A Força Área que hoje conduzo assume a obrigação moral diante da nação de reconhecer os feitos contra a dignidade do homem cometidos por integrantes de nossa instituição naqueles dias", disse.
No ato, a ministra da Defesa, Nilda Garré, ex-militante de entidades de direitos humanos, se disse "muito satisfeita" com a autocrítica. Ao ler o discurso, porém, Schiaffino não pronunciou a palavra "repúdio", presente no texto distribuído à imprensa. Depois, o próprio brigadeiro teve de afirmar que se tratou de um "lapso" não mencionar a palavra.
O cuidado com os termos e a intenção de marcar, sem gerar dúvidas, o mea-culpa militar no episódio ilustram o clima na Argentina a 15 dias da efeméride.
O evento de ontem foi o primeiro do vasto calendário preparado pelo governo de Néstor Kirchner para marcar o aniversário do golpe, consumado com a ascensão ao poder do general Jorge Videla -hoje sob prisão domiciliar e acusado, entre outros crimes, de roubar bebês de militantes.
A punição dos crimes da ditadura argentina, responsável pelo desaparecimento de 30 mil pessoas, segundo entidade de direitos humanos, é uma das bandeiras políticas de Kirchner e deve ser explorada eleitoralmente.
Ontem, a Casa Rosada enviou projeto ao Senado para transformar 24 de março em feriado nacional (deslocado para segunda ou sexta, para que seja final de semana prolongado). Desde 2003, a data já é o "Dia Nacional da Memória pela Verdade e Justiça".
Nesta semana, centros culturais oficiais e privados inauguram mostras artísticas sobre o período, e o material didático das escolas públicas foi reforçado com livros que mostram as violações cometidas pelos militares.
Kirchner deve fazer um discurso histórico no dia 24, quando haverá passeata nas ruas de Buenos Aires e shows convocados por entidades como as Mães e Avós da Praça de Maio. Segundo o Centro de Estudos Legais e Sociais, atualmente há 207 pessoas presas e aguardando julgamento por violações cometidas no período.


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