São Paulo, quinta-feira, 11 de janeiro de 2007

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Economia caótica faz do Iraque poço sem fundo

Bush propõe US$ 1 bi para empregos; EUA já deram US$ 30 bi a projetos civis

Projetos de reconstrução já consumiram fortunas, mas violência afasta investidor, e corrupção provoca perdas na exportação do petróleo


JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Reservar US$ 1 bilhão para reativar empresas e criar empregos no Iraque -proposta incluída na nova estratégia do presidente George W. Bush- é perder a noção da grandeza dos problemas e da fortuna bem maior já investida naquele país.
Logo após a invasão, em 2003, uma conferência de doadores, reunida em Madri, calculou que a reconstrução exigiria de início US$ 33 bilhões.
O Estados Unidos já entraram com US$ 30 bilhões, um fundo administrado pelas Nações Unidas reuniu US$ 1,1 bilhão, enquanto US$ 14,5 bilhões vieram de 39 países e instituições, como o Conselho Europeu e o Banco Mundial.
Mas todo esse dinheiro em pouco mudou, depois de quase quatro anos, o quadro caótico da economia iraquiana. O desemprego está oficialmente entre 25% e 40% -mas há estimativas de que chegue a 60%-, a produção de petróleo continua menor que nos tempos de Saddam Hussein -1,7 ou 2 milhões de barris/dia, contra 2,3 milhões- e a insegurança interna afasta investidores estrangeiros e cria um "custo Iraque" exorbitante.

Peça de ficção
Documento do governo francês calcula que, para cada dólar investido no Iraque, outro US$ 0,30 é gasto com a segurança de projetos. Ou seja, se for para a manutenção de um oleoduto, além da mão-de-obra e matéria-prima, é preciso gastar mais 30% em vigilância para que nenhum insurgente chegue perto e pratique sabotagem.
O "New York Times" dá a entender que a economia iraquiana é de certo modo uma peça de ficção, porque boa parte das 192 estatais -elas empregam meio milhão de pessoas- simplesmente não funciona há anos ou está com instalações destruídas ou canibalizadas.
O jornal ainda pergunta como viabilizar projetos, se é preciso manter sigilo sobre a origem do dinheiro americano para evitar que atentados façam instalações voar pelos ares.
Ou ainda: a fortuna gasta pelos contribuintes americanos em projetos civis afetou bem pouco a qualidade de vida dos iraquianos e, apesar dos empregos criados, não chegou a desencorajar pelo trabalho o recrutamento de insurgentes, diz o "New York Times".

Eletricidade e água
Em fevereiro de 2005, o inspetor geral especial para a reconstrução do Iraque, Stuart Bowen, deu ao Senado um quadro sombrio sobre a situação.
Exemplos da infra-estrutura: só 49 dos 136 projetos de irrigação puderam ser realizados. O país precisava gerar 3.400 megawatts a mais, mas só aumentou sua capacidade em 2.200. Há em Bagdá 3,7 horas diárias de eletricidade, contra 16 a 24 horas nos tempos da ditadura.
Ou ainda: hoje só um terço da população é servida por água potável. Nos tempos de Saddam o benefício chegava à metade dos iraquianos.
A corrupção, um dos grandes problemas locais, atinge em cheio o setor petrolífero. O inspetor geral do Ministério do Petróleo, Ali al Alaak, disse no ano passado à BBC que só em 2005 foram contrabandeados US$ 4,2 bilhões em óleo cru.
Desde a invasão americana, o Iraque exportou US$ 76,4 bilhões em petróleo. É um dado compilado pela Brookings Institution, entidade sediada em Washington. Não há nenhum detalhamento sobre o destino do dinheiro, que é bem mais que os US$ 56 bilhões que a ONU e o Banco Mundial acreditavam em 2003 serem necessários para reconstruir o país.


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