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Reputação de improbidade paira sobre ditador chileno
Pinochet não explicou a origem dos US$ 27 milhões; ditadura matou 3.000
Há dois consensos sobre o
golpe: o primeiro, que os
EUA ajudaram; o segundo,
delicado, que Allende não se
sustentava na Presidência
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Augusto Pinochet Ugarte
morreu politicamente isolado.
Os partidários de sua ditadura
(1973-1990) afastaram-se
quando ruiu a imagem do governante cuja probidade pessoal compensava o desastroso
saldo no campo dos direitos humanos -mais de 3.000 mortos
e 28 mil torturados. A reviravolta se deu em 2004, quando
foram descobertas suas primeiras contas no exterior, que somam depósitos injustificados
de cerca de US$ 27 milhões.
Tanto dinheiro assim sujou o
brasão de um militar e presidente que gostaria de ser lembrado pela "reconstrução nacional", após derrubar, em setembro de 1973, o presidente
socialista Salvador Allende.
Há hoje dois consensos entre
os historiadores sobre as circunstâncias que o levaram ao
poder no Chile. O primeiro se
refere ao auxílio norte-americano ao golpe de Estado.
A Guerra Fria passava por
um período agudo. Já havia o
precedente de Cuba, e Washington não admitiria um novo
regime de esquerda em sua esfera de influência. Henry Kissinger, assessor da Casa Branca, disse ao presidente Richard
Nixon que tudo seria feito em
favor dos golpistas chilenos.
O segundo consenso é mais
delicado. Refere-se à insustentabilidade de Allende. O Estado, inchado por desapropriações de terras e nacionalizações de bancos e empresas, era
bem mais vulnerável aos adversários internos e externos.
Uma greve nos transportes
provocou o desabastecimento.
O Tesouro só arrecadava 53%
do que gastava. Os 3.500 produtos tabelados estimulavam a
corrupção e o mercado negro.
Allende perdia o controle da
economia centralizada e era vítima da desestabilização de
grupos empresariais. Setores
significativos da classe média
receberiam a ditadura como
um mal menor e inevitável.
O novo regime, para esses
chilenos e para os investidores
externos, colocou ordem na casa. O Chile virou um laboratório de grande êxito do liberalismo econômico radicalizado.
Pinochet manteve a estatização do cobre. Mas privatizou as
6.500 propriedades rurais expropriadas pelas reformas
agrárias dos dois governos anteriores. Fez o mesmo com 308
empresas e 17 bancos. Transformou a Previdência em fundos de pensão privados. A inflação caiu de 400% para 10%. E a
economia, entre 1976 e 1981,
cresceu 6,8% ao ano.
Ao mesmo tempo, no entanto, acelerou-se a desigualdade
social e surgiu uma forma crônica de pobreza que o país havia muito desconhecia.
Mesmo assim, foi com base
na estabilização econômica que
Pinochet, em meio à inexistência de liberdade política e acusações de fraudes, venceu em
1980 o plebiscito que instituía
uma nova Constituição, pela
qual tornou-se presidente, e as
Forças Armadas exerceriam a
tutela do Estado.
Foi talvez seu melhor momento. Ele havia sido um militar obscuro, entre centenas de
outros num país que até 1973
respeitara a normalidade democrática e no qual as Forças
Armadas nunca atuaram como
um partido fardado. Chegara ao
poder, como diz eufemicamente a biografia oficial no site da
Fundação Pinochet, em razão
de "situações insustentáveis".
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