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Tropas padecem em área tribal do Paquistão
"O grande problema é não saber em quem estou atirando", diz capitão, para quem os inimigos "são iguais a todos nas vilas"
Com US$ 200 de salário, soldados no combate ao Taleban não compartilham do otimismo do comando e relatam crise de consciência
IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL AO PAQUISTÃO
Se os comandantes são em
geral otimistas, a situação na
tropa é algo diferente nas áreas
tribais do Paquistão, palco de
combates entre militantes do
Taleban e o Exército paquistanês. Soldados em condições
péssimas e capitães jovens com
crise de consciência são constantes na frente de batalha.
Na semana passada, a Folha
esteve em três centros de comando, visitou postos avançados e acompanhou patrulhas
de soldados paquistaneses.
Há uma sensação generalizada de que o esforço não é apreciado no Ocidente. Foi o que
disse Nahim, soldado de Dir
que, como outros, conheceu
vários brasileiros por ter servido nas tropas de paz do Haiti.
"Em me lembro dos brasileiros
perguntando o que acontecia
aqui. Ninguém sabe."
"Para mim, o grande problema é não saber em quem estou
atirando. Eles não têm uniforme, são iguais a todos nas vilas", diz o capitão Nadaz Iqbal,
25, baseado em Lal Qila (Distrito de Dir). Como a maioria de
seus companheiros, ele também entende a motivação de
alguns de seus adversários.
"Para ganhar cinco, oito vezes mais? Até eu penso duas vezes", ri, revelando um salário
de cerca de US$ 300, US$ 100 a
mais do que o de um soldado.
"Ele é meu orgulho. Agora as
coisas estão mais calmas aqui,
mas ele é um herói", diz seu comandante, coronel Said.
Isso devido a um feito em junho. Como um Fitzcarraldo
paquistanês, Iqbal dirigiu sozinho um tanque Al Zarrar numa
trilha absurda de montanha
que Said mostra às custas de
dois pneus furados em sua picape com uma metralhadora e
seis soldados na caçamba.
Só que diferentemente do
personagem de Klaus Kinski
no filme homônimo de Werner
Herzog, que levou seu barco de
um rio a outro morro acima
com a ajuda de nativos, Iqbal
foi alvejado por eles. "Sorte que
o tanque aguentou", diz, ao lado da versão modernizada do
velho T-59 soviético, ainda posicionado na elevação.
Condições precárias
Nos postos avançados, geralmente casas destruídas com
paredes refeitas com tijolos de
barro, os soldados vivem miseravelmente. A diversão vem de
rodas para contar histórias de
guerra como as de Iqbal. Todos
comem a mesma comida, quase
invariavelmente o chicken karahi (galinha com arroz e muita, muita pimenta).
Os postos mais altos nas
montanhas, como o que fica
perto de Kumbar, são disputados porque lá o sinal de celular
costuma pegar. "Posso falar
com minha mãe, ela fica mais
tranquila", diz o capitão Farhad, 25. No alto de uma antena
de comunicações no posto, o
soldado Attar está aboletado
com sua Kalashnikov observando o vale abaixo. É o sinal?
"Não, não tenho celular. Mas a
vista é bonita."
As camas são idênticas às vistas nas margens de estradas paquistanesas: de madeira e cordas entrelaçadas, como uma
maca. Ficam ao ar livre, para
dar conta do calor de quase
40C desta época do ano.
O clima impõe casos de insolação às tropas, que usam pesados coletes à prova de bala no
calor. Mas o grande perigo mesmo são os estilhaços.
No Hospital Militar Central
de Peshawar, havia há uma semana 27 feridos em atendimento, a maioria deles atingidos por explosões de morteiros
ou bombas improvisadas.
Foi o caso de Shahim Hussein, 26, que estava no vale do
Swat na noite anterior.
"Eles atiraram e jogaram dois
morteiros. Quatro companheiros abraçaram o "shahadat'",
disse ele, referindo-se ao martírio sagrado do islã.
Deus, martírio pela fé e vários preceitos religiosos que o
Ocidente está acostumado a associar aos extremistas são moeda corrente para o cotidiano do
soldado paquistanês.
Hussein preferia uma solução negociada para o conflito.
"Acho sempre melhor conversar antes de atirar", disse.
O hospital estava vazio. Uma
ala esperava eventuais feridos,
mas denotava queda de intensidade do conflito. "Tivemos
1.800 atendimentos e 134 mortes desde abril", conta o médico-chefe, Muhammad Khalid.
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