São Paulo, sábado, 11 de outubro de 2008

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Mediador veterano ganha Nobel da Paz

Atuação de Martti Ahtisaari, ex-presidente de Finlândia, é marcada por sucessos na África, Ásia e Europa e pela controvérsia de Kosovo

Belgrado e Moscou vêem na premiação uma tentativa de legitimar a independência da Província sérvia, mas evitam ataque a laureado

Markku Ulander/France Press/Lehtikuva
Ex-presidente finlandês Martti Ahtisaari dá entrevista coletiva após decisão do Comitê do Nobel

DA REDAÇÃO

O ex-presidente finlandês Martti Ahtisaari, diplomata e mediador da ONU, receberá o Prêmio Nobel da Paz deste ano. A escolha reconhece seus "importantes esforços, em vários continentes e por mais de três décadas para resolver conflitos internacionais", afirmou ontem o comitê norueguês responsável ao anunciar a decisão.
Como representante da ONU, Ahtisaari mediou os diálogos que culminaram, em 1990, na independência da Namíbia, ex-protetorado sul-africano. O finlandês, que fundou em 2000 uma ONG dedicada à mediação de conflitos, supervisionou o desarmamento do IRA (Exército Republicano Irlandês) e, na Ásia, teve papel crucial no fim do conflito separatista de Aceh, na Indonésia.
Mas a carreira do diplomata, de 71 anos, é marcada também pela controvérsia em torno da independência de Kosovo, Província sérvia de maioria albanesa. Em 1999, Ahtisaari levou o então presidente sérvio, Slobodan Milosevic -que mais tarde foi a julgamento por crimes de guerra-, a aceitar as condições impostas pelos EUA e aliados da Otan, a aliança militar ocidental, para firmar a paz.
O plano esboçado pelo diplomata resultou em uma independência pacífica de Kosovo, após as guerras que dividiram a antiga Iugoslávia na década de 1990. Mas a viabilidade do jovem Estado, na prática um protetorado europeu cuja soberania foi reconhecida por 47 países, é questionável. Belgrado e Moscou jamais a aceitaram.

Controvérsia
Recebida com entusiasmo na Europa, nos Estados Unidos e nos países africanos e asiáticos onde Ahtisaari atuou como mediador, a decisão do comitê desagradou a sérvios e russos.
"Ele é um negociador muito hábil. Mas, na Sérvia, será sempre lembrado como o arquiteto da separação de Kosovo", disse o chanceler Zivadin Jovanovic.
"Não vejo razão para que este político respeitável tenha recebido honra tão grande. Para mim, parece uma tentativa retrospectiva de certificar a qualidade do assim chamado Plano Ahtisaari, que não resolveu problemas (...) e fundamentou o reconhecimento ilegítimo de Kosovo como nação independente", disse Konstantin Kosachev, presidente da Comissão de Relações Exteriores do Parlamento russo.
Já o presidente do Parlamento Europeu, Hans-Gert Pöttering, elogiou a premiação, que considerou uma honra para a Finlândia e a União Européia (UE) em conjunto. "Nossa experiência de trabalhar juntos na Europa para construir a paz e prosperidade no continente se converteu em modelo para o mundo", disse. Foi durante a Presidência de Ahtisaari que, em 1995, os finlandeses aprovaram a entrada do país na UE.
Sem a campanha ostensiva dos partidários da indicação de Ingrid Betancourt e do dissidente chinês Hu Jia, Ahtisaari foi escolhido entre 197 indicados. Citado há anos entre os possíveis laureados, ele emocionou-se ao saber da escolha do comitê: "É um prêmio a toda uma vida". O finlandês se irritou com repórteres que perguntaram o que faria com o dinheiro: "Isso é da minha conta". Depois, afirmou que os recursos ajudariam seu trabalho de mediação e se disse interessado em combater o desemprego entre os jovens no mundo.
"Construir uma sociedade pacífica exige tanto esforço quanto negociar a paz", disse ele em entrevista à TV norueguesa. O prêmio de 10 milhões do coroas suecas (cerca de US$ 1,4 milhão) será entregue em Oslo, em 10 de dezembro.

Histórico
Personalidades e instituições de todo o mundo podem indicar nomes para o prêmio até 31 de janeiro. Depois, o Comitê do Nobel da Paz, formado por cinco pessoas escolhidas pelo Parlamento norueguês, seleciona candidatos mais adequados e nomeia um vencedor.
Criado segundo as orientações do testamento do químico sueco Alfred Nobel, que destinou a maior parte de sua fortuna à criação de cinco prêmios, o Nobel é dado apenas a personalidades ainda vivas, como um endosso às suas causas.
Em 1948, o prêmio não foi entregue, pois o mahatma Gandhi, um dos nomeados, foi assassinado antes da escolha. Quando, em 1961, o comitê o entregou ao secretário-geral da ONU Dag Hammarskjöld, morto em acidente aéreo antes da reunião, o estatuto passou a vetar prêmios póstumos.
Para o presidente do Comitê do Nobel da Paz, Ole Danbolt Mjoes, a premiação de Ahtisaari contribui para uma resolução pacífica do conflito no Iraque, onde o diplomata atua na mediação entre xiitas e sunitas.

Com agências internacionais



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