São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 2003

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"Queremos eleições já", diz líder de grupo alternativo

DO ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH

Principal líder da Iniciativa Nacional Palestina na Cisjordânia, o médico Mustafa Barghouti defende a realização imediata de eleições palestinas sob proteção internacional e as descreve como "um instrumento de resistência".
Leia a seguir trechos da entrevista que Barghouti, 49, concedeu à Folha. (PDF)

Folha - O Conselho Eleitoral Palestino atribuiu o adiamento das eleições, inicialmente programadas para o dia 15, à ocupação e ao cerco israelense. Qual sua opinião?
Mustafa Barghouti -
Defendo eleições sob proteção internacional. É a única forma.

Folha - Quando?
Barghouti -
Já, o mais rápido possível. As eleições são um instrumento de resistência, e nós precisamos desafiar os esforços israelenses de nos impedir de promover eleições.

Folha - Seu nome tem aparecido em pesquisas de opinião sobre quem os palestinos gostariam de ver como líder, com uma popularidade crescente. O sr. é um candidato às próximas eleições?
Barghouti -
Ainda não posso falar sobre o papel que vou desempenhar e sobre quem será nosso candidato. É cedo demais, mas eu posso dizer que acreditamos 100% na Iniciativa Nacional Palestina e que não é aceitável que haja apenas a autoridade atual e, do outro lado, o Hamas.

Folha - Que opção o sr. defende?
Barghouti -
Nós estamos totalmente determinados a promover uma terceira via, a das forças democráticas, contra a autocracia atual. A terceira alternativa não é apenas em prol da libertação palestina e do fim da ocupação israelense, mas também para construir uma Palestina democrática, uma Palestina que seja transparente, com leis legítimas e um governo competente. Nós vamos ter eleições. Quem estará lá não depende de mim, mas do povo.

Folha - A Autoridade Nacional Palestina vai permitir a votação?
Barghouti -
Vamos lutar por isso. Como bem sabemos e como se vê em outros países, a democracia não vem por si só. É preciso lutar por ela.

Folha - Em sua opinião, a Intifada deve ser encerrada?
Barghouti -
Não. A pergunta é: "O que é a Intifada?" Na mídia ocidental, a Intifada é apresentada como se fosse uma luta militar. Os israelenses conseguiram impor sua visão enfatizando a militarização do conflito. A Intifada não devia ter sido militarizada. Pedimos que a Intifada fosse um movimento popular e pacífico.
Dois grupos tornaram a Intifada violenta: o principal é Israel, que matou palestinos mesmo quando os protestos ainda eram pacíficos, mas houve erros dos palestinos, que caíram na armadilha da militarização do conflito. Para mim, a Intifada é a decisão do povo palestino de desafiar a ocupação israelense, a opressão e a injustiça.

Folha - O sr. acha que o Hamas pode aceitar pôr fim aos atentados?
Barghouti -
Nós já os convencemos ao menos três vezes, quando eles declararam um cessar-fogo. Nas três vezes, Sharon [premiê de Israel" organizou mortes para pôr fim a essa iniciativa. Mas eles podem aceitar um cessar-fogo novamente, o fim de ações suicidas e qualquer tipo de ataque contra civis. Quem nos preocupa é Sharon, que sabe que há negociações nesse sentido e promove mortes. É o que ele tem feito sistematicamente no último ano e meio.

Folha - Quais suas expectativas para as eleições israelenses?
Barghouti
- O escândalo de corrupção envolvendo Sharon pode provocar mudanças, mas talvez não tão rápidas a ponto de afetar as eleições do dia 28. Estamos preocupados com a situação.

Folha - Qual sua avaliação do Fórum Temático Palestina [realizado no final de dezembro, por iniciativa do Fórum Social Mundial"?
Barghouti
- Um fórum na Palestina era um sonho que se tornou realidade e ajudou a ligar a causa palestina à defesa da justiça mundial. Este é sem dúvida o pior momento desde 1948. Estamos proibidos de usar as estradas e as ruas. As cidades enfrentam um toque de recolher. Os assentamentos crescem. Temos mais de 60 mil feridos. A comunidade internacional tem o dever de intervir. Israel violou muito mais resoluções da ONU que o Iraque. Há realmente um direito único para todos?




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