São Paulo, sábado, 12 de março de 2011

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ONDA DE REVOLTAS

Combates líbios criam "cidade fantasma"

Luta por terra, água e mar por Ras Lanuf provoca fuga de civis e insurgentes; hostilidade a jornalistas cresce

Ofensiva de forças leais a Gaddafi faz rebeldes retrocederem 200 km, frustrando chegada a cidade natal de ditador

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A BREGA (LÍBIA)

Na estrada de duas pistas que virou campo de batalha na costa leste da Líbia, os rebeldes continuam a fazer o V da vitória. Mas a cada dia de ataques das forças do ditador Muammar Gaddafi, o gesto parece menos convincente.
Após perderem terreno durante toda a semana, os insurgentes lutavam ontem para recuperar o controle da estratégica cidade portuária de Ras Lanuf, que sofreu ataques por terra, ar e mar pelo terceiro dia seguido.
Um tanque de petróleo foi atingido -segundo os rebeldes, pela Força Aérea. Foi a segunda vez na semana que disparos acertaram uma instalação petrolífera. Em ambas, o governo foi acusado e negou ter sido o responsável.
Imagens da TV estatal líbia mostraram soldados de Gaddafi comemorando a conquista do centro de Ras Lanuf, cidade a 600 km da capital, Trípoli, após uma incursão com tanques.
Porém no início da noite o motorista de ambulância Hakim Jolgaf, que acabara de voltar com dois rebeldes feridos, contou à Folha que os confrontos prosseguiam.
"Ras Lanuf virou uma cidade-fantasma", disse ele. "Nenhum dos lados controla totalmente a cidade".
O desencontro de versões se repetiu ao longo de todo o dia, mas na estrada costeira era claro o recuo rebelde. O ponto mais avançado assegurado pelo levante era Brega, outro importante polo petrolífero, recuado 80 km de Ras Lanuf.
Em uma semana, a ofensiva de Gaddafi forçou os insurgentes a retroceder 200 km, frustrando a planejada marcha rumo a Sirte, a cidade natal de Gaddafi, na região central da costa.
O nervosismo é visível entre os rebeldes. Eles reforçaram as barreiras na estrada e passaram a hostilizar os jornalistas estrangeiros.
Trata-se de uma drástica e súbita mudança em relação ao clima amistoso de poucos dias atrás, quando o triunfo lhes parecia ao alcance.
A liberdade com que a imprensa estrangeira circulava nas últimas semanas entre os rebeldes é agora cerceada para conter a divulgação de informações e imagens que possam ser usadas pelas forças de Gaddafi.
A mesma liberdade jamais ocorreu no outro lado da frente de batalha, onde os jornalistas são monitorados ou reprimidos pelo governo, que usa a TV estatal para exibir apenas a sua versão.
Mesmo nas cidades do leste que ainda estão a uma distância considerável dos soldados de Gaddafi, a preocupação é inegável.
"Fiquei dez dias na frente de batalha e só voltei hoje porque precisava de um banho", brincou Hussein Gadari, 33, em Ajdabiyah, a cerca de 150 km dos combates. Depois, falou a sério:
"A artilharia de Gaddafi é muito mais sofisticada que a nossa. Eu não conseguia avançar um passo, porque o fogo era muito intenso".

HOSPITAIS
Nem os hospitais de Ras Lanuf e Brega foram poupados. Nas duas cidades, as equipes médicas foram forçadas a se retirar após virarem alvos de bombardeios.
"Duas ambulâncias estão sumidas e pelo menos cinco escaparam por muito pouco de ataques aéreos", contou à Folha o médico Ezzedin Elfarsi, 28, no pequeno hospital de Brega.
No oeste do país, além de reveses militares, os rebeldes sofrem atos de vingança. Após vários dias de intensos combates, a cidade de Zawiyah, a 50 km de Trípoli, parecia estar ontem sob controle quase total do governo.
Uma fonte ligada ao Exército contou à Folha que corpos de insurgentes mortos nos confrontos foram desenterrados pelas forças de Gaddafi, para desonrá-los.


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