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TENSÃO NO ORIENTE MÉDIO
Chanceler israelense e representante palestino em Jerusalém culpam um o líder do outro pelo fracasso do processo de paz na região
Moderados pedem a mudança dos líderes
DO ENVIADO ESPECIAL A JERUSALÉM
Separados por profundas divergências e uma formidável pilha de
cadáveres, lideranças tidas como
moderadas dos dois lados do confronto israelo-palestino conseguem, no entanto, ter algo em comum: cada lado pede a troca do líder do outro ou a mudança de
mentalidade, como única saída.
Visivelmente abatido, no seu escritório de Tel Aviv, o ministro israelense do Exterior, Shimon Peres (Prêmio Nobel da Paz), diz
que Iasser Arafat, o líder palestino, teve "um comportamento impossível", não se dispõe a combater o terrorismo e, agora, "os israelenses estão nos dizendo que
ele não é mais um parceiro [com o
qual fazer a paz]".
No seu escritório de reitor da
universidade palestina Al Quds (o
nome árabe para Jerusalém), o filósofo Sari Nusseibeh, representante palestino para Jerusalém,
diz mais ou menos a mesma coisa
que Ariel Sharon, o premiê israelense, e se queixa de que "está difícil encontrar aliados para a paz".
A solidão dos dois defensores
da paz, ainda que Shimon Peres
faça parte de um governo envolvido em enorme operação de guerra, é um raro ponto que têm em
comum. No mais, discordam em
quase tudo.
Peres, por exemplo, afirma que
Israel, no governo do trabalhista
Ehud Barak, ofereceu a Iasser
Arafat "tudo o que era possível:
97% das terras (palestinas), uma
posição em Jerusalém Oriental
(majoritariamente palestina), e
ele rejeitou".
Peres refere-se à reunião entre
os líderes das duas partes em
Camp David (residência oficial
perto de Washington), ainda sob
a intermediação do então presidente dos Estados Unidos, Bill
Clinton, há dois anos.
Nusseibeh, que não recusa o rótulo de moderado, reage: "Eu, se
fosse Arafat, também teria dito
não em Camp David".
Por quê? Simples, responde o
palestino: "Não ofereceram o que
nós palestinos esperávamos, que
era o retorno de Israel às fronteiras anteriores à guerra de 1967, incluindo Jerusalém Oriental, e a
criação do Estado palestino".
Em 1967, Israel conquistou os
territórios palestinos que ainda
hoje ocupa, na Cisjordânia e também na faixa de Gaza, que devolveu, embora mantenha algumas
colônias judaicas nessa região.
Terrorismo
Quem é o responsável pela violência? De novo, os dois pacifistas
estão em profundo desacordo.
Peres, como é natural, culpa o terrorismo palestino, lembra as 126
mortes de israelenses apenas no
mês de março e comenta:
"Quando um menino de 13
anos usa um cinto explosivo em
seu peito, o que podemos fazer?",
questiona.
Nusseibeh até condena, com
energia, o terrorismo palestino.
"Foram os ataques terroristas em
Israel que afastaram de nós os
parceiros pela paz", diz.
Mas também tem a sua lembrança: "Antes de o primeiro israelense ser morto, mataram 54
palestinos".
Refere-se ao número de mortos,
no lado palestino, em consequência da revolta provocada pela visita de Ariel Sharon, então líder da
oposição, à Esplanada das Mesquitas (Haram el Sharif, para os
árabes), em setembro de 2000.
O local é sagrado para os muçulmanos, entre outras razões, porque abriga a mesquita a partir da
qual o profeta Maomé, segundo a
tradição, subiu aos céus.
Os dois voltam, no entanto, a
coincidir quando se trata de discutir o afastamento ou não de
Arafat e/ou de Sharon.
Peres, ao contrário de Sharon,
não quer ver o líder palestino exilado. Até diz que, se ele e seu Partido Trabalhista não estivessem
no governo, certamente Arafat teria sido deportado.
Mas quer, sim, que Arafat modifique suas políticas. Seria a única forma de devolver o conflito à
via político-diplomática.
"Será que é tão difícil ele fazer
um discurso em árabe repudiando o terrorismo?", pergunta o ministro israelense.
Mas Peres não é relativamente
condescendente com Arafat porque confia nele. É mera falta de alternativa: "Não temos ninguém
mais (na liderança palestina). Ele
é quem tem de mudar suas políticas", afirma.
Nusseibeh vai um pouco pelo
mesmo caminho ao se referir a
Sharon. Acha que não se trata de
pura e simplesmente substituí-lo,
porque o primeiro-ministro está
atuando de acordo com o humor
do público israelense.
Caberia, pois, aos próprios palestinos conter a sua ira, de forma
a que os israelenses passassem a
se sentir seguros. "Nós liberamos
o monstro que havia dentro deles", afirma.
Sentindo-se seguros, os israelenses estariam dispostos ou a eleger outro líder, menos duro que
Ariel Sharon, ou o seu novo espírito levaria o próprio Sharon a fazer as concessões que atendam os
sempre postergados sonhos palestinos.
"Vizinho não se escolhe"
O filósofo conta que surpreendeu o público israelense, em palestra recente na Universidade
Hebraica de Jerusalém, ao afirmar: "Os melhores aliados de Israel não são os Estados Unidos,
mas os palestinos".
Afinal, é com os palestinos que
os israelenses terão de conviver,
por uma determinação da geografia.
Peres, no entanto, mesmo sendo moderado no espectro político
israelense, não parece nada feliz
com a geografia: "Há duas coisas
na vida que não se pode escolher:
os pais e os vizinhos", filosofa.
Nesse festival de dissonâncias, o
inacreditável é que as duas partes
concordam em que a criação de
dois Estados entre o rio Jordão e o
mar Mediterrâneo, um para os judeus, outro para os palestinos, é a
única forma de fato definitiva de
colocar fim ao conflito.
O problema está na forma que
tomaria o Estado palestino e na
definição de sua capital. Os 97%
da Cisjordânia e uma "posição em
Jerusalém Oriental" que Peres diz
que foram prometidos em Camp
David ficam "aquém do mínimo"
com que sonham os palestinos,
diz Nusseibeh.
Se os moderados pensam assim,
não é difícil imaginar o que pensam os radicais de parte a parte.
(CLÓVIS ROSSI)
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