São Paulo, segunda-feira, 12 de agosto de 2002

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COLÔMBIA

Cadeiras seriam reservadas para guerrilheiros que abandonassem as armas; plano prevê redução do Legislativo

Uribe oferece vagas no Congresso a rebeldes

M.Á. BASTENIER
DO "EL PAÍS", EM BOGOTÁ

Na quarta-feira passada as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), principal guerrilha do país, detonaram sua peculiar salva de disparos para comemorar a posse de Álvaro Uribe, o candidato que prometeu combater o terror "com toda a autoridade do Estado".
Enquanto o presidente fazia o seu juramento, no Congresso, em Bogotá, um morteiro explodiu a poucas quadras de lá, matando 21 pessoas e ferindo mais de 60. Outro morteiro atingiu uma lateral o palácio presidencial de Nariño, também próximo, ferindo quatro guardas.
Álvaro Uribe, liberal dissidente, ainda não revelou nem a mínima parte de seus planos. Não apenas porque havia dito que combateria a guerrilha como um verdadeiro Estado tem que fazer, mas também porque demonstrou uma habilidade suprema em prometer sem fazer promessas. A questão agora é que toda a Colômbia quer saber a que se apegar.

Pergunta - Daqui a quatro anos, quando o sr. entregar o posto a seu sucessor, um espetáculo assim ainda será possível?
Álvaro Uribe -
Oxalá eu possa impedir que algo assim ocorra. Vamos fazer todos os esforços para isso, sem criar expectativas infundadas. Mas em outro lugares do país aconteceram e acontecerão coisas parecidas, como é o caso dos 190 municípios destruídos nos últimos anos.
Eu me inteirei do que estava ocorrendo no momento em que apresentava o pedido de referendo sobre a reforma política e convoquei um conselho de segurança ali mesmo, nas escadarias do palácio. Decidi então por uma política de recompensa pela detenção ou morte dos terroristas, mas é uma medida de caráter imediato, e não uma estratégia para os quatro anos de mandato.

Pergunta - A embaixadora dos EUA, Anne Patterson, deu uma declaração há algumas semanas impondo sua política ao governo colombiano, mas nem a mídia, com a exceção de um artigo no diário "El Tiempo", nem o governo reagiram contra o que foi classificado pelos outros países como uma intromissão na política nacional. Uribe - Se você não quer que lhe digam o que fazer, é bom se antecipar, e, se lhe indicam coisas úteis, é bom reconhecê-las sem vaidade, pois vão lhe fazer bem.

Pergunta - A reforma política que o sr. propõe prevê a possibilidade de reservar cadeiras no Congresso para os grupos armados que entrem no âmbito da legalidade. Uribe - A igreja, de acordo com a administração do ex-presidente Andrés Pastrana, esteve em contato com eles, e vou encaminhar às Nações Unidas tudo o que possa cristalizar essas conversações. Pedi à ONU que exerça uma mediação com todos os grupos guerrilheiros e paramilitares. Na quinta passada o secretário-geral [da ONU" Kofi Annan me confirmou que havia falado com as FARC. Por outro lado, reservar cadeiras no Congresso aos grupos armados que se submetam ao império da lei é uma solução nossa.

Pergunta - O sr. pedirá à imprensa que adote um código de conduta em apoio à luta contra a guerrilha? Uribe - Não pedirei nada. Francisco Santos, meu vice e que também é jornalista, se reunirá com seus colegas para ver como a imprensa pode colaborar na luta contra o terrorismo, mas já está demonstrado que não é útil conduzir o combate do Estado contra os guerrilheiros estabelecendo limitações para a imprensa.

Pergunta - Como serão esses soldados de apoio que o sr. pretende recrutar entre a população civil? Uribe - Eles receberão treinamento militar, mas continuarão sendo civis e se dedicando a seus afazeres particulares. Receberão um salário muito modesto, e não sei ainda se receberão armamentos, porque tenho muito medo das consequências de armas em mãos imprudentes. Precisamos estar seguros de que esses colaboradores não se servirão de sua força para resolver questões pessoais. É possível, entretanto, que essa prestação seja substitutiva do serviço militar.

Pergunta - A reforma política que traz em seu bojo o suicídio do Congresso -antecipando as eleições para formar uma só câmara, muito mais reduzida, e eliminando a gestão de recursos próprios pelos congressistas- parece que só poderá ser aprovada por meio de um referendo, porque nem sequer aqueles que apóiam o sr. acham necessário um sacrifício tão grande. Uribe - No dia de minha posse, apresentei oficialmente uma petição para a realização de uma consulta à população, que ocorrerá, como prevê a Constituição, seis meses depois. O projeto do referendo está em curso.

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