São Paulo, terça-feira, 12 de junho de 2007

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Rússia mantém bálticos sob tensão, diz presidente letã

No Brasil, Vaira Vike-Freiberga cita "uso político da energia" feito pelo Kremlin

Chefe de Estado da Letônia será recebida amanhã pelo presidente Lula; o Kremlin a vetou para suceder Kofi Annan nas Nações Unidas

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

A presidente da Letônia, Vaira Vike-Freiberga, 69, disse existir uma "tensão crônica" entre a Rússia e as repúblicas bálticas, com a incidência de problemas bilaterais que "eclodem com certa regularidade".
Em entrevista à Folha, ela se referia aos seus vizinhos estonianos, que sofreram recentemente pressões russas -interrupção do tráfico ferroviário, o que afetou suas exportações-, depois da remoção de uma estátua na capital, Tallinn, que glorificava o Exército soviético.
A Estônia, a Letônia e a Lituânia integravam a hoje extinta URSS. Tornaram-se países independentes em 1991 e, para diminuir a influência de Moscou, entraram na União Européia e na Otan, a aliança militar ocidental.
Vike-Freiberga está em visita ao Brasil. Esteve ontem em São Paulo. Estará hoje no Rio e amanhã em Brasília, onde será recebida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ela acompanha empresários letões, interessados em vender sobretudo softwares.
Uma das áreas de tensão com a Rússia, diz ela, ocorre porque aquele país "tem feito um uso político da energia", pressionando a Ucrânia ou a Geórgia, às vezes de modo implícito, alegando problemas técnicos para cortar o fluxo de seus dutos.
Acredita que seu país e os demais na mesma condição se tornarão menos vulneráveis com a definição de uma política energética da União Européia, que passaria a negociar em bloco com a Rússia.
Indagada se Moscou não seria uma fatalidade em termos de estorvo geográfico, afirmou que "eles sempre estarão lá". E foi em razão das preocupações com a segurança que os letões ingressaram na Otan.

ONU
Vike-Freiberga foi no ano passado candidata à sucessão de Kofi Annan e poderia ter-se tornado a primeira mulher na Secretaria Geral das Nações Unidas. Mas seu nome foi vetado pelo Kremlin. Perguntada se sentia alguma mágoa por isso, afirmou que, "se fosse para ter mágoas da Rússia, teríamos outros e maiores motivos".
O premiê letão, Aigars Kalvitis, afirmou há uma semana que a Letônia estaria disposta a hospedar instalações do escudo antimísseis que os EUA planejam construir na República Tcheca e na Polônia -por mais que Moscou creia que o sistema vise neutralizar seu próprio dispositivo de defesa nuclear.
A presidente se contrapôs a Kalvitis. Afirmou que ele "está com sonhos muito irreais" e que talvez tenha como segunda intenção "trazer um pouco mais de dinheiro para o país". Ela faz ainda duas observações: a Letônia não possui uma localização geográfica apropriada para deter um míssil hostil, e o escudo americano não seria capaz de deter mísseis russos.
Mas chega a evocar como perigo o fato de o território letão se tornar um alvo potencial do arsenal do Kremlin. Isso porque "nós já somos um alvo". "Os russos já têm mísseis apontados para nós e para muitos outros países europeus."
Seu excesso de sinceridade tem como possível motivo o fato de ela estar nos últimos dias de seu segundo mandato presidencial. O Parlamento unicameral letão já escolheu como seu sucessor o médico-cirurgião Valdis Zatlers, que será empossado em 7 de julho.
O presidente tem na Letônia um poder bastante limitado. Promulga as leis -embora possa eventualmente vetá-las- e representa o país para efeitos externos.
Vaira Vike-Freiberga exilou-se com seus pais no início da ocupação soviética. Formou-se e doutorou-se no Canadá, onde se tornou uma grande especialista na área de psiquiatria, com dez livros e cerca de 140 artigos científicos sobre psicofarmacologia e psicolingüística. Não é filiada a nenhum partido político da Letônia, embora tenha afinidades com o bloco conservador.


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