São Paulo, domingo, 12 de fevereiro de 2006

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AMÉRICAS

Diplomatas temem escalada provocada por frases a favor de direitos humanos expostas na missão americana em Havana

Slogans acirram rancor entre EUA e Cuba

MARC FRANK
DO "FINANCIAL TIMES"

As relações já frágeis entre EUA e Cuba estão se tornando ainda mais tensas em razão de uma disputa bizarra que começou com uma placa eletrônica sendo instalada na fachada lateral da missão dos EUA em Havana.
O display eletrônico, que tem 1,5 metro de altura e se espalha por 25 janelas do quinto andar do prédio da missão, vem divulgando um fluxo constante de frases de líderes anticomunistas e defensores dos direitos humanos. Sua primeira mensagem apareceu em 16 de janeiro, em letras vermelhas: "Tenho um sonho de que algum dia esta nação vai se erguer", de um célebre discurso de Martin Luther King Jr. em 1963.
Os cubanos reagiram erguendo outdoors em torno do edifício da missão, que, segundo Cuba, tem vínculos com terroristas anticubanos em várias regiões.
O tráfego em torno da missão, que faz frente com a pitoresca avenida de beira-mar de Havana, vem sendo desviado há várias semanas, e, a 150 metros de distância da entrada do prédio, o chamado "tribunal antiimperialista", um enorme palco ao ar livre, passou a centralizar vários eventos políticos e culturais cubanos.
Enquanto isso, o display eletrônico continua a difundir na noite de Havana mensagens de direitos humanos e chamados pela democracia feitos por personalidades diversas, incluindo líderes de revoltas contra o comunismo em países do Leste Europeu, como o ex-presidente polonês Lech Walesa e o líder tcheco Vaclav Havel.
O ditador cubano, Fidel Castro, não está contente com a situação. "O único objetivo desse lixo é provocar a destruição de nossas tênues relações -como se nós precisássemos delas", declarou Fidel. No final de janeiro, o presidente liderou uma passeata de mais de 1 milhão de pessoas que passou em frente à missão.
Fidel afirma que os EUA protegem os ex-agentes da CIA exilados Orlando Bosch e Luis Posada Carriles, a quem Havana acusa de ter cometido vários atos terroristas, incluindo o atentado a bomba contra um avião cubano ao largo da costa de Barbados, em 1976, que matou as 73 pessoas a bordo. Bosch hoje vive em Miami, tendo sido perdoado por outros crimes. Carriles entrou nos EUA ilegalmente no ano passado e, desde então, está detido por uma acusação menor de imigração ilegal. "Quem abriga um terrorista é terrorista", diz um dos outdoors de Havana, citando o presidente americano, George W. Bush.
Declarando que a missão americana tornou-se "o quartel-general da contra-revolução", Fidel restringiu os movimentos dos diplomatas americanos e reprimiu a dissidência interna. Nesta semana, o governo bloqueou a visão do display eletrônico, que descreveu como "pérfida provocação", com dezenas de bandeiras negras.
"Seria realmente hilário, se as consequências não fossem potencialmente tão sérias", comentou um diplomata americano. "A impressão é que nenhum dos lados está pensando seriamente em onde tudo isso pode terminar."
Cuba diz que as bandeiras representam mais de 3.400 pessoas que teriam sido mortas ao longo dos anos em incidentes de violência patrocinados pelos EUA.
Enquanto isso, os EUA insistem que democracia e direitos humanos são as questões em jogo em suas relações contenciosas com "o regime totalitário de Fidel".
"Estamos apenas tentando nos comunicar com a população cubana, e vamos continuar a fazê-lo", disse o diplomata americano de mais alto escalão na ilha, Michael Parmly, falando do display eletrônico.
A administração Bush vem tratando a ilha de governo comunista com especial agressividade, tendo expulsado 14 diplomatas cubanos, intensificado as sanções, limitado os contatos em todos os níveis e ordenado a seus diplomatas que tratem Fidel Castro com escárnio público e dêem apoio a seus adversários.
Wayne Smith, que abriu a missão americana durante o governo do presidente Jimmy Carter, diz que a administração Bush quer provocar o fechamento das Seções de Interesses abertas em 1977 para tratar de questões referentes a vistos e outros trâmites administrativos.


Tradução de Clara Allain


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